Ao longo dos últimos quatro anos, uma rede com ramificações internacionais a operar em Portugal legalizou centenas de imigrantes oriundos do Paquistão, Índia, Nepal ou África, obtendo de forma fraudulenta documentos e autorizações de residência graças à cumplicidade de funcionários do Estado que recebiam 200 euros por cada processo despachado rapidamente.
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A Polícia Judiciária desmantelou, ontem, o esquema que terá rendido milhões de euros ao grupo encabeçado, em Portugal, por um advogado já condenado por auxílio à imigração ilegal. Ao todo, a PJ fez 22 detenções, incluindo três advogados, dois funcionários do Fisco, dois da Segurança Social e uma inspetora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Os outros são angariadores.
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De acordo com informações recolhidas pelo JN, o principal arguido, Sabirali Ali, um advogado moçambicano com escritório em Lisboa, tinha uma vasta rede de angariadores de múltiplas nacionalidades, que publicitavam junto das comunidades estrangeiras a facilidade com que o jurista obtinha autorizações de residência em tempo recorde. O advogado contaria com a cumplicidade de dois outros causídicos especialistas em questões de direitos de estrangeiros, João Vaz e Ana Bernardi, também detidos. Os clientes pagavam entre mil e cinco mil euros ao líder da rede para que este tratasse de toda a documentação, garantindo que, no final, pudessem ficar em Portugal e, por consequência, na Europa.
A investigação acredita que os advogados arranjariam promessas de contratos de trabalho forjados e, depois, os funcionários da Autoridade Tributária e da Segurança Social criavam novos números em ambas as instituições para que os estrangeiros pudessem apresentar no SEF um dossiê aparentemente completo e sólido.
A funcionária do SEF Sónia Francisco, que estava há meses suspensa por ser arguida noutro processo por crimes semelhantes, tratava de verificar se todos os requisitos eram cumpridos. Antes de ser suspensa, acelerava os processos. Todos os funcionários públicos recebiam 200 euros por cada dossiê tratado, chegando os candidatos a imigrantes a verem os seus processos resolvidos em apenas dois dias.
Exploração na agricultura
Os imigrantes que tinham dinheiro limitavam-se a pagar à rede para depois se instalarem em França ou no Reino Unido, onde arranjavam trabalho. Os outros seriam encaminhados para trabalhar na agricultura em zonas como Zambujeira do Mar ou Grândola. As vítimas tinham de trabalhar até conseguir pagar as dívidas à rede, que podiam aumentar com os juros.
Pormenores
Detidos
22 indivíduos foram detidos ontem na Operação Rota do Cabo da Polícia Judiciária. A maioria são angariadores de imigrantes.
Colaboração
Tanto o SEF como a Segurança Social colaboraram com o Ministério Público e a Polícia Judiciária na investigação que levou à detenção dos funcionários públicos.
Crimes
Os detidos, com idades entre os 28 e os 64 anos, são suspeitos dos crimes de associação criminosa, auxílio à imigração ilegal, casamento por conveniência, falsificação, abuso de poder, corrupção, branqueamento, falsidade informática e acesso indevido.
Buscas
As buscas, das quais 45 domiciliárias, decorreram em habitações, organismos públicos e escritórios de advogados.