Homicídio de Cabanelas: autópsia ao corpo do adolescente autista de 17 anos prenuncia morte por afogamento. Mulher continua presa preventivamente.
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Quando se pôs a caminho do poço com o filho deficiente de 17 anos, Fátima Martinho já estaria a cumprir o plano que havia traçado para tirar a vida ao adolescente. É a tese da investigação, a cargo da Polícia Judiciária: a mãe premeditou o crime do filho por afogamento - e cumpriu-o.
O caso aconteceu no dia 6, em Cabanelas, freguesia do concelho de Mirandela com pouco mais de 300 habitantes, no distrito de Bragança, e deixou toda a gente num esbarrão emocional.
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Cerca das 10.30 horas da manhã, Fátima, de 52 anos, e o filho Eduardo José, autista e epilético, saíram de casa onde moravam os dois e percorreram a pé o caminho de terra até ao poço raso que fica a três quilómetros da habitação, já nos Batuqueiros, nos campos do vizinho Manuel Henrique. Antes, Fátima deu um calmante ao filho e esperou que o medicamento fizesse efeito. Depois, ainda preparou uma pequena merenda com bananas e água fresca e saíram os dois, chegando ao local antes do meio-dia.
Foi entre essa hora e as duas da tarde - altura em que Fátima telefonaria ao seu primo José Manuel Periquito a confessar o crime; foi ele que a demoveu de se suicidar no poço, indo ao seu encontro e trazendo-a de volta a casa no seu trator - que a mãe matou o filho.
Primeiro, Fátima tê-lo-á empurrado para a boca do poço, que tem entre três e cinco metros de profundidade e estaria na altura cheio de água. Após a queda e submersão do adolescente, Fátima terá usado a força dos dois braços para manter a cabeça do filho debaixo de água. Terá sido essa a causa da morte - o afogamento -, ainda que a autópsia, realizada na quarta-feira no Instituto de Medicina Legal de Mirandela, também indique no relatório preliminar dois ferimentos na cabeça do rapaz, acaso derivados da queda no poço de pedra.
O ímpeto hostil do rapaz
A premeditação do crime estará ancorada no "inferno" que a mãe alegadamente viveu com o filho nos últimos quatro meses e cujo transtorno do espectro do autismo estaria a piorar. Conforme relatam familiares e vizinhos, as manifestações de ímpeto hostil vinham a aumentar desde que o rapaz foi forçado, em meados de março, a deixar a turma de ensino especial que frequentava diariamente, das 9 às 18 horas, na Escola Afonso III, de Vinhais, que fechou com a crise pandémica, ficando confinado à casa com a mãe, que era divorciada e sem mais filhos.
Tardiamente entrado na puberdade, o adolescente de 17 anos começara também a despertar para a sexualidade - houve vários episódios em que, para lá de ameaçar fisicamente a mãe, Eduardo protagonizou momentos de autossatisfação sexual explícita, perturbando o quotidiano familiar.
Ali na aldeia ninguém a condena
"Ela esgotou-se, estava saturada, sem autoestima, sem vida, vivia num inferno sozinha com o menino deficiente - e depois fez a asneira". Maria Helena Esteves, vizinha de Fátima, a mãe homicida confessa, não condena o crime nem a conduta: "E aqui na aldeia não vai encontrar quem lhe diga o contrário, a Fátima era boa mãe". "Nem acreditamos nisto, parece um filme, e dos de terror, mas nem parece que aconteceu aqui", diz Manuel Joaquim Fernandes, que espera a qualquer altura "acordar do sonho negro". O vizinho depois abana a cabeça a concordar, cabisbaixo, quando Angelina Lopes, tia de Fátima, usa esta expressão: "Ainda nem conseguimos chorar, estamos para aqui, engasgados, com a alma a tremer".
Funeral é hoje
As cerimónias fúnebres de Eduardo José, 17 anos, alegadamente morto pela mãe num poço de Cabanelas, concelho de Mirandela, terão lugar hoje pelas 11 horas, na igreja de Cabanelas. A realização da autópsia terá motivado o adiamento do funeral, que chegou a estar aprazado para ontem. O corpo seguirá depois para o cemitério da aldeia.
Mensagem da escola
Os colegas de Eduardo no Agrupamento de Escolas D. Afonso III, de Vinhais, partilharam uma mensagem de apoio: "O Edu era um menino especial, meigo, querido e demasiado inocente para as crueldades deste Mundo".