De 2017 para 2020, o número de assaltos a multibancos caiu de 203 para 25. E mesmo os roubos concretizados naquele último ano não resultaram em lucros para os grupos criminosos, uma vez que os sistemas de segurança das máquinas inutilizaram as notas.
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Para a queda abrupta de um crime que chegou a merecer destaque no Relatório Anual de Segurança Interna contribuíram, sobretudo, três fatores: um despacho governativo que impõe medidas de segurança e avaliações de risco a efetuar pela PSP aos multibancos, o desenvolvimento de sistemas de tintagem de notas capazes de resistir a explosões e a investigação policial, que levou à detenção dos principais grupos criminosos.
A solução surgiu quando, com os bancos em pânico pela sucessão de assaltos e a Polícia sem meios para travar um crime que fomentava um grande sentimento de insegurança, foi criado, em 2017, um grupo de trabalho para discutir medidas de combate. Baseado nas conclusões dessa "task force" nasceu um "despacho governativo, que forçou os bancos a investir na segurança", refere o atual diretor do Departamento de Segurança Interna da PSP, superintendente Pedro Gouveia.
Autoestrada perto é mau
O oficial da Polícia explica que esse documento impôs que a instalação de novos equipamentos ou a troca de versões antigas passasse a ser sujeita a uma avaliação de risco pela PSP. Os critérios a cumprir pelos novos multibancos mantêm-se secretos, mas o JN sabe que a sua proximidade a uma esquadra ou a existência de obstáculos, como uma escada, entre o local de instalação e a via pública são fatores positivos.
Por outro lado, uma fraca iluminação do espaço, a diminuta movimentação de pessoas ou a existência perto de um nó de autoestrada, que pode ser usado como local de fuga, são aspetos que levam a PSP a proibir a instalação do multibanco no local pretendido. "Os nossos pareceres são vinculativos", salienta o superintendente Pedro Gouveia.
Testes de campo com explosões
Pedro Gouveia sustenta ainda que "se tornou público que os multibancos são capazes de resistir a quase todo o tipo de ataques" e que esta perceção desmotivou os grupos especializados neste crime. Uma maior resistência dos multibancos, sobretudo do seu sistema de tintagem de notas, foi alcançada através de uma parceria entre a PSP, bancos e empresas portuguesas, que permitiu o desenvolvimento de tecnologia que, atualmente, todo e qualquer equipamento incorpora e que já é cobiçada no estrangeiro.
"Foram realizados muitos testes de campo, com o apoio da Unidade Especial de Polícia e do Departamento de Armas e Explosivos da PSP, que culminaram na descoberta de condições, sistemas e requisitos de segurança que minimizavam o risco. Hoje, dificilmente algum ataque a um multibanco terá sucesso. A tintagem das notas está garantida", assegura Pedro Gouveia.
Máquinas com nova sinalética
O grupo de trabalho, composto pela Secretaria de Estado da Administração Interna, entidades bancárias, operadores e polícias e coordenado pelo Departamento de Segurança Privada da PSP, definiu medidas de segurança mínimas para os multibancos. Desde 2017 que estão, obrigatoriamente, equipadas com sistema de tintagem de notas, alarme de deteção de gás, que vinha sendo usado para fazer explodir as máquinas, e sinalética de segurança, que está a ser substituída por uma nova versão.
Portugal é referência
A redução do número de roubos a multibancos em Portugal tornou-se um "caso de estudo" em toda a Europa e uma referência noutras partes do Mundo. "A Polícia de Singapura foi a primeira a vir cá ver como é que o nosso modelo de segurança funcionava", afirma Pedro Gouveia. O superintendente, que confirma que os assaltos a multibancos continuam a ser frequentes em muitos países, avança que também foram realizadas várias "reuniões com polícias europeias". O objetivo foi o mesmo: aprender para replicar.
Exportar tecnologia
Referências mundiais são, também, as empresas portuguesas especializadas em soluções de segurança para bancos e proteção de multibancos. Entre estas, a Feerica, com sede em Mafra e que desenvolveu o sistema SmartStain. A empresa assegura proteção contra "todos os tipos de ataques, incluindo corte, ram-raids e explosivos" e que, em casos de roubo, "marca irreversivelmente as notas roubadas com uma tinta colorida e indelével, que deixará um rastro sólido para aqueles que tentarem transacionar dinheiro roubado". A Feerica anuncia que tem clientes em 43 países onde já instalou 60 mil versões do SmartStain e protege, diariamente, 1,6 biliões de euros.
2005 avaliações de risco para a instalação de terminais de multibanco foram efetuadas no ano passado pela PSP, número que só tinha sido ultrapassado em 2019, com 2407 inspeções.
13 000 multibancos estão atualmente instalados e em funcionamento em Portugal, segundo os dados da PSP que, em 2020, registou apenas 20 ataques que tiveram por alvo aqueles terminais.