Dois donos de centros, 31 inspetores, um polícia e um funcionário do IMT detidos em operação da PSP.
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Uma investigação da PSP a centros de inspeção técnica de veículos (CITV), iniciada em 2017, levou, ontem, à detenção de 35 pessoas, incluindo um polícia, dois administradores de CITV, 31 inspetores e um funcionário do IMT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes). Num dos esquemas detetados, funcionários de entidades públicas, incluindo autarquias, encaminhavam viaturas oficiais para os centros geridos pela rede, com aprovação garantida. O grosso da investigação visou a certificação de veículos sem serem submetidos a inspeção ou com deficiências que obrigariam a reprovação.
As buscas decorreram em Braga, Vila Verde, Famalicão, Guimarães, Vizela, Fafe, Amarante, Lousada, Gondomar, Porto, Matosinhos, Valongo, Loures, Lisboa, Agualva-Cacém, Azambuja, Vila Franca de Xira, Seixal, Palmela, Setúbal, Silves, Lagoa e Portimão, e incluíram sete CITV, o IMT e um escritório de advogados.
Corrupção no IMT
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) investigou contactos estabelecidos, "sobretudo pelos administradores das aludidas empresas, com funcionários de entidades públicas, designadamente, autarquias, em ordem a que os respetivos veículos fossem submetidos a inspeções nos centros de inspeção por si geridos".
O DCIAP acrescenta que "os mesmos administradores, que constituíram, no seu conjunto, o segundo maior grupo do país de entidades gestoras de CITV, terão mantido também contactos regulares com funcionários do IMT", aos quais "seriam prometidas e, por vezes, entregues vantagens patrimoniais e não patrimoniais", para que as empresas fossem favorecidas em processos que ali corriam.
Tudo isto resultava na "aprovação de veículos sem a anotação das deficiências que tinham ou sem a adoção dos procedimentos de inspeção legalmente obrigatórios, tendo em vista atrair clientes e, em consequência, aumentar o número de inspeções e as correspondentes receitas", refere o DCIAP.
A PSP destacou terem sido recolhidos indícios de um "esquema fraudulento" para aprovação de veículos com deficiências e sem respeitar "procedimentos de inspeção legalmente obrigatórios".
Mais fiscalização
A Associação Nacional dos Centros de Inspeção Automóvel (ANCIA) repudiou "estas práticas". "Há muito que reclamamos por mais fiscalização e regulamentação", sublinha Paulo Areal, o presidente.
A ANCIA critica ainda o elevado número de CITV no país. "Há 240 centros e julgamos que 200 bastavam. A nossa atividade não deve pautar-se pela concorrência, mas pela defesa da segurança dos veículos e o respeito pelo ambiente. Houve novos operadores a entrar no mercado, sem reforço da fiscalização e da regulamentação. Aplaudimos e colaboramos com estas operações".
Setor
6 milhões de inspeções e reinspeções são feitas, anualmente, nos 240 centros centros de inspeção técnica de veículos do país. E as reprovações atingem as 500 mil, o que prova "a importância do setor na redução da sinistralidade rodoviária", afirmou Paulo Areal, da ANCIA.
Centros lado a lado
Há centros quase encostados pelo facto de se situarem em concelhos diferentes e pequenas freguesias com dois CITV, como é o caso de Merles, em Gondomar. "Este concelho não tinha nenhum e passou a ter cinco", disse o dirigente da ANCIA.
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Início em 2017
A investigação desenvolveu-se em três inquéritos, iniciados em 2017, 2019 e 2020, iniciada pela Esquadra de Investigação Criminal de Loures e, posteriormente, pela Brigada Central de Investigação de Criminalidade Económica e Financeira do Departamento de Investigação Criminal da Direção Nacional da PSP.
Quilómetros
No ano passado foi desmantelada uma rede, na zona de Torres Vedras, que importava automóveis e lhes adulterava os quilómetros. O esquema contava com a cumplicidade de um centro de inspeções da zona sul do país, onde um responsável e dois funcionários fechavam os olhos à burla.