A Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28) arrancou com o anúncio do fundo destinado aos danos climáticos, mas as negociações para uma decisão final continuam ainda assentes em compromissos voluntários e apelos sem força vinculativa.
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Segundo diversos observadores, ainda há um caminho a percorrer para se chegar a uma decisão final na COP28 que tenha a autoridade de um consenso entre quase 200 países sob a égide das Nações Unidas.
No primeiro dia de negociações, a COP adotou a entrada em funcionamento do fundo de "perdas e danos" destinado a ajudar os países vulneráveis a fazer face às consequências cada vez mais graves das catástrofes relacionadas com o clima. Hoje, os compromissos dos países ascendem a mais de 650 milhões de dólares, de acordo com uma contagem do Natural Resources Defense Council.
Em foco esteve também uma declaração conjunta (paralela às negociações da cimeira) de cerca de 20 países, entre os quais os Estados Unidos, a França, o Japão e os Emirados Árabes Unidos, a apelar -- de forma voluntária e não vinculativa - para a triplicação da capacidade mundial de energia nuclear até 2050, com base na capacidade registada em 2020.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou na sexta-feira que mais de 110 países querem que a COP28 adote a meta de triplicar a capacidade das energias renováveis e duplicar a taxa anual de eficiência energética a nível mundial até 2030. Os países do G20 prepararam o caminho para um tal acordo, apoiando os esforços para alcançar este objetivo em setembro, que poderá constar do acordo final do COP.
Também hoje foi lançada por França uma iniciativa, em conjunto com os EUA e outros países, como Canadá e Reino Unido, para apoiar uma eliminação acelerada do carvão, que ainda gera um terço da eletricidade mundial. Os subscritores apelaram para o desbloqueamento de "novas fontes de financiamento público e privado" e pediram ao Banco Mundial que reduza o custo do investimento em energias limpas nos países emergentes.
Simultaneamente, mais de 130 países concordaram na sexta-feira em incluir os setores da agricultura e da alimentação nos seus planos de ação, tendo em conta que estas áreas são responsáveis por cerca de um terço dos gases com efeito de estufa. No entanto, a declaração foi criticada pela falta de objetivos concretos e por não ter assinalado qualquer mudança a favor de regimes alimentares mais sustentáveis.
O anúncio do fundo de investimento climático pelos Emirados Árabes Unidos, estimado em 30 mil milhões de dólares, conjuntamente com o setor privado e em parceria com o gigante BlackRock, marcou o início da cimeira. O fundo, denominado Alterra, centrar-se-á em projetos climáticos no mundo em desenvolvimento, esperando estimular um investimento total de 250 mil milhões de dólares até 2030.
EUA anunciam contribuição de três mil milhões de dólares para Fundo Verde
A vice-presidente dos Estados Unidos anunciou uma contribuição de três mil milhões de dólares para o Fundo Verde para o Clima, durante a 28.ª conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas (COP28), no Dubai. "Estou orgulhosa de anunciar um novo compromisso de três mil milhões de dólares para o Fundo Verde para o Clima, que ajuda os países em desenvolvimento a investir em resiliência, energia limpa e soluções baseadas na natureza", afirmou Kamala Harris, que participa na COP28 em substituição do presidente Joe Biden.
O último anúncio de Washington, também no valor de três mil milhões de dólares, foi em 2014, pelo presidente democrata Barack Obama, sendo que muitos outros países renovaram as suas contribuições entretanto.
"Estamos num momento crucial. A nossa ação coletiva, ou pior, a nossa inação, terá consequências para milhares de milhões de pessoas nas próximas décadas", frisou Kamala Harris.
Esta contribuição, ainda que dependente da aprovação do Congresso dos Estados Unidos, era um sinal muito aguardado na esperança de aliviar as tensões entre o Norte e o Sul sobre as finanças internacionais, que é uma questão importante nas negociações da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a luta contra as alterações climáticas.
