O título é, intencionalmente, uma cópia do livro do jornalista americano John Reed que, em 1919, publicou a obra com o mesmo nome e na qual relata a revolução bolchevique russa, ocorrida dois anos antes. Pouco mais de um século depois, a Rússia volta a abalar mundo. Não com uma guerra civil que mudou os cânones da política mundial. Mas com uma invasão a um país vizinho que, tal como a revolução de há cem anos, promete alterar profundamente a geopolítica que vigorava na esfera internacional.
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Dia 1 - 24 de fevereiro
Invasão da Ucrânia
Às 3.30 horas (hora portuguesa), Vladimir Putin confirmava o que já se temia há alguns dias: a Rússia ia invadir território dos vizinhos ucranianos. Num discurso emitido em direto pela televisão, o presidente russo justificava a ofensiva militar com a necessidade de concretizar a "desmilitarização e desnazificação da Ucrânia" e, simultaneamente, responder a ameaças de "genocídio" da população russófona no Leste da Ucrânia.
Putin garantia que o objetivo das tropas era somente proteger civis de origem russa nas repúblicas separatistas de Donetsk e Lugansk, mas as primeiras horas da "operação militar especial" mostraram os soldados a avançar por três frentes: Leste da Ucrânia; Bielorrússia e Crimeia.
Logo no primeiro dia de guerra também se começaram a ouvir explosões em, pelo menos, cinco cidades ucranianas, incluindo a capital Kiev.
A comunidade internacional reagiu com críticas. O português António Guterres, secretário-geral da ONU, pediu a Putin que "desse uma oportunidade à paz" e o presidente norte-americano, Joe Biden, falou numa "guerra premeditada". Nada, porém, que travasse Putin.
Dia 2 - 25 de fevereiro
Russos falham Blitzkrieg
A Rússia avança no terreno, mas falha no objetivo de alcançar uma "blitzkrieg", guerra-relâmpago que lhe permitisse assumir rapidamente o controlo da Ucrânia. A inesperada resistência ucraniana não faz recuar os russos. Bem pelo contrário. A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, aumenta a escalada de violência verbal ao ameaçar outros países. "É óbvio que a entrada da Finlândia e da Suécia na NATO, que é antes de mais um bloco militar, teria graves consequências políticas e militares, o que exigiria uma resposta do nosso país", disse.
Entretanto, o jogo militar disputa-se também ao nível cibernético. O encarregado do Governo polaco para a segurança informática, Janusz Cieszynski, assegurava que, entre outras instituições públicas, foi atacado o sistema informático da Câmara de Compensação polaca, que processa os créditos bancários e transferências entre bancos e a administração pública. Os russos revelaram que piratas informáticos pró-ucranianos estão a preparar ciberataques a infraestruturas fundamentais e centros de comando de Moscovo. Um alerta que não foi alheio à tomada de posição assumida pelos Anonymous, grupo de hackers que, nas redes sociais, afirmou estar "oficialmente em ciberguerra contra o Governo russo".
Em Portugal, o Centro Nacional de Cibersegurança, o Serviço de Informações de Segurança, o Centro de Ciberdefesa, a Polícia Judiciária e a Rede Nacional de CSIRT (Computer Security Incident Response Team) uniram esforços para monitorizar e combater qualquer ciberataque a instituições nacionais.
Dia 3 - 26 de fevereiro
Europa responde com sanções
A União Europeia (UE) e os Estados Unidos da América (EUA) recusam um envolvimento militar direto no conflito, mas começam a contra-atacar com sanções os russos, que, ao terceiro dia de guerra, dispararam mísseis cruzeiro do Mar Negro em direção a várias cidades, tendo um deles atingido um edifício residencial em Kiev.
Os ativos financeiros de Putin e do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, são congelados e inicia-se uma autêntica "caça ao tesouro" para identificar contas bancárias e outros bens de oligarcas russos espalhados pelo mundo. Sete grandes bancos russos são excluídos do sistema internacional de comunicações bancárias SWIFT e o mundo do desporto e da cultura proíbe a participação de cidadãos russos em futuros eventos. Espetáculos e competições marcadas para cidades da Rússia, como o Grande Prémio de Fórmula 1 e a final da Liga dos Campeões em futebol, são, de igual modo, transferidos para outros locais.
Dia 4 - 27 de fevereiro
Mundo teme ameaça nuclear
A manhã começou com a notícia da tomada de Kharkiv pelas tropas russas mas, horas depois, a segunda maior cidade da Ucrânia seria recuperada pelo exército liderado por Volodimir Zelensky.
O dia ficaria ainda marcado pela maior de todas as ameaças que paira sobre esta guerra: a nuclear. Putin colocou as forças de dissuasão nuclear em alerta e o risco de "catástrofe mundial" deixou tudo e todos em alerta.
