Investigadores espanhóis discordam quanto à localização do santuário de Hércules, na costa de Cádis, datado do século IX, antes de Cristo.
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A passagem do tempo permitiu à história manter ocultas joias arqueológicas cuja existência unicamente é lembrada nas páginas dos livros mais antigos. Milhares de turistas invadem todos os verões a costa de Cádis, no sul de Espanha, desconhecendo que debaixo da areia dourada da praia poderá encontrar-se um dos santuários mais procurados por historiadores e arqueólogos.
Segundo as descobertas da investigação científica de Ricardo Belizón, um estudante de doutoramento da Universidade de Sevilha, o lendário templo do Hércules Gaditano, datado desde o século nove antes de Cristo e conhecido como Melqart na época fenícia, estaria localizado na turística localidade de Sancti Petri. O lugar, que poderia também albergar os restos de Hércules, converteu-se durante a Idade Antiga num centro de peregrinação visitado, de acordo com vários historiadores clássicos, pelo general cartaginês Aníbal Barca e pelo imperador romano Júlio César.
Mas a descoberta que poderá mudar por completo a história da baía de Cádis não é consensual. A Universidade de Cádis e a Universidade de Córdoba defendem a hipótese do templo de Melqart estar localizado no conhecido cerro dos Mártires em Sam Fernando, numa área propriedade do Ministério de Defesa espanhol, a 300 metros do mar.
Máxima confidencialidade
"Nunca certificámos que a estrutura de Sancti Petri corresponda ao santuário do Hércules Gaditano. Só é uma hipótese bem argumentada porque existem vários indicadores como a localização e a própria estrutura recolhidas por fontes antigas", explica Belizón sobre a polémica com outros investigadores, que recusaram falar ao "Jornal de Notícias".
"Tentámos trabalhar com a máxima confidencialidade para preparar a nossa teoria, consultando fontes clássicas e fazendo trabalho de campo enquanto evitávamos que as pessoas fossem até lá desfrutar de um novo produto turístico", explica o investigador.
Costa de cádis na antiguidade
Há um ano, Belizón começou a tese doutoral com o objetivo de reconstruir a paisagem da costa de Cádis na antiguidade. O jovem espanhol utilizou um software para fazer um mapa geográfico. Os resultados não demoraram a chegar. Ainda mais perto da baía de Cádis, na zona do rio Arillo, o grupo descobriu um núcleo urbano maior do que o conjunto arqueológico Baello Claudia, em Bolonia.
As infraestruturas de 700 metros foram localizadas à frente do quartel militar de Camposoto, numa zona pantanosa que complicou o trabalho de reconhecimento.
O sucesso não ficou por aí. O grupo de trabalho ampliou as buscas até Sanct Petri, devido à tradição histórica de localizar o santuário de Melqart nessa zona. "Durante a época moderna já se descobriram estátuas de bronze, ânforas e outros objetos antigos de grande valor, portanto, alguma coisa tinha que estar oculta e acertámos", explica Ricardo Belizón ao JN.
A primeira descoberta foi uma grande estrutura portuária de 150 metros de cumprimento por 300 de largura, com amarras para os barcos localizada a cinco metros de profundidade. A sul, numa zona inundável, foram identificadas outras edificações, como um porto interior, vários espigões e outra estrutura similar a uma vila doméstica.
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Tecnologia laser
Para realizar os mapas, os investigadores usaram um sistema de medição de posições de forma remota, através de um laser que regista os volumes debaixo da superfície. Os arqueólogos costumam usar este método para localizar objetos.
Dificuldades do mar
Autores clássicos como Estrabón, Posidónio e Filostato descreveram que o lendário santuário estava localizado num ambiente mutável, influenciado pelas correntes do mar. Esta proximidade à costa impede os mergulhadores de trabalharem constantemente na investigação.