Os três inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) condenados a nove anos de prisão por, em 2020, terem matado o cidadão ucraniano Ihor Homeniuk, no aeroporto de Lisboa, correm o risco de começar a cumprir pena na próxima semana, depois de o Tribunal Constitucional ter chumbado o seu último recurso.
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Duarte Laja, de 50 anos, Luís Silva, de 46, e Bruno Sousa, de 45, têm estado desde 30 de março de 2020 a aguardar o desenrolar do processo em prisão domiciliária e, como tal, já só têm cerca de cinco anos e sete meses para cumprir na cadeia.
A decisão que põe fim a um longo processo foi proferida a 11 de julho de 2023, noticiada esta sexta-feira pelo semanário "Expresso" e entretanto confirmada ao JN pelo advogado da família de Ihor Homeniuk, falecido aos 40 anos e, à data, pai de duas menores.
"São agora elevadas as expectativas da família de que os arguidos iniciem o cumprimento da pena de prisão efetiva ainda durante a próxima semana, devendo para tal o juiz de turno do Juízo [Tribunal] Central Criminal de Lisboa receber o processo e despachar nesse sentido, como ordenado pelo Tribunal Constitucional, que manteve a decisão do Supremo Tribunal de Justiça", afirmou José Gaspar Schwalbach.
Mataram sem intenção
O caso remonta a março de 2020, quando Ihor Homeniuk aterrou em Lisboa num voo proveniente de Istambul (Turquia), para trabalhar em Portugal. Depois de ser barrado, foi transferido para o Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT), gerido pelo SEF, no aeroporto de Lisboa, onde acabou por morrer numa sala sem videovigilância.
De acordo com as decisões do Tribunal Central Criminal de Lisboa, do Tribunal da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça, a morte, por asfixia lenta, aconteceu depois de ter sido espancado e abandonado algemado por Duarte Laja, Luís Silva e Bruno Sousa.
Nenhum teria intenção de matar o cidadão ucraniano e, por isso, foram os três punidos pelo crime de ofensa à integridade física grave qualificada, agravada pelo resultado (morte), e não por homicídio, cuja moldura penal é mais elevada.
Os arguidos têm alegado que a morte decorreu da síndrome de abstinência alcoólica de que a vítima sofria e imputado responsabilidades a funcionários do EECIT, mas a tese foi sendo, sucessivamente, rejeitada pela Justiça. Agora, terão mesmo de cumprir a pena de prisão.
"A família suspirou e agradeceu. Chegou ao fim. Volvidos três anos da data em que Ihor foi brutalmente agredido até à morte no aeroporto de Lisboa, a família poderá finalmente respirar fundo", concluiu, ao JN, José Gaspar Schwalbach.
Até ao Tribunal Europeu
Ainda assim, a defesa dos inspetores do SEF não se conforma e, ao "Expresso", assegurou que vai recorrer da decisão para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Tal não trava, contudo, o início do cumprimento da pena de prisão aplicada.
"A causa do óbito foi estabelecida por um relatório de autópsia feito contra regras elementares da 'leges artis' ['de acordo com as regras da arte', em latim], o que inquinou o apuramento da verdade. Como as defesas reclamaram, mas os tribunais injustificadamente recusaram, deveria ter tido lugar uma perícia sobre os termos desse relatório Essa grave omissão impediu o cabal esclarecimento do caso e constitui o principal fundamento da queixa no Tribunal Europeu que vamos apresentar", justificou o advogado de Bruno Sousa, Ricardo Sá Fernandes. A mandatária de Luís Silva, Maria Manuel Candal, corrobora a posição.
Paralelamente, continua a correr um outro processo, no qual foram acusados pelo Ministério Público, em março de 2023, mais cinco pessoas pela morte no envolvimento de Ihor Homeniuk, incluindo o diretor de Fronteiras do SEF à data do crime.