Na sequência deste episódio, Joe Biden apelidou o homólogo russo de "ditador" e, na resposta, Serguei Lavrov avisou que "a terceira guerra mundial seria uma guerra nuclear devastadora" .
Sem conseguir conquistar Kiev, os russos atacariam a maior central nuclear da Europa, Zaporizhzhia, e o incêndio que se seguiu deixou o Mundo em suspenso. As chamas seriam extintas e o Serviço de Emergência Estatal da Ucrânia assegurou que os níveis de radiação "nunca ultrapassaram os limites normais". O medo, esse, mantém-se.
Dia 5 - 28 de fevereiro
Negociações falham
Após avanços e recuos, as duas partes em conflito sentam-se, pela primeira vez, à mesa das negociações. Os ucranianos exigem o cessar-fogo imediato e a retirada das tropas inimigas do país. Os russos não se comprometem com nada e os combates seguiram cada vez mais mortíferos.
A Bielorrússia voltaria a ser palco de uma segunda ronda de conversações, que permitiu a criação de corredores humanitários para permitir a retirada de civis. O acordo para a paz continuou a ser uma miragem.
Dia 6 - 1 de março
Ajuda militar à Ucrânia
O Exército russo endurece as ações militares. A praça central de Kharkiv, cidade com 1,4 milhões de habitantes, é atingida por um ataque aéreo e 18 pessoas morrem. A torre de televisão de Kiev é alvejada e a transmissão dos canais é interrompida, enquanto um comboio militar, disposto ao longo de 64 quilómetros, promete romper definitivamente as defesas da capital.
Perante a escalada militar, a UE aprova, numa decisão inédita na história da instituição, um pacote de 450 milhões de euros para financiar o fornecimento de armas à Ucrânia. Paralelamente, governos europeus e os EUA decidem enviar armamento para as forças armadas da resistência.
A guerra na Ucrânia ampliou uma corrida às armas, que teve na Alemanha (anunciou um reforço de 100 mil milhões na aquisição de equipamento militar) o maior exemplo.
Dia 7 - 2 de março
Economia bombardeada
Os bombardeamentos não cessam. Mariupol, no Sudoeste da Ucrânia, fica destruída; Kherson, cidade com 300 mil habitantes a Noroeste da Crimeia, passa a ser controlada pelos russos e Odessa fica na mira dos invasores.
As consequências da guerra começam a afetar a economia mundial, com o valor da moeda russa, o rublo, a cair 20%. Assiste-se ao êxodo em massa e sem precedentes de empresas estrangeiras na Rússia, com a Apple, Google, Ford ou Harley-Davidson a interromperem os seus negócios na terra de Putin. Mercedes, Volvo, BP e Shell também abandonam as suas atividades comerciais naquele país e, entre outros, Visa e Mastercard bloquearam bancos russos das suas redes.
Portugal não escapa à subida de preços causada pelo conflito. O preço do milho triplicou e prevê-se que a gasolina aumente, de uma só vez, 10 cêntimos e o gasóleo 16 cêntimos.
Dia 8 - 3 de março
Crimes de guerra investigados
Enquanto as partes voltavam à mesa das negociações, o Tribunal Penal Internacional envia para a Ucrânia uma equipa especializada para investigar suspeitas de crimes de guerra, contra a humanidade e atos de genocídio.
Em causa estão bombardeamentos de civis e o uso de armas de destruição massiva como as bombas termobáricas ou de vácuo. Apelidado de "mãe de todas as bombas", este armamento é capaz de vaporizar um corpo humano e está proibido pela Convenção de Genebra.
Dia 9 - 4 de março
Mais de um milhão de refugiados
Após manifestações ocorridas em várias cidades europeias, também os russos começam a contestar a intervenção militar na Ucrânia. Personalidades, famosos e até oligarcas que ajudaram Putin a chegar ao poder mostraram-se contra uma guerra que já obrigou mais de um milhão de pessoas a abandonar a Ucrânia.
A maioria fugiu a pé e enfrentando temperaturas negativas e longas filas de espera, pelas fronteiras da Polónia. Outros optam pela Eslováquia, Hungria, Moldávia ou pela Roménia. Foi por este país que fugiram os primeiros portugueses forçados a abandonar Kiev.
Dia 10 - 5 de março
Mortes aumentam diariamente
A contagem não pára, mas já é dramática. Desde o início da guerra, morreram 351 civis e 707 ficaram feridos. Muitos são crianças. Os números revelados pela ONU são substancialmente mais baixos do que os anunciados pelas autoridades ucranianos.
A guerra de informação verifica-se também no que diz respeito às vítimas entre os militares. O Ministério da Defesa russo já admitiu a morte de 498 soldados russos e 1597 militares feridos. Um número que difere significativamente do avançado pelo presidente da Ucrânia, que afirmou terem morrido cerca de nove mil militares russos.
Moscovo também avançou que as baixas entre as forças ucranianas ascendem a 2870 mortos e a cerca de 3700 feridos.