Uma equipa de dermatologistas analisou 666 pacientes covid e concluiu que mais de 25% apresentava alterações na mucosa oral, um novo sintoma que poderá ajudar na deteção da doença.
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Quando a primeira vaga da pandemia aumentou a pressão hospitalar em Espanha, na primavera de 2020, muitos blocos operatórios tiveram de ser encerrados para acolher doentes críticos com covid-19.
Confrontada com o cancelamento de inúmeras cirurgias a pacientes com cancro da pele no Hospital Universitário La Paz, em Madrid, a dermatologista Almudena Nuño González decidiu apresentar-se como voluntária no hospital de campanha montado no recinto da Instituição de Feiras de Madrid (IFEMA). Escusado será dizer que a médica não conseguiu deixar de olhar para os doentes infetados enquanto dermatologista, tendo identificado um novo sintoma da infeção: a "língua covid".
"Encontrámos algumas alterações que até então não tinham sido relacionadas com a covid-19: uma língua dilatada, como se estivesse inchada, na qual se veem marcas dos dentes, e que também pode estar depapilada, com zonas do dorso com pequenos buraquinhos e as papilas achatadas", explicou Almudena, ao El País, acrescentando tratar-se de "uma língua com manchas rosadas".
O estudo, realizado entre 10 e 25 de abril de 2020, incidiu em 666 doentes covid, com idade média de 56 anos, e foi publicado no British Journal of Dermatology. A análise dos médicos mostra que mais de 25% dos pacientes revelaram alterações na mucosa oral.
É certo que, tal como explicou Almudena Nuño González, há outros fatores que podem contribuir para esses sintomas, nomeadamente certos medicamentos ou a própria ventilação, que seca a boca e pode irritar a língua. "Mas a língua depapilada deve-se 100% à covid porque não ocorre por nenhuma outra circunstância ou tratamento", sublinhou. "É uma descoberta que pode auxiliar no diagnóstico, tal como a perda de olfato ou paladar. São sintomas muito característicos", acrescentou.
A equipa de dermatologistas detetou ainda alterações na pele das palmas das mãos e da planta dos pés em quase 40% dos pacientes, principalmente descamação (25%), pequenas manchas de cor avermelhada ou acastanhada (15%) e uma sensação de ardência conhecida como eritrodisestesia (7%). No total, quase metade dos doentes analisados na IFEMA apresentaram sintomas na pele ou na mucosa da boca.
Ainda que a OMS já tenha incluído os sintomas cutâneos na lista dos menos comuns da covid-19, os identificados na língua têm passado despercebidos. A dermatologista explica-o com o caos dos primeiros meses da pandemia. "No final de março e início de abril, havia muito medo da doença. Tentava-se fazer com que os pacientes mantivessem a máscara o máximo de tempo possível e, muitas vezes, as suas mucosas não eram analisadas", explicou.