Buraco escavado durante a noite passava por baixo da parede da prisão e estava quase pronto. Túnel feito a partir de arrecadação de camarata com 33 reclusos
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Na quarta-feira, dia em que a ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, visitou a cadeia de Ponta Delgada, nos Açores, os guardas prisionais descobriram um túnel, quase pronto, que permitiria a fuga dos 33 reclusos instalados na mesma camarata. A Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) admite somente "atos preparatórios para uma hipotética e futura tentativa de evasão", mas o Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional (SNCGP) salienta que devido à "falta de segurança" do estabelecimento prisional esta foi a segunda tentativa de fuga em apenas três meses.
O túnel foi construído a partir de uma arrecadação, situada no mesmo corredor em que foi instalada a camarata, tinha um metro de altura, 60 centímetros de largura e 80 centímetros de profundidade. Foi escavado por baixo de uma das paredes da cadeia e faltavam apenas 20 centímetros para ficar completo. Uma vez percorrido o pequeno túnel, os reclusos teriam de caminhar cerca de três metros e saltar o diminuto muro de vedação para alcançar a liberdade.
Fontes ouvidas pelo JN suspeitam que os reclusos envolvidos neste plano de fuga atuavam durante a noite, depois de arrombarem a porta da arrecadação, e voltavam à camarata às primeiras horas do dia. Para manter o túnel em segredo, os presos esconderam o buraco aberto no chão com armários e camas que estavam guardados na arrecadação.
Nunca ninguém desconfiou das escavações feitas, pelo menos, ao longo de várias semanas e só na quarta-feira, quando os vizinhos da prisão se queixaram do barulho que se ouvia durante a madrugada a partir do interior da cadeia, é que foram realizadas as primeiras diligências. Os guardas prisionais esperaram pelo fim da visita da ministra da Justiça ao estabelecimento prisional e percorreram a camarata à procura de pistas. Vistoriada a arrecadação foi revelado o buraco de acesso ao túnel.
DGRSP nega "qualquer tentativa de evasão"
Confrontada pelo JN, a DGRSP "desmente taxativamente que se tenha verificado qualquer tentativa de evasão coletiva do estabelecimento prisional de Ponta Delgada". "Verificou-se, isso sim, que os serviços de vigilância do estabelecimento, no âmbito do trabalho quotidiano de controlo e segurança, detetaram danos na parede de uma arrecadação (usada como tal). Danos estes que podem corresponder a atos preparatórios para uma hipotética e futura tentativa de evasão", acrescenta fonte oficial.
A DGRSP refere, ainda, "que está a decorrer processo de averiguação interna no sentido de apurar responsáveis pelos danos na parede e as circunstâncias em que os mesmos foram provocados". Para já, não se sabe quem, nem quantos presos estiveram envolvidos no plano.
Contudo, para o SNCGP, este episódio vem confirmar que "existe uma quebra de segurança enorme devido à falta de guardas prisionais" em Ponta Delgada. O dirigente sindical Frederico Morais alega que "a cadeia está sobrelotada e, como o SNCGP tem denunciado constantemente, não tem condições para continuar aberta".
Frederico Morais lembra outra tentativa de fuga em junho deste ano, mês em que dois reclusos abriram um buraco na parede para tentar chegar ao exterior da cadeia, e defende que quer essa, quer a que agora foi abortada só não surtiram efeito "devido ao profissionalismo dos guardas prisionais".
Ministra admite que cadeia não dispõe de condições
Durante a visita à cadeia de Ponta Delgada, a ministra da Justiça admitiu que construção de uma nova cadeia na ilha de São Miguel é uma "prioridade" e anunciou que a atual prisão de Ponta Delgada vai sofrer requalificações de 100 mil euros. "Ninguém pode ficar satisfeito com o que encontra aqui nesta cadeia", afirmou.
Catarina Sarmento e Castro disse, igualmente, que a cadeia de Ponta Delgada ficou "mais esquecida" a partir de 2008, quando foi decidido construir um estabelecimento prisional novo em Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, e explicou que as obras a realizar deverão ficar concluídas dentro de menos de um ano. Uma ala que está encerrada e que tem capacidade para 46 pessoas será o principal alvo da intervenção.
O estabelecimento prisional de Ponta Delgada foi criado em 1975, num edifício cuja construção tem origem nos finais do século XIX. Tem capacidade para 141 reclusos, mas atualmente alberga 160 prisioneiros vigiados por 68 guardas.