Associação fez reclamação hierárquica por magistrada de Évora ter acusado só motorista do ex-ministro. Mas reabertura de inquérito pode não mudar nada
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O ex-ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita e o chefe da segurança da comitiva, Nuno Dias, vão ser constituídos arguidos no processo do acidente na A 6 em que, a 18 de junho de 2021, a viatura do então governante atropelou mortalmente um trabalhador, Nuno Santos, da manutenção da autoestrada.
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"Importará (...) proceder, com todas as consequências legais processuais que lhe são inerentes, à constituição formal como arguidos daqueles dois indivíduos", decidiu, esta quarta-feira, o diretor do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Évora, José Laia Franco, sobre o requerimento da Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados (ACA-M). Esta, assistente no processo, suscitara uma intervenção hierárquica, pedindo que Eduardo Cabrita seja acusado, "em autoria paralela e por omissão", de homicídio por negligência".
Em dezembro, uma procuradora do DIAP encerrou o inquérito e só acusou, por homicídio negligente, o motorista Marco Pontes, por o mesmo conduzir em excesso de velocidade (163 km/h) e na via esquerda da faixa de rodagem. Eduardo Cabrita demitiu-se de ministro, ainda que o despacho de encerramento não abordasse a sua eventual responsabilidade criminal, nem a de Nuno Dias.
Inconformada, a ACA-M fez uma reclamação hierárquica e, considerando que Cabrita tinha "poder legal" para "dar ordens e instruções", pediu que ele seja fosse investigado. Quanto ao chefe da segurança - que, durante o inquérito, alegou que desconhecia a velocidade a que a viatura seguia, dizendo que esta era sempre "a velocidade adequada a cada missão, ao momento e ao local" -, a assistente não formulou expressamente o mesmo pedido. No entanto, o diretor do DIAP conclui que, "atenta a formulação que utiliza" a ACA-M, "tem de entender-se que pretenderá estender essa responsabilidade à pessoa responsável pela segurança da comitiva".
Assim sendo, Laia Franco decidiu que a procuradora do inquérito deve constituir como arguidos Eduardo Cabrita e Nuno Dias e, sem necessidade de recolha de mais prova, apreciar "as alegadas condutas omissivas de um e de outro". O que significa que pode manter a sua decisão anterior.
Crime por omissão
Pena até cinco anos
O Código Penal prevê para o homicídio por negligência pena de prisão até três anos (cinco se for grosseira). Quando cometido por omissão a pena pode ser "especialmente atenuada", segundo o artigo 10.º.
Dever jurídico
"Quando um tipo legal de crime compreender um certo resultado, o facto abrange não só a acção adequada a produzi-lo como a omissão da acção adequada a evitá-lo (...), define o artigo 10. º, precisando que o crime, nesta forma, "só é punível" quando sobre o visado "recair um dever jurídico que pessoalmente o obrigue a evitar esse resultado".