A Câmara Municipal de Sintra intentou, este mês, uma ação no Tribunal Administrativo e Fiscal para impugnar um parecer da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) que deu razão a cinco agentes do sexo feminino da Polícia Municipal (PM), que se queixaram de assédio moral discriminatório na corporação sintrense.
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Em causa estão alegados comentários machistas, misóginos e de cariz sexual dirigidos às queixosas durante o serviço e proferidos por dois agentes com funções de chefia na área operacional e pelo atual comandante e diretor do Departamento de Segurança e Emergência, o major da GNR Manuel Lage.
A autarquia chegou a reclamar da decisão da CITE, que concluiu existirem "indícios de prática de assédio moral consubstanciada em função do sexo por parte da entidade empregadora, através dos seus superiores hierárquicos em relação às trabalhadoras/queixosas", mas a contestação acabou indeferida. Por isso, o município decidiu avançar agora para tribunal e impugnar o ato administrativo.
Queixosas sentiram-se "humilhadas", Major fala em "calúnia"
Na queixa apresentada em fevereiro pelo Sindicato Nacional das Polícias Municipais (SNPM), em representação das suas associadas, uma das agentes garantia ter sido vítima de comentários machistas por reclamar de "falhas" no serviço. Outra queixosa alegava ter sido "humilhada e desprovida dos direitos mais básicos" quando um chefe da área operacional lhe terá sugerido que urinasse no mato na ausência de casa de banhos onde se encontrasse a fazer patrulhamento.
"As gajas só aqui estão para engravidarem e irem para casa", "são todas um banco de esperma ambulante", "deviam estar em casa a levar com ele e fazer as coisas de casa" ou "andam tão refilonas porque estão com falta de peso de estarem com ele entalado" são outras expressões atribuídas aos agentes acusados, que sempre desmentiram ter proferido os comentários que lhe são imputados.
O comandante da PM negou ou disse desconhecer os factos alegados pelas trabalhadoras, que considerou serem "caluniosos". Diz que se trata de "denúncias que visam intimidar, são hostis, degradantes, humilhantes e desestabilizadoras" e que "o conluio é evidente". Acrescenta ainda que as agentes agiram motivadas "por questões políticas" e por se sentirem "injustiçadas com a mudança do sistema de coordenação".
Descredibilizar as trabalhadoras
No parecer em que dá razão às trabalhadoras, aprovado em junho, a CITE acusou a autarquia de não ter afastado os indícios de discriminação levantados nem de ter tido uma postura proativa na descoberta da verdade, nomeadamente através da abertura de um processo disciplinar. Segundo o SNPM, o único procedimento surgiu somente após o conhecimento do parecer, e não aquando do conhecimento da queixa das trabalhadoras. Já na resposta que indefere a reclamação, datada de setembro, a CITE acrescenta que houve mesmo uma "tentativa de descredibilizar as trabalhadoras, sem acrescentar factualidade nova, alicerçada em prova".
Na contestação apresentada, o comandante da PM alegou que a transcrição dos comentários foi apresentada sem contexto e sem referência em concreto às expressões utilizadas. "Bem se entenda que certos comentários entre colegas não passam de brincadeiras, muitas vezes mal interpretadas pelos seus destinatários. Se as agentes se sentiam incomodadas com alguma atitude, o que nunca demonstraram, deveriam ter usado dos meios próprios acionando a intervenção do empregador, que é quem detém os meios adequados para dirimir tais litígios, sendo totalmente desnecessário a intervenção de instituições terceiras."
Três queixosas com processo disciplinar
Após a apresentação da queixa pelas cinco trabalhadoras, duas delas viram-se arguidas em processos disciplinares comuns e uma terceira está a braços com um processo disciplinar especial de inquérito. O Sindicato refere ainda que testemunhas arroladas pelas queixosas foram igualmente objeto de processos disciplinares.