Ações porta a porta procuram prevenir aproveitamentos: há casos de pessoas a perguntar se querem desinfetar o dinheiro. Pandemia agravou a solidão dos que vivem isolados.
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"Dona Maria, é a GNR". O agente Eduardo Viamonte chama por Maria Helena, de 77 anos, à sua porta, em Arga de São João, em Caminha. A idosa está em casa, onde tem passado os dias de confinamento, entretida com a sua horta e os seus animais domésticos. A visita dos militares da GNR é das poucas que tem recebido desde que começou a pandemia.
"Uma pessoa não vê ninguém. Quando havia uma missa, a gente até ia para falar com as pessoas, que é quando se juntam um bocadinho, mas não há. É chato", diz, aborrecida, contando que pela aldeia deserta apenas passam "o Fernando do pão, três vezes por semana, o Paulo do peixe, quase todos os dias, e o merceeiro Benjamim, duas vezes por semana". "Não há muitas conversas", resume.
A vizinha Alice é das poucas com quem Maria Helena vai conversando. Mas esta nem sempre está recolhida. "Saio com as ovelhas. Tenho de ir, senão morrem. Vou e depois venho para casa. Hoje, tive de ir a Caminha tratar do registo delas. Tive sorte que estava sol. Foi Deus. Peço a Deus. Sou muito religiosa. Missa não há, mas rezo muito", diz Alice Barros, de 69 anos.
"A nossa perceção é que esta pandemia veio isolar ainda mais estes idosos. Não podem sair de casa. Alguns optaram mesmo por não sair mais, não têm filhos ou família próxima, e acabam por ficar isolados e a única visita que têm é a nossa ou de entidades locais", declarou o comandante do Destacamento Territorial de Viana do Castelo, Pedro Costa, que numa destas manhãs acompanhou no terreno os agentes Eduardo Viamonte e Andreia Correia, que formam a equipa de intervenção junto da população mais vulnerável.
A GNR tem sinalizados 42 mil idosos a viver isolados. No distrito de Viana do Castelo são 1043, dos quais 128 nos concelhos de Viana e Caminha, onde aqueles operacionais estão a alertar os mais velhos para as burlas que a pandemia trouxe.
"Temos, por todo o país, algumas pessoas que arranjaram aqui uma oportunidade para enganar os idosos. Viemos prevenir que a vacinação será nos centros de saúde e não em casa, e que há burlões a bater à porta das pessoas a perguntar se têm dinheiro para desinfetar", diz o comandante Pedro Costa.
Damião Afonso de 82 anos, vive com a irmã Ana de 67, na aldeia de Azevedo. Aos guardas, conta que "estava a ler a bíblia". "Gosto de a ler. Diz que Jesus Cristo era amigo do povo", afirma. Ana comenta: "Desde que veio esta pandemia, ele tem medo. Desde março que não sai de casa".