<p>A candidata da CDU recebeu o JN no Centro de Trabalho da Boavista, no Porto, e logo avisou que tinha apenas 40 minutos para a entrevista. Ilda Figueiredo tinha de ir para uma acção de campanha na Póvoa de Varzim. A azáfama eleitoral já começou. Nada de estranho para Ilda Figueiredo, eurodeputada há 10 anos e que tem o recorde de interpelações nacionais no Parlamento Europeu (mais de 500 no último mandato). Diz que a não realização do referendo alheou os cidadãos dos interesses europeus e que é nessária uma inversão da Estratégia de Lisboa para criar emprego e apoiar o sector produtivo.</p>
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As sondagens antecipam uma abstenção recorde. Porquê este aparente alheamento?
Há responsáveis. O PS e o PSD alteraram a Constituição para realizar um referendo a um projecto de tratado europeu - qualquer que fosse o conteúdo - desde que pusesse em causa questões de soberania. Mas tiveram medo do voto do povo. Como não se realizou, é evidente que não permitiu a mobilização da população para o conhecimento da íntima ligação que hoje existe entre políticas europeias e nacionais. Mas a comunicação social nacional, sobretudo as televisões, também não deu a atenção que devia ter dado a esta situação.
Pensa que a União Europeia (UE) está a afastar-se dos europeus?
Quando se aprovam tratados sem ter em conta o voto do povo e sem um grande debate plural, naturalmente, as pessoas sentem que foram ultrapassadas e que não têm nada a ver com isso. Nos referendos de França, Holanda e Irlanda houve uma enorme participação dos cidadãos e em todos disseram não. Isso significa que a população quer participar. Mas os líderes europeus só aceitam uma resposta que é o sim. E isso é uma posição claramente antidemocrática e que não sensibiliza as pessoas para o voto.
Que ideias defende, então, a CDU para mobilizar os eleitores?
Uma ruptura com as políticas do neoliberalismo, militarismo e federalismo que só valorizam o sector financeiro e que levaram a esta grave crise económica e social e dar prioridade ao sector produtivo. Apostar na indústria, na agricultura, nas pescas... No fundo, apoiar quem produz. Criar um plano urgente de desenvolvimento e progresso social que substitua os critérios irracionais do Pacto de Estabilidade e Crescimento e que dê prioridade ao emprego, acompanhado de uma redução do horário semanal, sem perda de salários, e a diminuição da idade de aposentação, sem perda da reforma para aumentar o emprego. E, ainda, parar com as liberalizações decorrentes da Estratégia de Lisboa que atingiram sectores fundamentais quando o que se impunha neste momento era o contrário.
Onde se arranjariam meios?
Estão em três sítios. É só ir lá buscá-los. Em primeiro, os fundos comunitários. Passados dois anos e meio, soubemos que o Governo apenas pagou 4% dos 21,5 mil milhões de euros atribuídos a Portugal até 2013. Isto é inadmissível num momento em que era fundamental estar a investir dinheiros públicos da UE. Em segundo lugar, há mais de nove mil milhões de euros portugueses em paraísos fiscais. Esse dinheiro - senão todo, pelo menos uma boa parte - podia e devia estar a ser utilizado no investimento produtivo em Portugal. Em terceiro lugar, podia-se ir buscar muito dinheiro, nomeadamente, em impostos, aos paraísos fiscais que ainda existem na UE porque aquilo é uma fuga aos impostos. E podiam estar a ser aplicados outros impostos à especulação financeira e a grandes grupos económicos, como a EDP, que tiveram os maiores lucros de sempre em plena crise e que continuam a aumentar os preços.
Qual a sua opinião relativamente a novos alargamentos?
Não somos contra desde que seja feita a vontade das populações, quer dos que queiram entrar, quer dos que cá estão, o que não tem sido feito. Por outro lado, que ninguem seja prejudicado, o que implica solidariedade dos países mais ricos. Algo que não aconteceu no actual quadro financeiro, em que Portugal perdeu 15% dos fundos comunitários
Há vantagens em ter um português à frente da Comissão Europeia?
Já viu algumas? Eu ainda não. Tudo o que eu disse demonstra o contrário. Perdemos 15% dos apoios no mandato de Durão Barraso, mas o Governo português e os deputados do PS, PSD e CDS aceitaram, por isso são todos co-responsáveis. Como são também responsáveis pelo tratado de Lisboa que retira soberania a Portugal e entrega a Bruxelas a gestão dos direitos de pesca da maior zona económica exclusiva da UE que é Portugal. E que é provavelmente a nossa maior riqueza. A política das pescas e a Política Agrícola Comum serviram para destruir estes sectores em Portugal. Hoje pescamos menos de metade do que quando entramos na CEE e temos menos de metade dos pescadores. Por isso é que os Governos nunca quiseram o referendo, porque sabiam que o povo nunca iria aceitar isso.