O juiz Ivo Rosa rejeitou, em 2018, o prolongamento das escutas a dois irmãos iraquianos agora detidos por suspeita de terrorismo. A decisão seria anulada pela Relação de Lisboa mas a investigação ficou parada três meses.
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As escutas duravam há quatro meses. Tinham-se iniciado em outubro de 2017, mal a Unidade Nacional de Contraterrorismo (UNCT) da Polícia Judiciária soube da possível ligação dos dois irmãos iraquianos ao movimento terrorista do Daesh.
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Nestes quatro meses e graças às escutas, os inspetores apuraram informações de grande relevância. Um dos irmãos havia viajado para a Alemanha com a intenção de requerer asilo naquele país e omitira tal facto às autoridades portuguesas. Mais: numa conversa com uma funcionária da Câmara de Oeiras, criticara as condições de apoio aos refugiados em Portugal e mostrara intenção de rebentar as instalações do Centro Português para os Refugiados.
Além disso, nenhum dos irmãos estava a trabalhar ou a aprender a língua portuguesa e comunicavam frequentemente com outros refugiados na Alemanha, também suspeitos de ligações terroristas.
No final dos quatro meses, os inspetores requereram a renovação das escutas. Porém, em fevereiro de 2018, o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) considerou que não se justificava continuar com as interceções telefónicas.
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Para o juiz Ivo Rosa, das escutas não resultaram "sessões com interesse para a prova ou para a investigação" nem "qualquer conversação relacionada com os factos em investigação". Pelo que "a manutenção deste meio intrusivo de prova por um tempo tão longo, sobretudo sem resultados", era "uma manifesta violação dos princípios constitucionais da necessidade e da proporcionalidade".
O magistrado judicial explicava ainda que as escutas eram "um meio de obtenção de prova e não uma forma de manter sob vigilância alguém que eventualmente poderá vir a cometer um crime".
Relação reverteu decisão
A decisão surpreendeu os procuradores do Departamento Central de Investigação e Criminal (DCIAP) que, de imediato, apresentaram recurso. O Tribunal da Relação de Lisboa viria a dar-lhes razão e anulou a decisão de Ivo Rosa.
Os juízes desembargadores elencaram os dados já apurados pela investigação que, no seu entender, indiciavam "a intenção preparatória de atos que visem a paz e a segurança nacional ou de outros países estrangeiros a partir de território nacional".
E salientavam que as investigações a estes tipos de crimes que envolvem a segurança nacional não se destinam "apenas a carrear provas, mas ainda a evitar a perda de vidas". E, neste tipo de crimes, é "extremamente difícil" descobrir planos ou intenções terroristas a não ser através das interceções telefónicas, recolha de imagens e varrimento eletrónico.
Ivo Rosa não aceitou processo
O acórdão da Relação de Lisboa foi enviado para o TCIC. Ivo Rosa recebeu a decisão, mas declarou-se incompetente para a executar e enviou-a para o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa.
Segundo o Diário de Notícias, que avançou a notícia, a recusa em prolongar as escutas e depois a declaração de incompetência de Ivo Rosa paralisaram a investigação por cerca de três meses.
O jornal lembra que o mesmo juiz, em junho de 2018, quase deitou por terra uma investigação sobre a célula de recrutamento de jihadistas de Aveiro. Ivo Rosa despronunciara de todos os crimes de terrorismo Abdesselam Tazi, mas a Relação de Lisboa revogou a decisão e o suspeito, considerado o cabecilha da célula, viria a ser condenado a 12 anos de prisão.