Só em julho de 2008 houve mais assassinatos em violência doméstica. Portugal está no 11.º lugar entre 21 países europeus.
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Nove mulheres foram mortas pelos companheiros, maridos ou antigos parceiros, em janeiro. Trata-se de um número dramático e o segundo mais elevado dos últimos 14 anos. Segundo o Observatório de Mulheres Assassinadas, da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), apenas em julho de 2008 houve mais mulheres a morrer nas mesmas condições. Naqueles 31 dias registaram-se 10 feminicídios - mais um do que em março de 2013 e em janeiro passado. E se analisarmos apenas o primeiro mês de cada ano constatamos que nunca houve um janeiro com tantas vítimas mortais em contexto de violência doméstica. Hoje, em Lisboa (15 horas), decorre uma marcha silenciosa de mulheres contra a violência.
Para Daniel Cotrim, da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), este dado não é surpresa. "De forma geral, percebemos que nos meses que sucedem a momentos festivos e de férias aumentam os pedidos de apoio. As pessoas estão mais tempo juntas e isso é potenciador de mais conflito e de mais violência", refere.
Ao JN, o responsável da APAV acrescenta outra justificação: "também estamos a falar de alturas de férias judiciais. Os processos de violência doméstica não são suspensos, mas nestes períodos os serviços do Ministério Público estão mais desfalcados e muitas vezes o procurador mais preparado para esta temática não é o que está de turno". Ou seja, com menos magistrados a trabalhar, a aplicação das "medidas de proteção à vítima e das medidas de coação ao agressor podem atrasar".
Números estáveis desde 2013
Com ou sem férias judiciais, mais de 23 mil homens (85%) e mulheres foram identificados pela PSP e GNR, em 2017, como suspeitos de crimes de violência doméstica. Lisboa, Porto, Gaia, Sintra e Loures foram os concelhos mais problemáticos, enquanto Monforte, Góis e Fronteira apresentaram os dados menos trágicos.
Esta estatística tem-se mantido estável desde 2013 e coloca Portugal a meio de uma tabela que inclui os principais países europeus. Segundo um estudo do Eurostat, é na Escócia, Espanha (ler texto na página seguinte) e Holanda que menos mulheres foram assassinadas por alguém com quem mantinham relação íntima. No outro lado do ranking estão a Lituânia, Malta e Albânia. Portugal encontra-se no 11.0º lugar de uma lista com 21 nações.
"Já estivemos na cauda da Europa, mas agora estamos a meio de um percurso. Avançou-se muito em 15 anos e em termos legislativos estamos na vanguarda europeia", defende Daniel Cotrim. Também Elisabete Brasil, presidente da UMAR, concorda que Portugal tem "boa lei", mas alega que esta de nada vale se "não for aplicada em consonância". "Vários relatórios apontam falhas, nomeadamente a falta de comunicação entre entidades. O que acontece é que a vítima anda de entidade em entidade, sem que seja o foco da atenção", frisa.
Comunicação é o que também pede Daniel Cotrim. "A avaliação e o diagnóstico estão feitos e o que falta é trabalhar e agir em rede", sustenta.