Relação de Évora contraria tribunal algarvio que condenara a Allianz a pagar 25 mil euros a herdeira do segurado. Homem escondeu doenças ao contratar seguro em banco de Olhão.
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O Tribunal da Relação de Évora (TRE) absolveu, em maio, a seguradora Allianz de pagar 25 mil euros de um seguro de vida à única herdeira de um homem que omitiu as doenças de que padecia ao preencher um questionário de saúde aquando da subscrição do respetivo contrato.
No questionário, o segurado dizia não ter problemas de saúde nem padecer de doenças do aparelho circulatório. Também garantia nunca ter sido submetido a nenhuma cirurgia ou a internamento.
Mas, à data do óbito, verificou-se que o homem padecia de doença renal, bronquite crónica tabágica e hipertiroidismo subclínico. Por outro lado, tomava medicação para a hipertensão e para a patologia valvular mitroaórtica.
Processa contra Allianz
O caso chegou aos tribunais em 2018. Após o falecimento do tio, aos 60 anos, devido a um choque sético (uma infeção generalizada), em consequência de uma úlcera gástrica perfurada e associado a um enfarte agudo do miocárdio, uma funcionária bancária procurou a seguradora para que lhe pagasse o capital seguro a que tinha direito como única herdeira do falecido.
Mas a Allianz negou a pretensão, dizendo que a apólice, contratada seis anos antes, num banco em Olhão, era nula. "A causa da morte do cliente estava associada a fatores relacionados com a saúde da pessoa segura e que não foram declarados quando do preenchimento do boletim de adesão. A omissão condicionou a correta apreciação do risco por parte da Allianz", justificou.
Inconformada, a sobrinha intentou uma ação judicial, para que fosse declarada válida a apólice e lhe fossem pagos os 25 mil euros reclamados. Argumentava que, à data da contratação do seguro, o tio "não se encontrava sob observação médica ou em tratamento regular", tinha "baixa instrução" e, se "omitiu a sua condição clínica, fê-lo por negligência".
"O regime relativo ao incumprimento doloso da declaração inicial de risco apresenta-se em carateres minúsculos e quase ilegíveis. Por último, a causa de morte nada teve a ver com as patologias que supostamente não foram declaradas no questionário", alegou.
Em primeira instância, um tribunal da comarca de Faro deu razão à herdeira e condenou a seguradora, considerando haver "falta de nexo causal entre a doença omitida nas declarações prestadas na proposta e a que efetivamente se revelou letal". Por outro lado, argumentou o tribunal algarvio, "não se pode concluir que o segurado falecido tivesse agido com dolo quando prestou as indicações de preenchimento do questionário de saúde, tendo presente o seu baixo grau de escolaridade (4.ª classe)".
Sem omissão, pagaria mais
A Allianz recorreu para o TRE, alegando que "o falecido teve intenção de [a] enganar". "Se a ré soubesse, ou conhecesse a real situação clínica da pessoa segura, não teria aceite o seguro ou, quando muito, sujeitá-lo-ia a um sobreprémio e ou exclusões", argumentou.
Em acórdão de 11 de maio, o TRE deu razão à Allianz. Através dos juízes desembargadores José Lúcio, Manuel Bargado e Francisco Xavier, concluiu que o falecido agiu com "dolo", estando ciente de que as declarações sobre o seu estado de saúde não eram verdadeiras.
"Quis apresentar à seguradora uma descrição do seu estado de saúde bem diferente da real, não podendo deixar de entender e querer que assim viciava a vontade desta, levando-a a avaliar a proposta de seguro de modo mais favorável aos seus desejos", argumentaram os desembargadores, convencidos de que, sem o erro provocado pelo dolo do segurado, "a seguradora certamente teria avaliado de modo diferente a proposta de adesão".
Pormenores
Tomava vários medicamentos
Quando fez o seguro, o falecido tomava medicação há anos para a epilepsia, a hipertensão e a doença cardíaca. À pergunta "tem algum problema de saúde?", respondeu que não.
Devidamente esclarecido
Ficou provado que a seguradora, antes do contrato, esclareceu o segurado da necessidade de declarar com exatidão as circunstâncias que conhecia e razoavelmente devia ter por "significativas" para a apreciação do risco.
Influência das respostas
Para o TRE, as declarações contidas nas respostas ao questionário efetuado tiveram "efetivamente influência" na aceitação do contrato de seguro, "pelo que não oferece dúvidas a [sua] anulabilidade".