Protestos nas missas em Monção. Populações não querem regresso mas pedem ao bispo que limpe a imagem do visado porque "homossexualidade não é pedofilia".
Corpo do artigo
As missas nas paróquias de Monção que eram da responsabilidade do padre André Gonçalves, afastado este mês de funções por alegado "abuso sexual de menor", não têm decorrido de forma pacífica. As celebrações de sábado em Bela, Cambeses e Sago, e de domingo em Longos Vales ficaram marcadas por tomadas de posição por parte da população em defesa do sacerdote, com recusa de escutar a leitura de uma missiva enviada pelo bispo de Viana do Castelo, D. João Lavrador. Numa das missas, os paroquianos abandonaram mesmo a igreja, insurgindo-se contra a forma como foi conduzido o processo de afastamento do pároco de 40 anos, com publicação de um comunicado nas redes sociais, que o "expôs ao vexame e destruiu uma família".
Face à polémica, o padre João Basto, que foi indicado para substituir o padre André nas missas deste fim de semana nas seis paróquias de Monção, acabou ontem por não celebrar em duas, Abedim e Portela.
As populações não querem o regresso de André Gonçalves à igreja, mas pensam que a imagem do padre tem que ser defendida. A população de Monção entende que a diocese "está a classificar como pedofilia uma relação homossexual" que o padre André Gonçalves manteve, de forma "consentida", com um jovem "de 16 ou 17 anos". O bispo reafirma que houve crime e mostrou-se surpreendido pela reação da população.
Recorde-se que André Gonçalves foi afastado das suas funções pela diocese de Viana do Castelo, após esta ter recebido, no dia 20 de janeiro, uma denúncia de alegados abusos sexuais de menores. O JN sabe que a denúncia foi feita pela própria vítima e respetiva família, e que aquele jovem com quem o sacerdote manteve relações sexuais "de forma reiterada" cumpriu 16 anos em dezembro último. Alegadamente, os factos considerados "abuso sexual de menor" remontam ao último trimestre do ano passado, quando a vítima ainda tinha 15 anos.
não queriam o caso público
Na manhã de ontem, em Longos Vales, a fábrica da igreja pediu ao padre João Basto para não ler a carta explicativa de D. João Lavrador nem "tocar no nome do padre André", no decorrer da missa.
"Foi uma celebração normal, mas na parte final, com alguns avisos que o padre trazia para fazer, o povo começou a revoltar-se e a dizer que não era este padre pombo-correio que devia cá estar. Quem devia dar a cara era o bispo, que andou com o processo", contou ao JN Manuel Mendes, da comissão fabriqueira, referindo que "as pessoas pedem que o bispo se retrate e seja ele a explicar porque é que foi lançado o comunicado no Facebook e porque é que o assunto não foi só tratado internamente".
"As pessoas estão revoltadas, tristes. O padre André não merecia este tratamento por parte da diocese. Ele era dos párocos que mais trabalhavam", afirmou ainda Manuel Mendes, garantindo que a população "está ao lado" do sacerdote. "Foi considerado pedófilo e teve de fugir da casa dele à pressa. Não sabemos para onde foi. Ninguém sabe do padre André", declarou, adiantando que "até este momento as fábricas da igreja [das seis paróquias] ainda não se reuniram para contestar seja o que for. O que está a haver é uma revolta paróquia a paróquia".
O padre João Basto, que ocupa o cargo de diretor do Secretariado Diocesano da Comunicação Social, admite que esta se trata de "uma situação traumática, que deixa feridas e tem de ser tratada com cuidado", e confirma que sentiu descontentamento nas paróquias. "Encontrei algum desagrado nas missas. As pessoas não compreenderam bem a situação", considerou, confirmando também que acabou por não celebrar as duas últimas missas que tinha previstas para ontem. "A eucaristia não pode ser vista como afronta as comunidades", disse João Basto.
O JN tentou mas não conseguiu falar ontem com o padre André Gonçalves.
BISPO
"Têm de perceber que é um crime"
O bispo reiterou ontem ao JN que o ato praticado pelo pároco em causa "é considerado crime pela Santa Sé e pela lei civil porque é abuso de menor". E mostrou-se surpreendido com a posição que está a ser assumida naquelas paróquias de Monção. "Não me parece muito sensata a reação das pessoas. Têm de perceber que é um crime. Se fosse simplesmente uma relação homossexual, o assunto tinha de ser tratado de outra maneira", declarou D. João Lavrador, lembrando ter mandado "uma carta e um comunicado a explicar". "Informamos, abrimos inquérito e mandamos para a Santa Sé e para o Ministério Público. Tudo isso foi feito de acordo com aquilo que nos é exigido. Não sei o que mais se pode fazer", questiona.