Aproveitaram-se das dificuldades cognitivas de uma mulher, de 60 anos, que sofre desde sempre do transtorno da personalidade esquizoide. Dois vizinhos, ele fiscal da Câmara da Régua e ela desempregada, apropriaram-se da herança, avaliada em 85 mil euros.
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Eram dois imóveis, um negócio familiar e um veículo. A vítima ficou sem meios de subsistência. Mas o casal, que restituiu todos os bens depois de ter sido acusado de burla, foi agora condenado a três anos de prisão, com pena suspensa, na condição de pagar 12 mil euros de indemnização à vítima.
De acordo com o Tribunal da Régua, a vítima foi sempre submetida pelos pais - donos de uma bijutaria - a um estilo de vida superprotetor, ficando sem retaguarda depois de falecerem.
Conhecedores da herança e das limitações da vizinha, os arguidos Vítor C. e Floripes R. "decidiram em conjugação de esforços ganhar a confiança da ofendida a fim de se apropriarem dos seus bens e explorar o estabelecimento comercial".
Meses depois da mãe da herdeira ter falecido, em 2013, procuraram ganhar a confiança da vítima. Convidavam-na para jantares e convívios.
Depois, passaram a fazer questão de lhe pagar despesas e "chegaram inclusive a pagar algumas dívidas, de valor reduzido, que esta contraiu nas Finanças". Também insistiram na liquidação de faturas da EDP ou da água e ainda nas despesas funerárias da mãe da vítima.
Assinou documentos
A subtração de bens começou pelo carro, um Ford Escort antigo. Convenceram a vítima de que tinha de passar o carro para o nome da arguida para saldar parte das dívidas. A herdeira assinou uma declaração de venda e o carro mudou de nome, em janeiro de 2014.
Depois, sempre com a "desculpa" das dívidas, fizeram-na assinar um documento autorizando a cedência da bijutaria, situada no Mercado Municipal. Com um documento emitido por um médico a atestar a patologia da vítima, obtiveram a autorização camarária para explorar a loja.
Um mês depois, convenceram a mulher a acompanhá-los ao Cartório Notarial de Lamego. Aqui, assinou uma habilitação de herdeiros e uma escritura de compra e venda do apartamento na Régua, onde a vítima vivia, de dois lugares de garagens e de um imóvel em Mesão Frio. No papel estava a vender a herança à arguida por 53 mil euros, mas nunca os recebeu.
Acabaram por despejar a mulher, para a mandar viver para casa da mãe da arguida em Lamego. Ficou lá apenas 15 dias. Acabou por ter de viver, até agora, do rendimento social de inserção e da benevolência da Santa Casa da Régua.
Advogada
Penhorada por causa dos arguidos
Os arguidos devolveram os imóveis à vítima. Mas o casal não pagou os impostos da nova escritura e o Fisco exige o dinheiro à vítima, arriscando ser penhorada por causa de uma dívida de 7 mil euros. "Ficou acordado por escrito que os arguidos pagariam as despesas e impostos inerentes a esta escritura. Apesar disso, até hoje a ofendida não tem os imóveis registados em seu nome, pois os arguidos recusam pagar", explicou ao JN Adélia Moreira, advogada da vítima.
Pormenores
Transtorno
Falta de interesse em relações sociais, tendência a um estilo de vida solitário, frieza emocional e apatia são os sintomas do transtorno de personalidade esquizoide, a deficiência de que sofre a vítima.
Sem recordações
A ofendida ficou sem qualquer recordação física da sua infância ou de seus pais. Os arguidos terão deitado ao lixo todos os seus bens pessoais quando se apoderaram dos imóveis.
Com a ajuda da Segurança Social, a vítima vive num quarto, há mais de seis anos, desde que foi "despejada".