A mulher e a filha de Marco “Orelhas”, respetivamente Marisa Santos e Iara Gonçalves, não serão julgadas pela morte de Igor Silva, como pretendia a mãe do jovem assassinado, em maio do ano passado, junto ao Estádio do Dragão, no Porto. "Jonai" também deixa de responder pelo assassinato do adepto do F. C. Porto.
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Carlos Rosa, conhecido pela alcunha de “Jonai”, livrou-se da acusação de homicídio e só responderá, em tribunal, pelo crime de ameaça. Já Rui Costa (“Dentinho”), Sérgio Machado e Paulo Cardoso (“Chanfra”), que tinham contestado a acusação do Ministério Público (MP), continuam indiciados da morte de Igor Silva. A decisão, conhecida neste domingo, foi tomada pelo juiz de instrução criminal Pedro Miguel Vieira, após o debate instrutório realizado na semana passada.
O MP tinha acusado oito homens, incluindo Marco “Orelhas” e o filho Renato, do assassinato de Igor Silva, ocorrido no âmbito de uma emboscada realizada durante a celebração do título de campeão nacional do FC Porto, na época 2021/22. A mulher e filha do elemento dos Super Dragões também foram indiciadas neste processo, mas apenas pelo crime de ofensas à integridade física. Uma decisão que a mãe da vítima mortal contestou. Augusta Sousa queria mais e requereu a abertura de instrução para pedir que Marisa Santos e Iara Gonçalves fossem igualmente pronunciadas pelo mais grave dos crimes.
Contudo, num despacho conhecido neste domingo, o juiz Pedro Miguel Vieira rejeitou a sua pretensão. “A análise efectuada pelo MP no final do inquérito quanto à prova recolhida e à extensão da responsabilidade criminal destas arguidas não merece, a nosso ver, qualquer reparo. Na verdade, do conjunto da prova produzida, não se vislumbra qualquer atividade desenvolvida por estas arguidas que permita concluir no sentido defendido pela assistente [mãe do Igor]”, sustenta o magistrado.
Segundo o juiz, “no requerimento de abertura da instrução, não se consegue alcançar qualquer alegação ou referência a meios de prova recolhidos no decurso da investigação que permita afirmar a intervenção das referidas arguidas nas agressões de que foi vítima o falecido Igor”. “Aquilo que se extrai da prova produzida nos autos é que estas arguidas ficaram envolvidas numa outra contenda, ocorrida um pouco mais abaixo do local onde tiveram lugar as agressões à vítima Igor, não tendo tido qualquer intervenção nestas últimas, nem direta ou indiretamente”, acrescenta.
Pedro Miguel Vieira afirma ainda que, “mesmo que se pudesse afirmar que estas arguidas tinham pleno conhecimento da intenção dos demais arguidos, de agredirem a vítima Igor e até lhe retirarem a vida, o certo é que a concreta atuação daquelas que surge sustentada na prova recolhida nos autos impede que se possa afirmar que esta última intenção era também a sua”.
Dúvida beneficia “Jonai”
O juiz do Tribunal de Instrução Criminal do Porto manteve a tese do MP quase intacta e também confirmou a indiciação por homicídio imputada a Rui “Dentinho”, Paulo “Chanfra” e Sérgio Machado que, apesar de terem pedido a nulidade da acusação, serão julgados pela morte de Igor Silva.
O mesmo já não acontecerá com “Jonai”. Também acusado de homicídio, “Jonai” foi outro que requereu a abertura de instrução e, na diligência realizada na semana passada, negou qualquer envolvimento nos confrontos que resultaram na morte de Igor Silva. O juiz até considerou que as declarações prestadas “não eram credíveis no geral”, mesmo assim concluiu que “não existem nos autos quaisquer imagens que coloquem o arguido Carlos no local onde ocorreram as agressões ao falecido Igor, nem tão pouco o arguido é colocado nesse local por alguma das testemunhas inquiridas”.
Para o magistrado, a circunstância de “Jonai” “surgir na companhia de outros co-arguidos, como seja na escada do metro ou na zona do shopping, não é, por si só, suficiente para sustentar a conclusão a que chegou o MP na acusação que deduziu, tanto mais que se trata de um momento bem anterior à morte do Igor Silva”. “Em síntese, da prova produzida nos autos não resulta clara a alegada intervenção do arguido nos factos que conduziram à morte de Igor Silva, ficando, pelo menos, a dúvida quanto a essa concreta participação. Esta dúvida, que se mostra insanável, tem necessariamente de ser valorada em favor do arguido, no respeito pelo princípio da presunção da inocência”, explica.
Na opinião da advogada de “Jonai”, Cristiana Carvalho, “foi feita justiça”. “O meu cliente não deveria ter sido acusado pelo crime de homicídio. Não havia quaisquer provas que pudessem colocá-lo no crime. Foi uma decisão correta do senhor juiz de instrução, que analisou minuciosamente o processo”, declara.
Ajuste de contas traiçoeiro
No despacho instrutório, Pedro Miguel Vieira descreve, por fim, “um comportamento pouco comum em circunstâncias de homicídio, quer pelo elevado número de intervenientes, quer pelo elevado número de golpes vibrados na vítima, alguns deles letais”. Fala, igualmente, num “especial juízo de censura ao nível da culpa” num caso em que, “pelo menos, um dos golpes atingiu a vítima pelas costas e de forma traiçoeira” e que foi motivado por “um aparente ajuste de contas”.
O juiz também ficou convencido, sobretudo pelo visionamento das imagens anexas ao processo, da “falsidade das declarações” prestadas por Renato Gonçalves e do seu pai, Marco “Orelhas”. Convencido ficou ainda que foi com uma “sensação de superioridade destemida de força grupal que os elementos da família Gonçalves se dirigem para a zona onde supostamente teriam informação da presença do Igor, no meio dos festejos, e procuram fazer a sua justiça sem olhar a meios, afastando e agredindo tudo e todos no seu caminho, concretamente aqueles que tentaram evitar, posteriormente, a perseguição e agressão ao Igor Silva”.