Um tiroteio entre homens armados e autoridades do Kosovo num mosteiro perto da fronteira com a Sérvia terminou com quatro mortes no domingo.
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Um polícia morreu e outro ficou ferido num ataque na madrugada de domingo, no norte do Kosovo, anunciou o primeiro-ministro kosovar, Albin Kurti, na rede social Facebook. Kurti disse que se tratou de um ataque terrorista, que os atacantes eram profissionais com máscaras e armas pesadas e que o tiroteio continua.
Os dois homens patrulhavam perto de uma estrada que lhes foi reportada como bloqueada quando a unidade de polícia foi "atacada a partir de diferentes posições, com armas pesadas, nomeadamente granadas".
Mais tarde, a polícia kosovar anunciou que três membros do grupo armado morreram em confrontos com as forças de segurança no Kosovo. Quatro pessoas, que, de acordo com o jornal "Koha Ditore", tinham bastante armamento, munições e instrumentos de comunicação, foram detidas. Segundo as autoridades kosovares, tratava-se de um grupo de pelo menos 30 elementos, apoiados por veículos, que se entrincheiraram no mosteiro ortodoxo sérvio em Banjska.
Esta segunda-feira, o Kosovo, que cumpre um dia de luto pelo polícia morto, avançou que seis pessoas suspeitas de participarem no ataque estão agora na Sérvia. Segundo o ministro do Interior do Kosovo, Xhelal Sveçla, os "terroristas estão feridos e a ser tratados no hospital". O governante pediu ainda à Sérvia que "os transfira imediatamente para as autoridades do Kosovo, para que possam ser julgados".
Presidente sérvio acusa comunidade internacional de limpeza étnica no Kosovo
Após o incidente, o primeiro-ministro do Kosovo acusou imediatamente Belgrado de apoiar os agressores. "Condenamos este ataque criminoso e terrorista. O crime organizado, com o apoio financeiro e logístico de responsáveis de Belgrado, ataca o nosso país", acusou.
Por sua vez, o presidente da Sérvia, Aleksandar Vucic, rejeitou as acusações, culpando Kurti,pela opressão e maus-tratos a membros da minoria sérvia no Kosovo e garantindo que esta foi a causa do incidente de rebelião armada. Esta segunda-feira, Vucic acusou "parte da comunidade internacional" de apoiar uma alegada "limpeza étnica brutal" no Kosovo, num encontro com o embaixador russo em Belgrado convocado depois de um tiroteio no território. "Informei [o embaixador Aleksandar] Bocan-Harcenko sobre o facto de que uma brutal limpeza étnica, organizada pelo [primeiro-ministro kosovar] Albin Curti, com o apoio da comunidade internacional, está a ter lugar no Kosovo", escreveu hoje Vucic na rede social Instagram.
O presidente sérvio também atacou as forças da NATO no Kosovo, as KFOR, por terem ajudado a polícia do Kosovo a cercar completamente o grupo armado que causou a morte do agente da polícia e impedi-lo de fugir para o centro da Sérvia. O chefe de Estado acusou ainda as KFOR de terem dado à polícia do Kosovo "carta branca para matar todos" os sérvios cercados, afirmando que em nenhuma outra parte do mundo as forças internacionais alguma vez agiram de forma semelhante. "Uma coisa é certa: o Kosovo nunca, nunca e nunca receberá a independência, pelo menos não da Sérvia, não importa o que façam aqueles que nos bombardearam em 1999", disse Vucic, aludindo à intervenção da NATO na guerra do Kosovo.
Líderes mundiais reagem a ataque
O chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, condenou o "horrível ataque" de um grupo armado a polícias no norte do Kosovo. "Têm que ser determinados todos os factos sobre o ataque. Os perpetradores devem enfrentar a justiça", disse Borrell, num comunicado, citado pela agência Efe.
O Alto Representante da UE para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança disse que "há mais vidas inocentes em risco" devido às hostilidades em curso e pediu que "parem imediatamente" estes ataques. A UE, lembrou Borrell, tem apelado repetidamente a todos os intervenientes para que ponham fim à escalada de violência no norte do Kosovo.
Por sua vez, o Kremlin, que tradicionalmente apoia a Sérvia, manifestou preocupação com a situação "potencialmente perigosa" no Kosovo, expressando o seu apoio aos sérvios. "A situação é, verdadeiramente, muito tensa e potencialmente perigosa", declarou o porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov. "Não é segredo que as provocações contra os sérvios são realizadas com muita frequência", acrescentou Peskov, sem acrescentar mais detalhes sobre o assunto.
Já o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, condenou de forma veemente os "ataques violentos e coordenados" de domingo e apelou a Belgrado e a Pristina para que acalmem os ânimos. "Os Estados Unidos condenam veementemente os ataques violentos e coordenados contra a polícia do Kosovo", declarou Blinken, em comunicado. "Apelamos aos Governos do Kosovo e da Sérvia para que se abstenham de qualquer ação ou retórica que possa agravar as tensões", acrescentou o chefe da diplomacia norte-americana, defendendo que os autores do crime devem ser responsabilizados através de um processo de investigação transparente.
O norte do Kosovo é palco de distúrbios recorrentes. A tensão aumentou em maio, quando as autoridades kosovares decidiram nomear autarcas albaneses em quatro municípios de maioria sérvia. Mais de 30 soldados da KFOR, a força liderada pela NATO no Kosovo, ficaram feridos no final de maio em confrontos com manifestantes sérvios.
A Sérvia recusa reconhecer a independência da sua antiga província, cuja população de 1,8 milhões de habitantes, na grande maioria de origem albanesa, inclui uma comunidade sérvia de cerca de 120 mil pessoas, que vivem sobretudo no norte do Kosovo.
Depois de um conflito que fez 13 mil mortos, na maioria kosovares albaneses, as relações entre os dois antigos inimigos vão de crise em crise.