A Autoridade Nacional do Medicamento recusa-se aplicar coimas a quem a PSP e GNR apreendeu óxido nitroso, conhecido como a "droga do riso".
Corpo do artigo
O Infarmed diz não estar habilitado a tramitar estes processos e, para já, não há uma decisão sobre qual a entidade competente para aplicar contraordenações pela utilização recreativa do óxido nitroso.
Num documento difundido recentemente entre as polícias, a que o JN teve acesso, o Infarmed pede a suspensão de entregas das botijas nas suas instalações. Para esclarecer quem era competente, esta autoridade contactou a ASAE e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), lê-se no documento. Porém, ainda não há decisão.
O óxido nitroso é um anestesiante médico que está hoje a ser distribuído em bares, discotecas e festas sem qualquer controlo. O abuso da "droga do riso", que também é usado para encher balões, pode causar dependência, danos cerebrais, ou até a morte por hipoxia cerebral. Porém, os seus componentes (nitrogénio e oxigénio) não são estupefaciente. Quem o vende não comete qualquer crime. Arrisca, sim, uma coima pela distribuição de um produto destinados a fins exclusivamente hospitalares e que carece de uma licença do Infarmed. Os valores variam entre os 2500 e os cinco mil euros.
Desde 2006, pelo menos 16 mortes foram associadas a esta substância no Reino Unido, sendo um dos principais motivos a hipoxia cerebral. O gás causa um efeito anestesiante por ser mais rápido a chegar ao cérebro que o oxigénio. Também em Inglaterra, as autoridades chegaram a apreender 1200 cartuchos numa só noite. Nas latas estava explicito que o gás não era destinado ao consumo humano. Os vendedores foram detidos.
Infarmed com processos
A Autoridade do Medicamento, que se diz agora incompetente para conduzir os "inúmeros" processos de contraordenação, assegurou em junho ao JN ter em curso contraordenações, pela utilização e obtenção de óxido nitroso, fora do ambiente hospitalar. Até se demonstrava disponível para, em conjunto com as polícias, investigar como estas botijas chegavam à rua.
Mas, agora, o Infarmed informou as polícias de que não tem competência para instaurar processos de contraordenação, porque as apreensões são realizadas em lojas, bares ou mesmo em festas de rua. Ou seja, a venda da "droga do riso" é feita em locais e para fins que não são regulados pelo Infarmed.
O JN tentou junto do Infarmed obter esclarecimentos, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta. O mesmo foi feito junto da ASAE e APA, entidades que também não responderam.
As apreensões de garrafas de óxido nitroso em bares, festas de rua e até em casa de traficantes de droga são já comuns. Até aumentaram desde o início da pandemia, conforme o JN notificou em primeira mão. A PSP teve de difundir, em agosto, um manual de procedimentos pelas esquadras, onde é explicado aos agentes que devem identificar o detentor, além de apreender as botijas e encaminhá-las para o Infarmed.
Tal procedimento perde agora o efeito, mas há uma alternativa. Perante a apreensão, as polícias podem deixar as botijas na posse dos donos. Estes são nomeados fiéis depositários, o que faz com que não as possam utilizar até que seja decidida qual a entidade com responsabilidade da instauração dos processos de contraordenação.
Principais apreensões
25 de abril: discoteca no Seixal
A primeira apreensão de uma botija pelas autoridades deu-se no Seixal, pela PSP, durante uma festa que decorria numa discoteca sem licença para funcionamento a 25 de abril. A PSP apreendeu duas botijas de óxido nitroso e vários balões.
27 de maio: GNR chega ao vendedor
Em albufeira, a GNR apreendeu seis botijas de óxido nitroso num bar, onde havia clientes a inalar óxido nitroso. Os militares encontraram uma botija por detrás do balcão do bar e no dia seguinte localizaram o suspeito de fornecer o óxido nitroso. Na sua posse tinha cinco botijas.
18 de maio: confisco recorde em Almada
No Monte da Caparica, a GNR apreendeu 164 botijas numa carrinha durante um patrulhamento. Três suspeitos, com idades entre os 27 e os 30 anos, sem antecedentes criminais, foram identificados e alvos de contraordenação, remetida para o Infarmed.
9 d ejunho: roubo leva a botijas
A GNR de Albufeira apreendeu cinco botijas. A apreensão deu-se durante umas buscas domiciliárias a dois homens, que estavam a ser investigados por um roubo por esticão, em Loulé.
13 de junho: GNR volta a apreender botijas
A GNR voltou a apreender no Monte da Caparica a 4 de junho 19 botijas de óxido nitroso. Dois indivíduos de 37 e 55 anos, sem antecedentes criminais, foram identificados e alvos de contraordenação, remetida para o Infarmed. Apreendeu outra botija numa festa ilegal.
22 de setembro: tráfico de droga
A PSP do Seixal apreendeu oito botijas de óxido nitroso, a chamada droga do riso, em buscas em casas de dois jovens com 21 e 23 anos por indícios de tráfico de estupefacientes. Para além das oito garrafas, os suspeitos tinham 700 balões, utilizados para o consumo, cocaína, haxixe e heroína.