O presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização (SCIF) do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Acácio Pereira, acusou, esta segunda-feira, o presidente da República de ter extrapolado as suas competências ao equacionar uma eventual extinção daquela instituição.
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"Importa verificar se há ou não um pecado mortal do sistema. Se há, então este SEF não serve e tem de se avançar para uma realidade completamente diferente", afirmou, na quinta-feira, Marcelo Rebelo de Sousa, a propósito do alegado homicídio à pancada por três inspetores do SEF de um imigrante ucraniano, Ihor Homeniuk, no aeroporto de Lisboa, a 12 de março de 2020.
Esta segunda-feira, Acácio Pereira assegurou que não existe "qualquer problema sistémico", mas sim "casos isolados" "Perante estes casos isolados, o que é imprescindível é que a direção nacional promova as ações necessárias para que factos idênticos nunca mais voltem a acontecer", sustentou, apontando como caminho não a extinção ou retirada de competências do SEF, mas inversão da "trajetória da degradação de condições de trabalho" dos últimos anos.
"O senhor presidente da República extrapolou aquilo que são as suas competências e, nessa matéria, acho que deveria ter havido um bom senso que não houve", afirmou o líder do SCIF. "Dito isto, eu compreendo que o senhor professor Marcelo esteja em campanha eleitoral, mas o professor Marcelo e o presidente Marcelo são inseparáveis. Nessa medida, penso que o respeito pelas instituições deve existir", acrescentou Acácio Pereira.
Não dialoga com diretor nacional da PSP
O sindicalista escusou-se, ainda, a comentar as declarações do diretor nacional da PSP, Manuel Magina de Silva, que, no domingo, defendeu, à saída de uma audiência com o presidente da República, a fusão do SEF e da PSP.
"Enquanto dirigente sindical, não dialogo nem comento declarações do senhor diretor de Polícia. Não tem nenhuma competência nem qualquer legitimidade para falar sobre o SEF. O nosso sindicato dialoga com a direção nacional [do SEF], com a tutela e com os deputados da Assembleia da República legitimamente eleitos", sublinhou.
Antes, alegara já que "não há nenhuma outra polícia ou serviço de segurança que possa fazer melhor do que o SEF aquilo que o SEF faz". "Colocar as competências do SEF noutras polícias - as quais não têm nem a vocação do SEF, nem a preparação do SEF, nem a experiência do SEF, nem as competências do SEF - é deitar borda fora um bom serviço e complicar, e muito, a vida às outras forças e serviços de segurança", sustentou.
Segundo Acácio Pereira, em 2019, a instituição interagiu "com mais de 20 milhões de indivíduos nas fronteiras externas" e atendeu "quase 600 mil cidadãos estrangeiros" nas suas instalações, com "quase tudo" a correr "bem".
"É preciso deixar claro, bem claro, que o episódio sinistro que levou à morte de um cidadão no aeroporto de Lisboa - assim como outros casos de abuso de poder que possam ter existido - são, em todo o caso, exceções infímas no trabalho global do SEF e dos seus inspetores", afirmou, ressalvando não "minimizar nem retirar gravidade ao que se passou", em março, no Centro de Instalação de Temporária do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa.
Desvaloriza eventual demissão
Ao todo, foram três os inspetores do SEF, de 42, 44 e 47 anos, acusados pelo Ministério Público (MP) de ter assassinado à pancada Ihor Homeniuk, de 40 anos. O homicídio terá ocorrido dois dias depois de, a 10 de março de 2020, o cidadão ucraniano ter sido impedido de entrar em Portugal por não ter visto de trabalho - um argumento que o MP desconfia que não pudesse ser invocado. Inicialmente, a morte foi considerada natural, mas a autópsia alterou a conclusão.
De acordo com a acusação, o crime terá sido encoberto por outros inspetores da instituição, mas mais nenhum responde por qualquer crime. No total, há 12 inspetores do SEF a quem foram instaurados processos disciplinares.
A então diretora nacional do SEF demitiu-se a 9 de dezembro, quase nove meses depois da morte de Ihor Homeniuk. Desde então, que tem crescido a pressão para o ministro da Administração Interna abandonar o cargo.
Esta segunda-feira, o líder do SCIF desvalorizou esta questão. "O problema não se resolve com uma mudança de ministro. Resolve-se com mudança de atitudes", concluiu.