Por estes dias já não basta saber distribuir os ovos por diferentes cestos. Tão importante como essa sábia divisão é a escolha dos "cestos certos". Cofres capazes de albergar as economias de uma vida, que sejam um garante de conforto para quem tem rendimentos para guardar, mas com a esperança de também conseguir fazer render as economias. De uma forma muito alegórica, esta é a missão do Banco Carregosa, o culminar da longa história de uma casa financeira mais antiga do que o próprio Banco de Portugal, nascida, instalada e crescida na cidade do Porto.
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Maria Cândida Rocha e Silva consegue recuar no tempo até à década de 1960, altura em que começou a ter consciência do trabalho da família: a "Lourenço Joaquim Carregosa & Companhia Limitada." Fundada em 1833, assim se chamava a casa especializada no negócio de divisas, instalada na Rua das Flores, em pleno coração do Porto. Numa altura em que o Banco de Portugal nem sequer existia - apareceria só em 1946 - os antepassados de Maria Cândida Rocha e Silva certamente também não imaginariam a dinastia de homens e mulheres de finanças que 76 anos mais tarde transformariam aquela casa financeira num banco de gestão de fortunas.
Mas a verdade é que o "private banking" - hoje o core business do banco - era já uma prática corrente nos anos sessenta, mesmo que à altura não fosse encarado como tal. A atual mulher forte do Banco recorda a mística da Casa Carregosa como "um templo" onde as pessoas entravam, "falavam baixinho", e era uma casa que se diferenciava dos bancos, porque ali "eram os donos que atendiam o cliente ao balcão."
E seria neste contexto que as pessoas "expunham a sua vida". "Eu tenho este rendimento, esta herança, cinco filhos. O que me aconselha?" E foi com respostas a este tipo de questões que durante anos, talvez gerações, a Casa Carregosa foi prestando conselhos úteis que terão marcado o rumo de muitas fortunas e investimentos dos seus clientes.
Uma humanista rendida aos números
Maria Cândida Rocha e Silva não estava talhada para viver nos meandros dos números. "Os meninos quando são pequenitos dizem "quero ser astronauta" e normalmente não o são". No caso dela, o sonho era mais simples mas não menos apaixonante. Licenciou-se em Filologia Românica. "Sempre gostei muito de línguas", mas não se ficava pela superficialidade de um idioma qualquer.
"Gosto muito de linguística, da sociolinguística e a psicolinguística também é muito interessante". Confessa-nos uma especial predileção pela razão da escolha das palavras... "Há tantos termos que se podem empregar para se dizer que se está bem, que se está feliz, que se tem medo..." No fundo, tem uma atenção meticulosa às singularidades da língua portuguesa que certamente lhe terão sido úteis para ler nas entrelinhas o complexo mundo financeiro.
A viragem de carreira dá-se em 1970, aos 30 anos, e por amor ao pai que não queria que uma casa com 150 anos "fechasse as portas". Uma firma que conta agora 181 anos de funcionamento. Maria Cândida garante que se se mantêm a tratar de dinheiros há tanto tempo "pelo menos sérios teríamos de ser!"
De corretora a banqueira
Das letras aos números das divisas ia uma grande distância. Maria Cândida "precisava de uma formação de base que não tinha" mas se o pai lhe dizia que era capaz, "a única coisa que tinha de fazer era acreditar e esforçar-me para tal."
E assim fez. "Não me custou nada entrar num mundo de homens. Era o mundo do meu pai" e sempre se soube "rodear por pessoas muito preparadas e, sobretudo, muito sérias". A partir daí, o caminho da Casa Carregosa confunde-se com o percurso da timoneira.
A revolução de 1974 foi uma fase complicada para o mundo financeiro, mas que segundo Maria Cândida, não teve efeitos perversos nas casas de câmbio. Quatro de Dezembro de 1980 - essa sim, foi para Maria Cândida uma data agridoce. Nesse dia ela é escolhida para "primeira corretora oficial da bolsa Portuguesa" e à noite Sá Carneiro morre no desastre aéreo de Camarate. Pouco depois abre a Bolsa do Porto em Janeiro de 1981. "Tempos interessantes", diz ela, que "para o Porto foram muito bons!"
O pior viria mais tarde. Depois do boom da bolsa em 1986, ocorre o crash de 1987. "As pessoas não sabiam o que compravam. Pensavam que se comprassem ações hoje por cinco, amanhã valeriam dez". Foram os tempos das OPV - Ofertas Públicas de Venda - com empresas em bolsa sem grandes condições e que terão levado muitos investidores menos preparados à ruína. "Mas todas as situações anormais nunca duram muito tempo".
Em 1994, depois de ter iniciado a atividade de corretora a título individual, a lei obriga à transformação da antiga casa de Câmbios L. J. Carregosa numa Sociedade Corretora, e mais tarde, em 2001, numa Financeira de Corretagem.
Em 2007 a Casa Carregosa era o primeiro corretor europeu a praticar comissão de corretagem zero em todos os mercados Euronext, e lançava na altura a plataforma electrónica "GoBulling" como marca de negociação online.
