
UNICEF diz que o ataque matou mais de 10 crianças entre os cinco e os sete anos
Foto: Rian Cope / AFP
Centenas de civis, incluindo crianças, foram mortos em ataques com drones atribuídos a paramilitares em Kalogi, cidade do Sudão controlada pelo exército, na região de Kordofan, onde se concentram os combates entre campos rivais, segundo um responsável local.
O primeiro-ministro do Sudão, Kamil Idris, acusou hoje o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (FSR) de cometer um "crime de guerra" ao bombardear na quinta-feira o sul do país, matando pelo menos 114 pessoas, incluindo crianças.
Três ataques atingiram, na quinta-feira, "uma creche, depois um hospital" e, de seguida, "pessoas que tentavam socorrer as crianças" nesta cidade do sul de Kordofan controlada pelo exército, disse à agência France Presse (AFP) al-Din al-Sayed, chefe da unidade administrativa de Kalogi.
Na quinta-feira, a agência das Nações Unidas para a infância (UNICEF) indicou que o ataque tinha matado mais de 10 crianças entre os cinco e os sete anos, enquanto as autoridades alinhadas com o exército estimavam o número de mortos em 79, incluindo 43 crianças.
"Kamil Idris classificou o bombardeamento de uma creche e de um hospital na localidade de Kalogi, no estado de Kordofan do Sul, perpetrado pelas FAR, como um ato bárbaro e selvagem", indica um comunicado de imprensa do gabinete do primeiro-ministro, hoje divulgado.
Idris afirma que o ataque "constitui um crime de guerra em toda a sua extensão e confirma que a milícia cumpre todos os critérios para ser classificada como organização terrorista que ataca civis, incluindo crianças em idade pré-escolar".
O governo de Kordofan explicou, em comunicado, que o aumento do total de vítimas se deveu ao estado grave de alguns dos feridos, que acabaram por morrer, e também ao facto de algumas famílias terem evitado levar os seus familiares feridos ao hospital, por este também ter sido atacado.
O primeiro-ministro sudanês apelou às organizações internacionais e de direitos humanos para que "condenem este incidente atroz, sem precedentes e desumano, perpetrado pela milícia rebelde e por aqueles que a apoiam, financiam e treinam".
Guerra já matou dezenas de milhares
Até agora, os esforços internacionais de paz não surtiram efeito, com os dois lados a tentarem consolidar posições no terreno antes de qualquer negociação.
A guerra entre o exército e as FSR já causou dezenas de milhares de mortos e 12 milhões de deslocados, mergulhando o país no que a ONU descreve como a pior crise humanitária do mundo.
Depois de tomarem El-Facher, o último bastião do exército em Darfur (oeste do Sudão), no final de outubro, as FSR avançaram com uma ofensiva na região vizinha de Kordofan, uma zona agrícola fértil, rica em ouro e instalações petrolíferas.
Esta região é um ponto estratégico para o abastecimento, movimentação de tropas e comunicações. Segundo analistas, o avanço dos paramilitares tem como objetivo quebrar o arco defensivo do exército em torno do centro do Sudão, com vista a uma contraofensiva sobre a capital, Cartum, e outras cidades perdidas nos últimos meses.
Os combates forçaram mais de 40 mil pessoas a fugir do Kordofan, segundo a ONU.
Na quinta-feira, o alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, declarou temer "uma nova onda de atrocidades". "É verdadeiramente chocante ver a história repetir-se em Kordofan tão pouco tempo depois dos terríveis acontecimentos de El-Facher", afirmou, referindo-se a "casos de represálias, detenções arbitrárias, raptos, violência sexual e recrutamentos forçados, incluindo de crianças".
Desde o final de outubro, a tomada de El-Facher pelas FSR foi marcada por massacres, violações e pilhagens, segundo vários testemunhos de agentes humanitários e de sobreviventes.
Os ataques a Kalogi ocorrem num momento em que o exército e os paramilitares se acusam mutuamente de ataques mortais.
Camião humanitário atacado
No norte de Darfur, um camião do Programa Alimentar Mundial (PAM) foi atacado, na quinta-feira, perto da cidade de Hamra El-Sheih, segundo a organização. O camião fazia parte de um comboio de ajuda destinado à cidade refúgio de Tawila, 70 quilómetros a oeste, para onde fugiram milhares de civis de El Facher.
O enviado especial norte-americano Massad Boulos condenou, no sábado, o ataque, apelando às partes beligerantes para que "cessassem as hostilidades e permitissem o acesso humanitário sem entraves".
Na sexta-feira, as FSR acusaram o exército de ter bombardeado a passagem de Adre, na fronteira com o Chade, crucial para a passagem de comboios humanitários. Todavia, fontes locais chadianas, que pediram o anonimato, referiram ter havido uma explosão relacionada com o incêndio de um camião-cisterna.
O exército acusa os Emirados Árabes Unidos de fornecer armas às FSR, nomeadamente através do Chade e da Líbia, o que Abu Dhabi nega, apesar das provas documentadas em vários relatórios internacionais e inquéritos independentes.
