Foi "o primeiro dia do futuro de Timor-Leste", como o definiu o então Presidente da República, Jorge Sampaio. Embora os resultados fossem divulgados apenas uma semana depois, alimentando novos acontecimentos sangrentos, com as milícias integracionistas a perseguir e a atacar timorenses pró-independência, pessoal das Nações Unidas e jornalistas, a 30 de agosto de 1999 o referendo sobre a autonomia da 27.ª província indonésia, unilateralmente declarada por Jacarta em 1976, abriu definitivamente o caminho à independência da antiga colónia portuguesa.
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"Ousar votar para ousar vencer", titulava o JN em manchete, na edição do dia seguinte, glosando a conhecida palavra de ordem do partido de inspiração maoista português, MRPP, "Ousar lutar, ousar vencer". Em pós-título, destacava que um funcionário local da missão das Nações Unidas no território (UNAMET), fora "morto à facada pelas milícias". Mas enfatizava: "Timor-Leste em massa nas urnas, na esperança da liberdade".
Na reportagem, assinada pelos enviados especiais, Jorge Pinto (texto) e Leonel de Castro (fotos), o JN reconhecia que ainda não possuía dados completos, mas afiançava, citando responsáveis da UNAMET, que cerca de 90% dos 438 mil timorenses recenseados "terão participado na consulta sobre a proposta de autonomia oferecida pela Indonésia".
Em conclusão, escrevia o jornal, "a população votou em massa, ultrapassando a barreira do medo e da intimidação". O texto principal narra vários incidentes, como o encerramento temporário de assembleias de voto, devido a "ameaças de ataques, distúrbios, bloqueio das estradas".
Até a aterragem do helicóptero do representante do secretário-geral da ONU para Timor-Leste, Jam- sheed Marker, foi impedida por milicianos integracionistas, que bloquearam a pista. O incidente não desvaneceu a satisfação do diplomata paquistanês, especialmente agradado com o facto de os timorenses "votarem com alegria".
Segundo dá conta a cobertura do jornal, em quatro páginas, o secretário-geral das Nações Unidas à época dos acontecimentos, Kofi Annan, felicitou então os timorenses por aquela "ocasião histórica". "Há dias que valem uma vida", comentou, por seu lado, o primeiro-ministro português, António Guterres, singularmente o atual sucessor de Annan, e a quem se deveram, com Sampaio e com a ONU, os esforços diplomáticos decisivos para pôr fim à ocupação ilegítima e genocida pelas tropas indonésias, desde 1975.