Os negócios milionários à volta dos contratos do Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) e suspeitas de tráfico de influências para favorecer fornecedores levaram ontem a Polícia Judiciária (PJ) a realizar buscas na Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna (SGMAI), nas empresas Motorola, Altice e SKSoft, assim como no SIRESP e em residências de suspeitos.
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Na operação foram recolhidos documentos e o inquérito do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) ainda não tem arguidos. Para já, existem suspeitas da prática de crimes de tráfico de influência, recebimento ou oferta indevidos de vantagem, corrupção passiva, corrupção ativa, participação económica em negócio, abuso de poder e prevaricação.
Dois visados
De acordo com informações recolhidas pelo JN, duas pessoas são visadas no inquérito. O ex-consultor da SGMAI, Helder Santos, que trabalhou para a Motorola até 2018, e também Sandra Perdigão Neves, ex-presidente do SIRESP, que foi diretora de operações da Altice até chegar à liderança do sistema de comunicações de emergência do Estado, a convite do ex-ministro Eduardo Cabrita. A investigação quer apurar se ambos seriam "toupeiras" das suas anteriores empresas para as beneficiar. O JN não conseguiu ontem contactá-los.
A investigação nasceu depois da então ministra da Administração Interna, Francisca Van Dunem, ter pedido, em março deste ano, ao Ministério Público, que averiguasse suspeitas de favorecimento, depois de receber acusações mútuas de Sandra Perdigão e do então secretário de Estado da Administração Interna, Antero Luís, responsável no ministério pelo SIRESP e que tutelava a SGMAI.
Por um lado, Perdigão Neves acusava a Secretaria-Geral de defender os interesses da Motorola, através da influência de Helder Santos e com a conivência de Antero Luís. Este, por seu turno, queixava-se da alegada parcialidade da então presidente do SIRESP, acusando-a de tentar favorecer a Altice. A ministra, que acumulava as pastas da Justiça e da Administração Interna, após a demissão de Cabrita, pôs termo ao contrato de Helder Santos, que tinha sido indicado pela empresa SKSoft, ontem alvo de buscas. Esta firma de consultoria e prestação de serviços nas áreas de informática e comunicação foi criada em outubro de 2014 e quatro meses depois já recebia adjudicações da SGMAI. Fez contratos de mais de um milhão de euros.
Para afastar riscos de conflitos de interesses na preparação do concurso público internacional de fornecimento de serviços para o SIRESP, Van Dunem também afastou Perdigão Neves.
Prorrogação analisada
A investigação visa ainda esclarecer as circunstâncias da prorrogação, por 18 meses, do contrato de fornecimento de serviços para manter em funcionamento o SIRESP, que representou para a Altice cerca de 13 milhões de euros e também beneficiou a Motorola.
A extensão, contratualizada em julho de 2021, aconteceu porque o concurso público não estava pronto e não havia autorização do Tribunal de Contas para novos contratos.
Ministério satisfeito com investigação
O Ministério da Administração Interna (MAI) manifestou "a sua satisfação face às diligências processuais da Polícia Judiciária hoje [ontem] em curso nas instalações da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna e da empresa SIRESP". O ministério tutelado por José Luís Carneiro (foto) recorda que a ex-ministra Francisca Van Dunem fez uma participação ao MP para "serem adotadas as providências adequadas às suspeitas sobre a regularidade formal dos atos preparatórios e contratos relativos ao concurso SIRESP".