O Chefe do Estado-Maior da Armada (CEMA), almirante Gouveia e Melo, tem recebido ameaças contra a sua vida, que serão consequência das suas criticas aos dois fuzileiros presos por terem agredido mortalmente um agente da PSP, na madrugada de 19 de março, numa rixa registada à porta de uma discoteca de Lisboa. A Polícia Judiciária está a investigar as ameaças.
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"Está a acontecer", confirmou ao JN Gouveia e Melo, sobre as ameaças que vem recebendo, nomeadamente, através de carta e do telemóvel. O almirante não quis, no entanto, entrar em pormenores sobre o teor e as datas das mensagens, por considerar que isso poderia prejudicar o trabalho das autoridades que estão a investigá-las.
O almirante CEMA apresentou queixa das ameaças à Polícia Judiciária - que, contactada pelo JN, se recusou a prestar declarações sobre o assunto - e confia no trabalho que estará a ser feito. "Estou totalmente tranquilo, face ao trabalho das forças de segurança e autoridades. As autoridades estão a trabalhar", vincou, insistindo que o mais que esclarecesse sobre o assunto poderia prejudicar esse trabalho.
"O teu inferno vai começar. Meteste-te com quem não devias", lê-se numa das ameaças ao almirante, citada pelo Correio da Manhã.
"Não queremos arruaceiros na Marinha"
"Não quero arruaceiros na Marinha; não quero bravatas fúteis, mas verdadeira coragem, física e moral; não quero militares sem valores, sem verdadeira dedicação à Pátria; não aceito quem não perceba que na selva temos que ser lobos, mas em casa cordeiros, pois isso é a verdadeira marca de autodomínio, autocontrole e de confiança dos outros em nós. Nós somos os guerreiros da luz e não das trevas", afirmou o chefe do Estado-Maior da Armada em discurso perante o corpo de fuzileiros da Marinha, no dia do funeral do agente da PSP Fábio Guerra, em 26 de março.
A quem na Marinha não se identificar com aqueles valores, Gouveia e Melo indicou a porta de saída: "Que parta e nos deixe honrar a nossa farda, o nosso legado de mais de 700 anos de Marinha e de 400 de Fuzileiros", pediu.
Entretanto, os contratos dos fuzileiros suspeitos, Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko, que estão em prisão preventiva, chegaram ao fim e não foram renovados pela Marinha.
O agente da PSP Fábio Guerra estava à civil na discoteca e, no confronto que envolveu os dois fuzileiros e um civil que está em fuga, caiu ao chão e foi pontapeado na cabeça.
O capelão desbocado
Há ainda outro episódio relacionado com a morte do agente da PSP que pode ter o seu peso na história. Dez dias depois da rixa mortal à porta da discoteca Mome, o padre capelão Licínio Luís saiu em defesa dos dois fuzileiros arguidos, num discurso crítico para com a intervenção feita por Gouveia e Melo no dia do funeral de Fábio Guerra.
"Os jovens estavam a divertir-se e foram provocados. Um deles, campeão nacional de boxe, no seu escalão, foi atingido à falsa fé e reagiu. O senhor almirante que aguarde pela justiça. Nunca foi para a noite? Nunca bebeu uns copos?", escreveu o padre numa rede social.
O chefe do Estado-Maior da Armada fez saber que não tinha gostado das palavras do capelão, e este pediu desculpa. "Enquanto militar, errei ao dirigir-me de forma incorreta, inapropriada, interpretativa e pública ao almirante CEMA", afirmou Licínio Luís, que foi reintegrado, mas acabaria por ser transferido da Marinha para o Exército.
Almirante pode ter segurança pessoal
Caberá agora à Polícia Judiciária confirmar que aqueles episódios estão relacionados com as ameaças a Gouveia e Melo e tentar identificar os seus autores.
A avaliação das ameaças pode levar as autoridades a garantir segurança pessoal a Gouveia e Melo.
O almirante ganhou notoriedade pública enquanto chefe de missão para a vacinação contra a covid-19. O seu trabalho foi amplamente reconhecido e garantiu-lhe uma notoriedade pública que já o leva a ser incluído em sondagens entre os putativos candidatos a futuras eleições para a Presidência da República.