Vítimas, entre os seis e os nove anos, nem tinham “vocabulário” para descrever o que lhes aconteceu.
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O Tribunal Judicial de Guimarães, condenou, esta terça-feira, Fernando S., professor do ensino básico na Póvoa de Lanhoso, a 17 anos de prisão, por 275 crimes de abuso sexual de menores, três de maus tratos de menores e um de pornografia infantil. Os crimes foram cometidos entre março de 2018 e abril de 2024, contra dez vítimas, com idades compreendidas entre os seis e os nove anos. O professor foi também condenado a uma pena acessória de proibição de exercer profissões em que tenha contacto com crianças e de ter menores a seu cargo, durante 18 anos.
O professor, de 50 anos, estava acusado pelo Ministério Público (MP) de 3734 crimes, contra 11 vítimas. O arguido negou os factos relativos a três das vítimas, apesar de, no essencial, ter confessado a maioria dos crimes que lhe foram imputados na acusação. Em sede de julgamento, o coletivo de juízas não deu como provados os crimes relativos a uma das vítimas e acabou por reduzir significativamente a contabilidade do número de crimes.
Apesar de o tribunal ter considerado os testemunhos das vítimas “credíveis e consistentes”, assumiu que a maior dificuldade do julgamento foi conseguir apurar o “número de vezes” em que as alunas foram abusadas. “Estas crianças não tinham à data vocabulário, nem tão pouco maturidade para compreender os atos a que foram sujeitas”, conclui o tribunal.
Acabou por ser este detalhe que reduziu o número de crimes dados como provados. Se o Ministério Público multiplicou os crimes pelo número de dias de aulas, as juízas tiveram a preocupação de verificar quando é que Fernando S. teria realmente tido contactos impróprios com as alunas. “É comum a existência de atividades em dias temáticos, com interação com outras turmas e até pessoal docente e não docente que também não proporcionam a prática dos atos da natureza imputados”, lê-se no acórdão.
Dos 3734 crimes de que era acusado o arguido acabou condenado, em cúmulo jurídico, a 17 anos de prisão, por 275 de abuso sexual de menores, agravados pela relação professor/aluno, três de maus tratos e um de pornografia infantil. Fernando S. fica ainda proibido, durante 18 anos, de exercer qualquer profissão em que esteja próximo de crianças e de “assumir confiança de menor”, ou seja, não pode adotar, apadrinhar civilmente ou ter a guarda de crianças. O MP tinha pedido uma pena entre os 20 e os 25 anos.
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Foi professor em várias escolas
Fernando S. tinha uma carreira docente de 24 anos, quando foi detido pela Polícia Judiciária, em maio de 2024. O professor, que estava em vésperas de celebrar 50 anos quando foi detido, já tinha dado aulas no Porto, Vila Nova de Gaia, Barcelos e Amares. Segundo as suas declarações, consideradas “convincentes” pelo tribunal, o primeiro episódio de abuso terá acontecido em março de 2018, quando ajudava uma das vítimas a fazer um “origami” de um gato. Os crimes por que foi agora condenado aconteceram na sala, enquanto dava aulas, na presença de toda a turma. A pretexto de tirar dúvidas, o professor sentava as alunas no colo e era nesses momentos que cometia os abusos. Algumas das crianças testemunharam que os abusos aconteciam “muitas vezes”, “quase sempre” ou “todos os dias”.
Pediu desculpa
Durante o julgamento, o professor reconheceu a gravidade dos seus atos, pediu desculpa às vítimas e solicitou tratamento psicológico, o que terá sido levado em conta na ponderação da pena. No relatório psicológico são sublinhadas “distorções cognitivas que podem facilitar a prática de crimes, havendo risco futuro de reiteração de condutas”.
Indemnizações
Fernando S. foi condenado a pagar indemnizações às vítimas, a título de danos não patrimoniais, entre 2500 e 35 mil euros, num total de 192.500 euros.
Despedido do ensino
O professor do ensino básico foi alvo de um processo disciplinar que começou por determinar a sua suspensão e culminou no seu despedimento.