Depois de, na semana passada, mais de 100 pessoas terem feito turnos de 12 horas, debaixo de chuva, para limpar e compor 60 quilómetros de linha, o primeiro comboio já chegou a Kherson. Meses de saudade desfeitos em abraços e alívio: "finalmente estamos livres".
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Há oito meses que não passavam comboios em Kherson, no sul da Ucrânia. Depois do dia 1 da felicidade, o da reconquista da cidade pelas forças ucranianas, este sábado, muitas famílias conseguiram, finalmente, juntar-se. O primeiro comboio que partiu de Kiev chegou hoje à recém-libertada localidade e, com ele, lágrimas e sorrisos de saudade.
"Prometi que voltava, aqui estou, cumpri a minha promessa", disse à AFP Anastasia Shevlyuga, de 30 anos, minutos antes de voltar a abraçar a mãe. Svytlana Dosenko não conseguiu esconder as lágrimas enquanto esperava pelo único filho, que já não via desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, a 24 de fevereiro. E a espera, descreve, foi excruciante: "Ele é a única pessoa que me resta".
Os últimos meses foram um pesadelo. Dois dias depois do início da guerra, o marido de Dosenko morreu, durante um corte de energia no hospital onde estava internado, ligado à vida através de um ventilador. Nos meses seguintes, viveu sob o domínio das forças russas, que revistavam frequentemente os apartamentos e controlavam os cidadãos por toda a cidade. "Foi muito difícil. A minha casa foi revistada pelos soldados, que a invadiram à procura de armas", contou. Agora, só quer falar com o filho, dizer que o ama.
Uma cidade desesperada por socorro que volta agora à vida
A poucos metros da plataforma está Lyudmila Romanyuk, de 66 anos, com um ramo de flores na mão, à espera da neta. "Os pais, em Kherson, não sabem que ela está a chegar, combinámos assim", revelou, sorridente. "Finalmente estamos livres!".
Na estação estão também pessoas que querem apenas apreciar a chegada do comboio como mais um sinal do regresso da cidade à normalidade. E para os trabalhadores da ferrovia, é um orgulho. Na semana passada, mais de 100 funcionários fizeram turnos de 12 horas, debaixo de uma chuva gelada, para limparem e arranjarem quase 60 quilómetros de linha, sempre com o apoio de equipas de desminagem. "Foi emocionante. Depois de sabermos da libertação de Kherson, recebemos ordens para reparar 58 áreas diferentes da linha", afirmou Denys Rustyk, de 31 anos, ferroviário da cidade vizinha de Odessa.
Se, antes da guerra, a ferrovia já era uma espinha dorsal da Ucrânia em termos industriais e económicos, depois, transformou-se num fator vital, ajudando milhares de pessoas a fugir do conflito e levando combatentes para a frente de batalha. A reabertura da linha de Kherson será, agora, fundamental para uma cidade destruída, com problemas de abastecimento e desesperada por socorro. "Quanto mais cedo Kherson estiver conectada, mais cedo a cidade voltará à vida", afirmou Yuri Karlyukin, de 53 anos, que trabalha há 15 anos, no sistema ferroviário ucraniano.