<p>Manuela Ferreira Leite apresentou-se sozinha perante as câmaras. Alguns dos mais próximos acompanharam-na, mas ficaram fora do retrato da derrota, eventualmente por vontade dela mesma. </p>
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A noite era de solidão, tanto no momento de assumir o revés, quase hora e meia depois de serem divulgadas as projecções, como antes, quando a presidente do PSD chegou ao hotel lisboeta onde o quartel-general estava montado, entrando por uma discreta porta secundária. Na solidão, pois, assumiu responsabilidades e apelou à necessidade de o partido "estar mobilizado para as eleições autárquicas, em que merece ser confirmado como o maior partido autárquico".
Fora dali começou já a ouvir-se uma ou outra voz de contestação, no seio do PSD, mas os que estiveram perto de Manuela mantiveram-se fiéis. Tal como já sucedera ao longo da campanha, salva uma ou outra excepção rapidamente corrigida, os próximos da líder praticamente lhe reproduzem o discurso, chegando a dar a sensação de que existe uma cassete laranja, em plena época digital que torna obsoleto esse suporte de banda magnética.
Adiante. No que aos resultados de ontem respeita, a presidente do PSD, cuja entrada na sala Louvre II do Hotel Sofitel foi a única forma de quebrar um silêncio absolutamente sepulcral, que persistia, de forma mais ou menos continuada, desde as 20 horas e dos crus veredictos das sondagens à boca das urnas, assumiu responsabilidades, mas fez questão de inserir as legislativas num "prolongado ciclo eleitoral" e de garantir que o partido se mantém na calha para a governação: "Saberemos agir com firmeza e sentido de responsabilidade".
No Parlamento, garante, o PSD "não se calará nem deixará intimidar", e a perda da maioria deverá ser encarada como uma "exigência de mudança de atitude política por quem vai assumir o poder". "O PSD é a alternativa responsável, e a democracia só existe com alternativas atentas e competentes", destacou a líder social-democrata, orgulhosa da campanha eleitoral e da forma como ela e os companheiros de partido se apresentaram: "Confiantes na nossa razão e na nossa força".
Recusando ser interpelada no fim da declaração que fez, Manuela Ferreira Leite anunciou, na referida lógica do ciclo eleitoral, que só depois das autárquicas convocará o Conselho Nacional (o órgão mais importante do partido, entre congressos), para fazer o balanço dos três sufrágios deste ano. Estamos ainda perante a necessidade (que tentam assumir com serenidade, não com desespero) de manter o capital conquistado nas eleições para o Parlamento Europeu.
Disso são exemplo as palavras de Rui Rio, presidente da Câmara Municipal do Porto, que evitou comentar o revés sofrido pelo PSD na Invicta e rejeitou comparações entre a votação de ontem e a que está agendada para 11 de Outubro, dizendo repetidamente que são "eleições completamente distintas". Também o presidente da distrital portuense, José Pedro Aguiar Branco, alinhou pela mesma bitola, além de responder a Luís Filipe Menezes, para quem Ferreira Leite deverá sair após as autárquicas. "O partido está acima dos interesses pessoais", disse o ex-ministro da Justiça, vincando que, "a 15 dias de um acto tão importante", não se devem "criar lógicas divisionistas e que perturbem o PSD".
Mas o discurso oficial é o de Manuela, repetido ou reformulado pelos que a rodeiam (mesmo antes de ela entrar, o deputado Miguel Frasquilho, que fizera a única declaração relevante antes de a líder falar, vincara a necessidade de o partido "continuar unido" para o combate autárquico). Daí que a retórica do medo, cujos reflexos nos resultados eleitorais estão por contabilizar, tenha surgido, levemente, em dois momentos do discurso da presidente. Quando disse que "o PSD não se calará nem se deixará intimidar" e quando louvou a "coragem" de quantos a acompanharam.