Conceição Tinoco, de 68 anos, de Vila do Conde, tem sobrevivido com 189 euros de rendimento de inserção.
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Nos últimos dias de 2018, quando pediu a reforma, Conceição Tinoco nunca imaginou que dois anos depois continuaria à espera do estatuto de reformada. E do valor da pensão, com o qual contava para sobreviver. Enquanto trabalhou como administrativa, a sexagenária de Modivas, Vila do Conde, descontou para a Segurança Social e para a Caixa Geral de Aposentações (CGA), mas nenhum dos organismos desbloqueia o processo, protagonizando, antes, um pingue-pongue de responsabilidades.
"Era funcionária pública e, agora, estou a viver com o rendimento mínimo, que é de 189 euros. Como? Olhe, sabe Deus como! Então, 189 euros o que é que dá? Tive dois AVC [acidente vascular cerebral], sou diabética e, no último mês, gastei 85 euros em medicação. É muito difícil eu viver, muito difícil", lamenta Conceição, incapaz de conter as lágrimas.
Insensibilidade social
Carlos Costa, contabilista que tem acompanhado o processo e enviado as reclamações da cliente para a CGA e para o Centro Nacional de Pensões (CNP), da Segurança Social, indigna-se: "Isto é de uma insensibilidade social... O tolerável seria até seis meses [de espera para deferimento do pedido], nada parecido com isto. Nos nossos emails, dizemos que a senhora vive com dificuldade, com a ajuda de familiares, que depende do rendimento mínimo e que precisa da reforma, mas não há ninguém que tenha um bocadinho de sensibilidade e resolva esta situação".
Além das reclamações, Conceição Tinoco e Carlos Costa já perderam a conta às viagens que fizeram a vários serviços de atendimento da Segurança Social e da CGA. Sem resultado. "Ninguém dá uma solução", queixa-se a mulher de 68 anos, enquanto o contabilista lastima a atuação dos organismos envolvidos. "A Caixa de Aposentações diz que não tem nada a ver com o caso, que é com a Segurança Social, e esta diz que é com a CGA", admira-se Carlos Costa, que vai expor o caso "à secretaria de Estado, a ver se alguém toma medidas".
"Tenho chorado"
"Nunca dizem que a senhora não tem razão, que o requerimento está errado, que falta alguma coisa ou que está mal desde o início, mas não há ninguém que desbloqueie a situação", protesta o contabilista de Modivas, lembrando que Conceição "já tem chorado" por causa do impasse a que não vê fim.
"Tenho chorado, tenho. Meu Deus! A reforma é um direito meu, não é? Se disser que não estou reformada, as pessoas da minha idade não acreditam, e pensam que estou a mentir. Mas como é que posso dizer que estou reformada?", agasta-se a idosa.
O JN questionou o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, que tutela ambas as entidades, mas não obteve resposta em tempo útil.
Datas
Dezembro de 2018
A reforma foi requerida à Segurança Social a 12 de dezembro de 2018, e, a meio de outubro de 2019, a CGA remeteu ao Centro Nacional de Pensões a informação sobre o valor de reforma correspondente ao período em que Conceição Tinoco descontou como funcionária pública.
Novembro de 2019
No final de novembro de 2019, a Segurança Social informava que o "requerimento de pensão de velhice foi enviado para a Caixa Geral de Aposentações pelo facto de a instrução do processo ser do âmbito daquela instituição", o que foi reiterado em abril passado, em resposta a nova reclamação.