A DeepSeek, uma plataforma de inteligência artificial (IA) concorrente do ChapGPT, fez esta segunda-feira, perder um bilião de dólares (953 mil milhões de euros) a empresas tecnológicas norte-americanas como a Nvidia, Google, Meta, etc. A ferramenta, desenvolvida por uma start-up chinesa, chegou ao topo dos downloads.
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Um crise bolsista em Nova Iorque, provocada pela plataforma chinesa de IA DeepSeek, varreu do mercado 1 bilião de dólares (953 mil milhões de euros) do Nasdaq, com a fabricante norte-americana de chips Nvidia a liderar as quedas em mais de 13% e a perder 465 mil milhões de dólares (443 mil milhões de euros) do seu valor de mercado, a maior perda de sempre em tão pouco tempo na história financeira.
O caricato é que DeepSeek disse que gastou apenas 5,6 milhões de dólares (5,3 milhões de euros) a desenvolver o seu modelo - valor muito abaixo quando comparado com os milhares de milhões que os gigantes tecnológicos dos EUA investiram em IA. Além de que o projeto foi desenvolvido com placas Nvidia de geração anterior, pondo em causa os valores que as empresas atualmente pagam à Nvidia para terem as da última geração.
O DeepSeek foi desenvolvido por uma start-up sediada na cidade de Hangzhou, no leste da China, conhecida pela sua elevada densidade de empresas tecnológicas. Disponível como aplicação ou para desktop, o programa pode fazer muitas das coisas que os seus concorrentes ocidentais podem fazer: escrever letras de canções, ajudar a trabalhar num plano de desenvolvimento pessoal ou até mesmo escrever uma receita para o jantar com base no que está na frigorífico.
Está sujeito a muitas das limitações observadas noutros chatbots de fabrico chinês, como o Ernie Bot da Baidu: questionado sobre o líder Xi Jinping ou as políticas de Pequim na região ocidental de Xinjiang, implorou à AFP para "falar de outra coisa". Mas, desde escrever código complexo até resolver contas difíceis, os especialistas do setor ficaram surpreendidos com a forma como as competências do DeepSeek se comparam com as da concorrência.
"O que descobrimos é que o DeepSeek... É o que tem melhor desempenho, ou quase ao mesmo nível dos melhores modelos americanos", disse Alexandr Wang, CEO da Scale AI, à CNBC.
Num artigo que detalha o seu desenvolvimento, a empresa disse que o modelo foi treinado utilizando apenas uma fração dos chips utilizados pelos seus concorrentes ocidentais.
A disputa entre Pequim e Washington
Os analistas há muito que acreditavam que a vantagem crítica dos Estados Unidos sobre a China quando se trata de produzir chips de alta potência - e a sua capacidade de impedir a potência asiática de aceder à tecnologia - daria ao país uma vantagem na corrida da IA.
A Nasdaq liderou a queda dos principais índices, caindo 2,7%, com as empresas de IA Meta, Microsoft e Alphabet, a empresa-mãe da Google, todas em declínio firme.
Na semana passada, após a tomada de posse do novo presidente da Casa Branca, Trump anunciou um empreendimento de 500 mil milhões de dólares para construir infraestruturas para IA nos Estados Unidos. As empresas de tecnologia e de chips estavam entre as grandes perdedoras em Tóquio na segunda-feira, quando o Nikkei fechou em terreno negativo, com a Advantest a cair mais de oito por cento e a Tokyo Electron quase cinco por cento. O SoftBank, que é um investidor-chave no projeto de IA de Trump, caiu mais de oito por cento.
O capitalista de risco Marc Andreessen, um conselheiro próximo de Trump, descreveu-o como "o momento Sputnik da IA" - uma referência ao lançamento do satélite soviético que deu início à corrida espacial da Guerra Fria. "O DeepSeek R1 é uma das descobertas mais incríveis e impressionantes que já vi", escreveu no X.
"Os investidores foram forçados a reconsiderar a perspetiva para as despesas de capital e avaliações, dada a ameaça dos modelos de IA chineses mais baratos. Parecem ser tão bons, se não melhores, do que as versões dos EUA", afirmou, em comunicado, David Morrison, analista sénior de mercado da FCA.
Antes, os mercados europeus e asiáticos caíram, uma vez que estavam a digerir também a última discussão sobre tarifas envolvendo o presidente dos EUA, Donald Trump, e a Colômbia.
Modelo aberto
Tal como os concorrentes ocidentais ChatGPT, Llama e Claude da Meta, o DeepSeek utiliza um modelo de linguagem grande - grandes quantidades de textos para treinar o seu uso quotidiano da linguagem. Mas, ao contrário dos rivais de Silicon Valley, que desenvolveram modelos proprietários, o DeepSeek é de código aberto, o que significa que qualquer pessoa pode aceder ao código da aplicação, ver como funciona e modificá-lo por conta própria.
"Estamos a viver numa linha temporal em que uma empresa não-americana está a manter viva a missão original da OpenAI - uma investigação verdadeiramente aberta e de ponta que capacita todos", escreveu Jim Fan, gestor sénior de investigação da Nvidia, no X.
A DeepSeek declarou que "está no topo da classificação entre os modelos de código aberto" - e "rivaliza com os modelos de código fechado mais avançados do mundo". Wang, da Scale AI, escreveu no X que "o DeepSeek é um alerta para a América".
Chineses líderes até 2030
A liderança de Pequim prometeu ser líder mundial em tecnologia de IA até 2030 e prevê gastar dezenas de milhares de milhões em apoio ao setor nos próximos anos. E o sucesso do DeepSeek sugere que as empresas chinesas podem ter começado a ultrapassar os obstáculos no caminho.
Na semana passada, o fundador da DeepSeek, o gestor de fundos de cobertura Liang Wenfeng, sentou-se ao lado de outros empreendedores num simpósio com o primeiro-ministro chinês Li Qiang - destacando a rápida ascensão da empresa. O seu sucesso viral também o colocou no topo dos tópicos mais comentados no site chinês Weibo, semelhante ao X (ex-Twitter), na segunda-feira, com hashtags relacionadas a gerar dezenas de milhões de visualizações.
"Este é realmente um exemplo de como gastar pouco dinheiro para fazer grandes coisas", escreveu um utilizador.