À medida que o volume de capital exigido pelo negócio começava a tornar-se cada vez mais exigente, foi em 2008 que o Banco de Portugal autorizou o projeto de fusão e transformação da sociedade, concedendo a licença bancária e o registo ao agora "Banco Carregosa". E em Maio de 2009 o banco apresenta-se ao mercado com o foco no "private banking".
Private Banking: Frutos para cuidar
O que distingue o Banco Carregosa dos demais? A resposta vem na forma de uma citação de Miguel Torga: "Nenhuma árvore explica os seus frutos, embora goste que lhos comam".
Para a banqueira, esta forma de estar na vida "é o nosso ADN". Tem uma postura muito "low profile". Quase não faz publicidade, ou a pouca que faz "é muito selecionada e bem dirigida". Mas a grande máxima do banco é a "exclusividade", o "fazer correto", com a pretensão assumida de que "faz um bocadinho melhor do que os outros".
Como? Assumindo com clareza a responsabilidade de honrar os interesses dos clientes que são simultaneamente depositários de património e de confiança na instituição que Maria Cândida lidera.
"Para gerir as carteiras dos seus clientes, o Banco Carregosa tem que procurar as melhores oportunidades", mas "sem ter qualquer compromisso com quem quer que seja", "não há grupos, não há ninguém, não há nenhuma emissão de obrigações que tenha de aplicar".
Com isto, Maria Cândida não quer dizer que os outros bancos não tenham igual respeito pelos clientes, sobretudo numa altura "em que já são tão regulados", mas explica que por vezes há bancos "com outros interesses que conflituam", e "que nós não temos porque somos completamente independentes".
Hoje, ao abrir uma conta, qualquer novo depositante ou investidor tem de responder a um longo inquérito que dá às entidades bancárias uma noção, o mais realista possível, da "literacia financeira" do investidor e é em função desse perfil que a gestão da fortuna terá de acontecer.
Quem é "o cliente" do Banco Carregosa?
Desde logo, alguém com dinheiro... Muito dinheiro. Neste momento o Banco Carregosa "já ultrapassou os 500 milhões de euros sob supervisão" e apresenta um "rácio de solvabilidade" - um indicador de solidez financeira - na ordem dos 20,5% (o Banco de Portugal exige 10%). Para Maria Cândida rácios como estes provam que "somos pequeninos mas sólidos".
Afirma que o Banco tem conseguido um "crescimento regular", e apresentando sempre "bons resultados". E "pagamos muitos impostos": mais de cinco milhões de euros em 2012 e quatro milhões em 2013.
Quando procuramos perceber os pré-requisitos de um cliente-tipo, a resposta vem acompanhada de um sorriso: "Ele só precisa de ter a fortuna".
A gestão é depois negociada diretamente entre o banco e o cliente.
Os serviços do Banco Carregosa não se circunscrevem a uma mera gestão de ativos e de investimento. Neste caso falamos de um espécie de "alfaiataria financeira" - se assim se pode dizer - com um aconselhamento à medida de cada cliente.
Maria Cândida dá o exemplo de um cliente com 60 anos, com uma pequena e média empresa e que pensa ter chegado à altura de "arrumar a casa", "comprando participações minoritárias de outros sócios", "transformando-a numa S.A.", pensando na "modernização". Tudo isto é um "trabalho que o banco faz e aconselha no ramo corporate". "Nós temos de estar apetrechados para tudo, porque a licença bancária quando nos foi dada não se resumia apenas à vertente private".
Mas claro está que é nesta segunda vertente que se delimita a grande zona de conforto do Banco Carregosa. Quando falamos num horizonte virtual de vinte anos, Maria Cândida não hesita em formular o desejo de um Banco "com a mesma dimensão, mas com um aumento enorme no montante sob gestão."
No plano do sonho mais íntimo, Maria Cândida "gostaria de ir ao encontro do modelo suíço", mas está consciente de que no nosso mercado tal desejo não seria concretizável. Não há tradição, "somos muito pequeninos, as pessoas com grandes fortunas não serão assim tantas e não querem correr o risco que o país oferece."
Num momento em que o país assiste ao esboroar de um banco histórico, Maria Cândida Rocha e Silva admite que as notícias não abonam a favor da credibilidade da banca nacional. Relativamente ao caso Espírito Santo, à data de realização desta entrevista ainda muito se discutia sobre o papel dos reguladores na identificação precoce do problema. "Mas se não está escrito nos livros do banco, se calhar o supervisor não pôde chegar lá?" "É difícil auditar o que não está lá!"
E neste campo, Maria Cândida não tem dúvidas de que todos ficam a perder. "Quem está no mercado sofre". "O povo diz e é verdade: a lama salpica sempre."
Polémicas à parte, pelo menos quanto ao banco que dirige, Maria Cândida responde com uma palavra-chave: "transparência". "Somos pequenos. É tudo claro e transparente. Temos poucos acionistas".