
Baterias começaram a ficar bloqueadas há um ano e meio
Global Imagens
Donos compraram viaturas com bateria própria, mas a financeira do grupo Renault diz que, afinal, são alugadas e exige pagamento. Justiça deu cinco dias à marca francesa para resolver.
Corpo do artigo
O Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa mandou a Renault e a financeira RCI (agora Mobilize Financial Services) pôr em funcionamento as baterias dos carros elétricos de nove lesados, bloqueadas por alegada falta de pagamento. A juíza entende que o bloqueio remoto das baterias é um "ato ilícito" e deve, agora, ser a financeira do grupo Renault, se assim o entender, a fazer prova da existência de um contrato de aluguer em dívida. A marca insistiu que se tratou de uma burla do concessionário E-Drive, de Vila do Conde, que terá faturado, desta forma, pelo menos cerca de um milhão de euros.
O caso foi denunciado pelo JN a 17 de janeiro. Mais de uma centena de Renault Zoe elétricos de particulares, empresas e até câmaras municipais viram as baterias bloqueadas do dia para a noite. Foram todos importados e comprados no stand E-Drive. Na fatura constam como "viatura sem aluguer de bateria" e no registo de propriedade não há qualquer reserva. A Mobilize diz que têm todos contratos de aluguer celebrados no estrangeiro e exige, agora, aos lesados que celebrem novo contrato (pagando entre 69 e os 119 euros por mês durante dez anos) ou adquiram a bateria (que custa, no mínimo, sete mil euros).
Quem comprou o carro, alegadamente, sem alugueres, não quer, agora, pagar duas vezes, e há quem tenha a bateria bloqueada há mais de um ano e meio.
Câmara entre lesados
Agora, nove lesados (entre os quais a Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar, que, em julho havia comprado dois carros à E-Drive), interpuseram uma providência cautelar no Tribunal de Lisboa a exigir o desbloqueio imediato das viaturas.
A juíza deu-lhes razão. Entende que os carros foram comprados "com baterias incorporadas", que os lesados são "legítimos proprietários" e, como tal, não podem ser impedidos de usar o que é seu, muito menos sem aviso prévio e sem recurso a tribunais. "É ilícita a intervenção, por via informática, nos veículos" e "interfere com a propriedade alheia", diz o despacho, de 14 de fevereiro, a que o JN teve acesso, e que dá cinco dias à Renault Mobilize para começar a desbloquear as baterias.
A Renault garante que "esteve sempre do lado dos clientes" e que só bloqueou os carros porque, após a exportação, não tinha como saber quem eram os donos, nem sequer em que país eles estavam. Assegura ainda ter documentos assinados por Alberto Ramalho, dono da E-Drive, a assumir o contrato de aluguer de baterias e a garantir que transmitiria o contrato a terceiros, aquando da venda da viatura. Depois, nada disso aconteceu. Entretanto, e com a denúncia do JN, já desbloqueou 50 viaturas e prepara-se, agora, para mover um processo-crime contra a E-Drive.
Vendedor defende-se
Em cada carro, com baterias alugadas ou próprias, a diferença de preço ronda os dez mil euros. Um milhão, considerando a centena de viaturas. Alberto Ramalho insiste: "Os contratos de aluguer cessam com a exportação. Não há contratos transnacionais. Não havendo reserva de propriedade, quem compra comprou".
PORMENORES
Inversão do contencioso
Com esta decisão, o Tribunal de Lisboa dispensa os lesados da ação principal e aplica a inversão do contencioso. Assim sendo, a querer, agora, terá de ser a Renault a mover uma ação judicial contra cada lesado, comprovando que as baterias lhe pertencem.
Alfinetada à Renault
"A 2.ª requerida [Renault] é a responsável da marca em Portugal, pelo que sobre si impendem especiais deveres de cuidado e vigilância, no sentido da proteção dos consumidores/adquirentes das suas viaturas, designadamente não possibilitando interferências informáticas nos sistemas de bordo dos veículos por vontade de terceiros", afirma ainda a juíza.