Caso a promessa seja cumprida, os Estados Unidos vão tornar-se no maior contribuinte para o fundo em termos absolutos, com seis mil milhões de dólares, no entanto, o Reino Unido (5,1 mil milhões de dólares, segundo a ONG NRDC), a Alemanha (4,9 mil milhões) e a França (4,6 mil milhões) contribuem muito mais, em proporção às suas populações.
O Fundo Verde para o Clima, criado em 2010, é o maior em atividade atualmente, e financia desde painéis solares no Paquistão a projetos agrícolas nas Filipinas, bem como outras iniciativas destinadas a ajudar os países em desenvolvimento a fazerem a transição dos combustíveis fósseis ou a adaptarem-se a um clima mais perigoso. Segundo este fundo foram desembolsados, até à data, mais de quatro mil milhões de dólares e comprometidos 13,5 mil milhões, no entanto, as suas ambições são ainda maiores. A ideia é aumentar o seu capital de 17 mil milhões de dólares para 50 mil milhões de dólares até 2030.
Desde o Acordo de Paris, em 2015, o Fundo tem desempenhado um papel fundamental no cumprimento de parte do compromisso dos países desenvolvidos de fornecer 100 mil milhões de dólares por ano na ajuda climática.
São Tomé e Príncipe dedica apoio financeiro à adaptação às alterações climáticas
Ainda sem projetos definidos, São Tomé e Príncipe prevê dedicar os 3,5 milhões de euros de dívida a Portugal convertida em financiamento climático à adaptação às alterações, adiantou hoje o primeiro-ministro.
Na sexta-feira, Portugal e São Tomé e Príncipe assinaram um acordo que prevê a conversão de parte da dívida são-tomense, no valor de 3,5 milhões de euros, em financiamento climático para os próximos dois anos.
O apoio foi hoje destacado pelo primeiro-ministro de São Tomé e Príncipe, Patrice Trovoada, que elogiou a "grande solidariedade e responsabilidade a nível global" do Governo português e afirmou que o montante permitirá o investimento em projetos ambientais, que não estão ainda definidos. "Nós, países insulares, temos muitos desafios", disse o responsável, numa conferência de imprensa conjunta com o primeiro-ministro no Pavilhão de Portugal, na 28.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28), que está a decorrer no Dubai, Emirados Árabes Unidos, até 12 de dezembro.
Os efeitos das alterações climáticas, segundo Patrice Trovoada, são já bastante sentidos no dia-a-dia dos são-tomenses, sobretudo pelas populações que vivem junto à costa, devido à subida do nível do mar, e no setor da agricultura. "Éramos um país com quase 11 meses de chuva, hoje muito menos", referiu, a título de exemplo.
Por isso, uma das prioridades do Governo é a sobrevivência e resiliência das pessoas e é nesse sentido que deverão ir os projetos a desenvolver com recurso ao financiamento climático. "Temos uma série de projetos que já estão identificados, projetos de resiliência climática, de 'transfer' de algumas populações que vivem na costa para zonas interiores, de proteção da costa", adiantou o governante.
Na ilha do Príncipe, acrescentou, os vários projetos de proteção dos oceanos e da biodiversidade são exemplos positivos que importa multiplicar.
Por outro lado, o primeiro-ministro sublinha que a relação com Portugal poderá ser igualmente benéfica do ponto de vista da aprendizagem. "Portugal tem o 'know how' e no que nos diz respeito devemos aproveitar o avanço que tem em (energias) renováveis", sustentou, referindo que a transição é energética é outra das prioridades de São Tomé e Príncipe.
Além de São Tomé e Príncipe, Portugal assinou também um acordo de conversão da dívida em financiamento climático, no valor de 12 milhões de euros, para dois anos. No final desse período, os resultados serão avaliados, com a possibilidade de alargar o mecanismo à totalidade da dívida dos dois países (mais de 160 milhões de euros).