O JN falou com Pedro Froufe, especialista em Direito Europeu da Universidade do Minho.
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No que consistirá a investigação sobre os crimes de guerra na Ucrânia?
Uma coisa é a declaração da vontade de haver uma investigação que seja possível levar ao Tribunal Internacional de Justiça e outra é dizer como se pretende fazer. Se quiserem avançar para um processo internacional por crimes de guerra, os estados, as organizações reconhecidas internacionalmente e a Ucrânia em particular terão de tentar municiar-se de provas irrefutáveis. Foi já invocado genocídio, o que pode indiciar que a acusação será de crimes contra a humanidade, o que terá outro tipo de impacto, mesmo político.
A Rússia não ratifica o Estatuto de Roma. Como vai Putin comparecer em juízo?
Não vai. Pode ser condenado da mesma maneira que sucedeu a muitos alemães no pós-II Guerra, reconhecidos colaboradores do regime nazi. Pode haver, até - isto em termos casuísticos, porque não há uma teoria geral -, sanções individualizadas da comunidade internacional representada pela ONU. Eu próprio já tive, em tempos, há muitos anos, uma aluna, brasileira, de ascendência germânica, natural de uma cidade de Santa Catarina muito povoada por alemães escapados da guerra, muitos deles nazis, e ela pura e simplesmente não tinha documentos. Viajava com documentos ad hoc, emitidos pela ONU, porque o avô, que nunca esteve no julgamento de Nuremberga, porque fugiu, era reconhecido como colaborador nazi. As coisas também podem ser assim. Mas vamos ser realistas: estamos a falar da Rússia e de Putin.
Então, como pode acabar este processo?
Por isso dei o exemplo da rapariga brasileira. Ela não tinha culpa nenhuma, como é óbvio, mas sofreu as consequências. Agora, na Ucrânia, ou há um acordo, uma negociação da paz e uma solução política que ponha fim à guerra e, aí, muitas das imputações acabam por desaparecer, porque são negociadas, ou então a Rússia perde a guerra e as coisas são complicadas para quem é dirigente russo. Não só para Putin, como para toda a estrutura do Kremlin. Podemos projetar uma solução análoga à de Nuremberga, mas muitos dos que estavam identificados não foram apanhados e para eles não houve julgamento de Nuremberga nenhum.