Magistrados preteridos para o cargo de coordenador de comarca falam de "processo pouco transparente" e com "irregularidades".
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Um grupo de magistrados do Ministério Público está insatisfeito e vai contestar judicialmente o concurso para coordenador em 14 comarcas, por considerar que o processo foi "pouco transparente" e decidido "com irregularidades", padecendo de vícios processuais, como a ausência de audiência prévia e o direito de reclamação. E sugere que terá havido "graduações e escolhas cirúrgicas" para impedir que procuradores, independentes e com provas dadas, pudessem ser "incómodos" na função.
Fonte ligada ao processo disse ao JN que os procuradores acreditam que terá havido uma "escolha seletiva", em parte partidarizada, dada a existência de dois socialistas entre os membros do júri que procedeu à graduação prévia (que ainda não foi notificada a qualquer candidato), a qual visou afastar procuradores com provas dadas na luta contra a corrupção.
Dizem, ainda, que foram escolhidos magistrados com currículo muito inferior ao dos preteridos. E que as regras do concurso foram mudadas ao longo do processo. Não aceitam, também, que o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) tenha considerado o processo "urgente", mandando publicar a decisão no "Diário da República", sem os deixar reclamar. Acentuam ainda que o concurso já devia ter sido concluído em novembro, pelo que, afirmam, "não há nenhuma urgência, a não ser a do facto consumado".
O grupo considera que há ilegalidade na autorização de (re)candidatura à segunda renovação de comissão de serviço como coordenador, ainda que para comarca diversa, acentuando do que "a deliberação do CSMP de novembro de 2019 admitiu a segunda renovação de comissões de serviço de coordenador para comarca diversa daquela onde o candidato esteve anteriormente colocado, contra o disposto no Estatuto do MP".
Cinco preteridos
Entre os magistrados preteridos estão alguns com notoriedade na direção da investigação de grandes processos. É o caso de Carlos Nascimento Teixeira (Apito Dourado) que não ficou no Porto e acabou colocado em Porto-Este/Penafiel, porque pontuaram à sua frente um candidato que, segundo a mesma fonte, legalmente não podia concorrer, pois trata-se de uma segunda renovação; Carlos Filipe Preces Ferreira (Face Oculta, Operação Marquês), que ficou fora do lote de três candidatos.
O mesmo aconteceu com Jorge Reis Bravo, coordenador do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Braga quando avançaram os processos TUB-Transportes Urbanos, Convertidas (envolvendo Mesquita Machado), e outros visando a gestão das câmaras de Póvoa de Lanhoso e Vila Verde. José Albuquerque, coordenador de estágios durante dez anos e autor de artigos críticos das políticas de justiça, não teve qualquer pontuação na rubrica "experiência profissional" e foi preterido em Setúbal. Paulo Balsemão Campos, coordenador do DIAP Regional do Porto aquando da Operação Teia, visando as câmaras de Barcelos e Santo Tirso, foi outro preterido.
O grupo aponta outras "ilegalidades", como a de candidatos que não pontuaram no critério com a maior notação, no que toca a "experiência profissional relevante", casos de Remísio Melhorado (apesar de ter concorrido a uma segunda renovação de mandato), e de António Abrantes, mesmo após dois anos e meio a substituir o coordenador de Viseu e mais de dez a liderar círculos judiciais. O JN interpelou a Procuradoria-Geral da República sobre o caso, mas não obteve resposta em tempo útil.
Supremo não deu razão a protesto de juízes
Uma polémica semelhante deu origem a providências cautelares contestando os nomes de juízes indicados pelo Conselho Superior da Magistratura para a presidência de várias comarcas. O protesto veio de dois juízes, que viram, há dias, a sua argumentação rejeitada pelo Supremo Tribunal de Justiça. Rui Teixeira (juiz do processo Casa Pia) e Marília Fontes tinham contestado a escolha dos presidentes das comarcas de Lisboa, Lisboa Norte e Lisboa Oeste e Bragança. Pediam a suspensão das nomeações, alegando irregularidade do meio de votação, violação dos princípios da transparência, da imparcialidade e da igualdade, violação de lei e falta de fundamentação. A posse dos presidentes de comarca ainda não tem data.
Juiz preside a Conselho de Gestão
Segundo a Lei da Organização do Sistema Judiciário, do Conselho de Gestão da Comarca fazem parte "o juiz presidente do tribunal, que preside, o magistrado do Ministério Público coordenador e o administrador judiciário".
Comissão de serviço de três anos
O magistrado coordenador do Ministério Público é nomeado pelo Conselho Superior, em comissão de serviço. A sua função é dirigir e coordenar "a atividade do Ministério Público na comarca, emitindo ordens e instruções".