Linha de investigação sobre burlas informáticas para assaltar contas bancárias em Portugal e Espanha concentra a maioria dos suspeitos.
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A rede de tropas, testas de ferro e ex-comandos suspeita de usar aviões militares para traficar diamantes, ouro e droga, entre África e a Europa, que foi desmantelada pela Polícia Judiciária (PJ) há cerca de três meses, já conta com mais de 60 arguidos. Nas últimas semanas, novos indivíduos foram confrontados com suspeitas de branqueamento de capitais, na Operação Miríade.
Segundo informações recolhidas pelo JN, a maioria dos novos arguidos prende-se com a linha de investigação que envolve crimes de burla informática, acesso ilegítimo e lavagem de dinheiro.
Além do esquema de tráfico de diamantes montado por atuais e ex-militares, o inquérito da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ também levantou o véu sobre uma gigantesca operação de branqueamento de capitais. Nesta parte da investigação, desde novembro, foram constituídos mais de 20 novos arguidos.
Além de lavarem o dinheiro proveniente do tráfico de diamantes, ouro e droga, o grupo começou a assaltar, por via eletrónica, contas bancárias de particulares, tanto em Portugal como em Espanha. O dinheiro era roubado através do método conhecido como "phishing", em que são obtidos os dados dos clientes bancários.
Dois milhões já contabilizados
O ex-comando Paulo Nazaré, tido como o cérebro da rede, diversificou a atividade após participar na sua última missão da ONU na República Centro-Africana e deixar a vida militar em 2018. Mas terá sido Wilker Rodrigues, um dos seus homens de confiança, a criar o plano para se apoderar de dinheiro de contas bancárias e encaminhá-lo para uma rede de testas de ferro, que emprestavam as contas para o dinheiro circular.
Clientes do Novo Banco recebiam emails em tudo semelhantes aos desta instituição. Nas mensagens, os criminosos pediam-lhes o código de acesso ao homebanking. Dezenas de pessoas caíram na burla e acabaram com as contas vazias. O dinheiro era posto a circular por contas de membros da rede e dividido entre eles, nomeadamente com Paulo Nazaré. Foram referenciadas verbas provenientes de Espanha, pelo que neste país foi também aberta uma investigação.
As autoridades portuguesas detetaram transferências de dinheiro das burlas para o Brasil, onde Wilker Rodrigues tinha contactos. Foram ainda descobertas ligações deste suspeito a Inglaterra e ao Dubai, por onde poderá ter circulado algum dinheiro.
Noutros casos, os indivíduos levantavam dinheiro dos crimes em caixas multibanco. Em escutas telefónicas da PJ, alguns arguidos explicam que usaram máquinas especiais que permitem levantar dez mil euros por dia.
Os suspeitos investiram dinheiro sujo em moeda virtual, como a bitcoin, que escapa ao controlo das autoridades. A investigação já registou a passagem de mais de dois milhões de euros por contas dos arguidos.
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Intérprete denuncia
Em janeiro de 2020, um intérprete contratado pelas Forças Armadas denunciou que Paulo Nazaré, alegado líder da rede, adquirira pedras preciosas na República Centro-Africana.
Advogado e polícias
Entre os arguidos há ex-militares que concorreram para as escolas da PSP e da GNR, assim como um advogado, que faria parte do núcleo duro e tinha um papel no branqueamento.
Dois presos
Dois dos onze detidos na Operação Miríade estão a aguardar o desenvolvimento da investigação em prisão preventiva. Entre eles está Paulo Nazaré.