Investigação de cinco anos desmantelou esquema de confeção e venda paralela de aguardente e licores. Tribunal de Instrução de Aveiro envia 20 arguidos para julgamento.
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Uma rede de produção e distribuição de álcool e bebidas alcoólicas conseguiu lucrar mais de 19 milhões de euros em fuga aos impostos. Compravam toneladas de cereais que transformavam em álcool e usavam para a produção de aguardentes e licores em Espanha. Depois, introduziam-nas no mercado de consumo. Tudo era feito à margem da contabilidade das empresas.
O processo correu no Tribunal de Instrução Criminal de Aveiro que, a 18 de junho, pronunciou 20 arguidos pelos crimes de evasão fiscal, introdução fraudulenta no consumo, detenção de arma proibida e crimes contra a genuinidade, qualidade ou composição de géneros alimentícios.
O esquema estava montado em torno de um entreposto fiscal em Anadia. A coberto da atividade lícita, os responsáveis compravam toneladas de farinha de milho no circuito paralelo que, depois, confiavam a várias destilarias do centro do país. Os cereais eram rapidamente transformados em álcool para assim ficar o menor tempo possível nas instalações das empresas e evitar inspeções.
Mal estivesse fermentado, o álcool era transportado até ao Norte de Espanha por dois grupos organizados, mas sem ligação entre si. O líquido tinha como destino uma empresa de produção de bebidas em Vigo. Nesta fábrica, gerida por um português, o álcool era usado para confecionar bebidas alcoólicas como aguardente de ervas ou licor de café. As bebidas eram depois vendidas a particulares e estabelecimentos comerciais.
Não pagavam qualquer imposto
Todo este processo era feito no mercado paralelo. A aquisição da matéria-prima, a sua transformação e a venda dos produtos finais nunca eram lançadas na contabilidade das empresas. Deste modo, os arguidos conseguiam iludir os vários impostos devidos pelas operações: IVA, IRS, IRC e IABA (imposto sobre o álcool e bebidas alcoólicas).
A investigação, que esteve a cargo da Unidade de Ação Fiscal (UAF) da GNR, estima que o esquema tenha rendido 19,3 milhões de euros em impostos por pagar. Consequentemente, o Ministério Público deduziu um pedido de indemnização cível desse valor aos arguidos.
No âmbito deste inquérito, relacionado com a Operação Licor Ibérico, foram realizadas 30 buscas, 16 das quais domiciliárias, que conduziram à apreensão de 29 mil litros de álcool e aguardente, 1650 litros de bebidas de índole alcoólica, uma arma de fogo, 24 viaturas, 42 telemóveis e diversa documentação contabilística.
A investigação da UAF, sob direção do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), durou aproximadamente cinco anos e concluiu com a acusação de 18 pessoas singulares e três pessoas coletivas por introdução fraudulenta no consumo qualificada e fraude fiscal qualificada, entre outros crimes.
Refira-se ainda que o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que, dos ilícitos praticados em Espanha, o inquérito apenas poderia investigar os praticados pelos portugueses. Os crimes dos espanhóis em Espanha teriam de ser alvo de inquérito das autoridades judiciárias daquele país.
Notificados da acusação, alguns dos arguidos requereram a abertura de instrução. O Tribunal de Instrução de Aveiro acabaria por confirmar na íntegra a acusação. Todos os arguidos foram pronunciados para ir a julgamento, à exceção de um, entretanto falecido.
Números
30 mil litros
de álcool, aguardente e licores foram apreendidos aos arguidos, bem como 24 viaturas, 42 telemóveis e uma arma de fogo.
Operações
"Licor Ibérico"
Em novembro de 2014, a GNR lançou a Operação Licor Ibérico. As 30 buscas realizadas em Portugal e Espanha permitiram consolidar a investigação. Foram mobilizados 80 investigadores da UAF da GNR e 30 elementos do Cuerpo Nacional de Policia.
"Ginja"
Em 2008, a Polícia Judiciária e a ASAE apreenderam 16 mil litros de bebidas alcoólicas contrafeitas, sendo que 13 mil eram aguardentes e licores. Foram também apreendidos 50 litros de essências e aromas concentrados para utilizar na falsificação de rum, vodka, amêndoa amarga, anis e brandy.