Homem foi detido em Moncorvo com pó branco e ficou em prisão preventiva. A medida de coação foi confirmada depois de o laboratório dizer que não era droga.
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Um homem, de 46 anos, está em prisão preventiva desde o final de maio do ano passado, após ter sido detido com cerca de 40 gramas de um produto que a GNR suspeitou ser cocaína. Afinal, meses depois, as análises revelaram tratar-se de açúcar, mas o Ministério Público (MP) e o juiz de instrução criminal de Torre de Moncorvo decidiram mantê-lo preso por suspeita de integrar uma rede de trafico transmontana.
Foi no final de tarde do passado dia 31 de maio que Manuel Lourenço Gomes, um cidadão português residente em Verín, próximo de Ourense, Espanha, foi abordado pela GNR. No porta-luvas da carrinha Nissan que conduzia tinha um pacote embrulhado em prata com 39 gramas de pó branco. Os militares terão realizado um teste rápido numa farmácia local para verificar se se tratava de cocaína. No auto oficial da GNR, a que o JN teve acesso, pode ler-se que a substância reagiu positivamente ao teste de estupefaciente.
Manuel Lourenço Gomes terá logo alegado tratar-se de açúcar e que guardava o pacote por ser diabético para poder repor os níveis de glicemia em caso de crise. Porém, o suspeito tinha-se deslocado a Portugal para ver um amigo que estava, há vários meses, a ser investigado por militares da GNR no âmbito de um inquérito sobre uma rede de tráfico a operar em Trás-os-Montes.
Com a suposta droga e as ligações suspeitas a um indivíduo conotado com o tráfico, Manuel Lourenço Gomes foi colocado em prisão preventiva, após o primeiro interrogatório judicial no Tribunal de Torre de Moncorvo. Está até hoje no Estabelecimento Prisional de Bragança.
Teste na PJ deu negativo
O pacote apreendido seguiu para o Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária e o resultado caiu a 11 de novembro passado: o pó não reagia a testes de estupefaciente e os 39 gramas iniciais já só pesavam 32.
O advogado do detido, João Peres, consultou o processo no início de dezembro, após vários pedidos negados pelo MP e solicitou a libertação do cliente quando deu conta que, afinal, a cocaína era mesmo açúcar. Nada feito. Tanto o MP como o juiz de instrução criminal negaram a libertação ou uma alteração de medidas de coação, provocando a revolta do advogado.
Entretanto, o MP deduziu a acusação contra Manuel Lourenço Gomes e outros oito arguidos. Apesar de a apreensão que motivara a detenção ser agora irrelevante para a acusação, o arguido tornou-se suspeito de ser um elemento da rede, alegadamente liderada pelo amigo Gaspar Marques, que já foi entretanto detido.
Após cerca de oito meses em prisão preventiva, Manuel Lourenço Gomes continua preso, mas o advogado João Peres já requereu a abertura de instrução para tentar libertar o cliente.
"É escandaloso manter esse homem preso"
Contactado pelo JN, o advogado João Peres mostrou-se revoltado por o seu cliente se manter em prisão preventiva. "Não há prova nenhuma que sustente a prisão do meu cliente. Se o pó fosse cocaína, faria sentido. Agora aquilo é açúcar. É escandaloso manter esse homem preso", disse o advogado, que enviou duas queixas para os conselhos superiores da Magistratura e do Ministério Público. Ainda não obteve resposta, mas promete ir até às últimas consequências para restabelecer aquilo que entende ser a legalidade. "O produto apreendido demorou um mês e oito dias para chegar ao laboratório da PJ. Depois, demorou mais semanas para que chegasse o resultado e depois de chegar o resultado negativo para droga, não se liberta um inocente?", pergunta João Peres, que já requereu a abertura de instrução.
Pormenores
Escutas telefónicas
O processo conta com dezenas de escutas telefónicas efetuadas ao principal arguido, Gaspar Marques, que é suspeito de liderar uma rede de tráfico em Trás-os-Montes.
"Salão de festas" e "café"
Os investigadores acreditam que os arguidos falavam em código, ao telefone, com receio de estarem a ser escutados pelas autoridades. "Cafezinho", "carne" e "salão de festas" seriam código, para os suspeitos evitarem usar a palavra "droga".