Os empresários Miguel Pais do Amaral, Américo Amorim e a Rio Forte são acusados por uma organização espanhola e pelo sindicato de camponeses de Moçambique de usurparem terras sem indemnizarem os habitantes locais.
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De acordo com um relatório preparado pela Organização Não Governamental (ONG) espanhola Grain e pela União Nacional de Camponeses de Moçambique (UNAC), são vários os empresários portugueses que alegadamente estarão envolvidos num esquema internacional para ficarem com terrenos férteis no norte de Moçambique, principalmente no Corredor de Nacala, uma área de 14 milhões de hectares, sem pagarem as indemnizações que a lei prevê que sejam dadas aos cerca de 4,5 milhões de habitantes locais.
O relatório, a que a Lusa teve acesso, e que tem um subtítulo em que se lê "O colonialismo português está de volta", defende que "este eco dos tempos coloniais é mais forte pelo facto de que alguns dos investidores são famílias portuguesas que enriqueceram durante o período colonial e estão agora a voltar para Moçambique para começar plantações exatamente nas mesmas terras de onde colonialistas portugueses fugiram há 40 anos".
No relatório de 20 páginas estão apontados nomes de empresários e empresas portuguesas, entre as quais Américo Amorim, Miguel Pais do Amaral e a empresa Rio Forte, do grupo Espírito Santo, que alegadamente não terão pago as indemnizações devidas aos agricultores por terem saído das suas terras para dar lugar aos grandes empreendimentos agrícolas que estão a ser feitos no país por empresas e investidores internacionais.
O relatório desta ONG espanhola e do sindicato de camponeses de Moçambique aponta também o dedo ao antigo presidente da República Armando Guebuza, ao seu filho, Mussumbuluko Guebuza e a vários empresários conhecidos em Moçambique, como por exemplo Carlos Simbine, José Alves e Jacinto Mutemba, e Salimo Abdula, todos indicados como detentores ou ligados a empresas ou veículos de investimento que não terão pago na totalidade ou de todo as compensações aos habitantes deslocados.
Um dos exemplos descritos neste trabalho de investigação diz respeito à empresa AgroMoz, "uma 'joint venture' entre o Grupo Américo Amorim de Portugal, uma holding do homem mais rico de Portugal, Américo Amorim, e a Intelec, que a embaixada dos Estados Unidos descreveu como 'um veículo de investimento para o antigo presidente Guebuza'".
O envolvimento da AgroMoz foi, entretanto, negado oficialmente pelo Grupo Amorim, segundo o qual a empresa "não faz parte do grupo de empresas com actividades no chamado Corredor Nacala, nem tem a sua exploração localizada geograficamente no Corredor Nacala". Num esclarecimento divulgado esta quinta-feira, o Grupo Amorim afirma ainda que a "Agromoz não faz parte do consórcio e/ou empresas associadas ao Projecto ProSavana" e acrescenta ter cumprido "com todos os requisitos legais com o processo de obtenção de terras estipulado pela Lei de Moçambique, assim como é possuidor de registos legais de todos estes processos".
No relatório da ONG espanhola, pormenoriza-se que "em 2012, representantes da AgroMoz chegaram ao posto administrativo de Lioma, às pressas obtiveram direito às terras com algumas autoridades do Governo e começaram a desalojar das terras mais de mil camponeses da aldeia de Wakhua", sendo que "os camponeses despejados receberam uma compensação mínima, entre 2000 e 6500 Meticais (65 a 200 dólares, 57 a 175 euros)".
"Apesar da oposição da população local e os impactos destrutivos que a empresa tem tido até agora, o Governo moçambicano concedeu à AgroMoz um DUAT [Direito de Uso e Aproveitamento da Terra, ou seja, permissão para a terra ser usada de forma lucrativa por uma entidade privada] referente a uma área de 9000 hectares em Lioma", continua o documento, sublinhando que "na altura, Armando Guebuza, um dos investidores na AgroMoz, ainda era presidente do país".
O documento expõe a situação, criticando as autoridades moçambicanas por terem, nos últimos anos, recorrido a investidores internacionais para criarem grandes empreendimentos agrícolas nas terras do norte do país, nomeadamente no Corredor de Nacala.
O problema, explicam, é que, por um lado, as populações locais ficam privadas do seu sustento, uma vez que a agricultura de subsistência é a principal fonte de rendimento naquela zona, e por outro lado nem sempre é possível saber quem deve pagar a indemnização devida aos habitantes deslocados.
"Muitas vezes as comunidades nem sequer sabem quem é que está a usurpar as suas terras, as empresas que tomam posse das terras estão geralmente registadas em paraísos fiscais como as Ilhas Maurícias, onde a identidade dos proprietários das empresas e os registos financeiros são mantidos em segredo", refere.