
O especialista em política islâmica Maurício Santoro considera que bin Laden morreu duas vezes: biologicamente no domingo mas politicamente quando começaram as revoltas no mundo árabe.
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Para o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, Maurício Santoro, a morte política de bin Laden já tinha acontecido no início das manifestações populares que têm ocorrido no mundo árabe desde o início deste ano.
"Essas manifestações mostram que os árabes podem não morrer de amores pelo modelo políticos dos EUA e da Europa, mas fizeram uma opção por um regime com maior representatividade", destacou, em entrevista à Lusa.
Santoro acrescenta que as revoltas que ainda estão a ocorrer, na Síria, por exemplo, representam uma "rejeição muito forte a toda uma agenda" ligada a um ideal político de oposição aos Estados Unidos por parte do povo árabe.
Com isso, a morte "real" de bin Laden representou um peso menor do que se tivesse ocorrido noutra altura, mas ainda assim, de acordo com Santoro, representa uma vitória política importante para o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.
Para o professor, o peso da operação está no facto de bin Laden ter sido abatido no Paquistão, o que demonstra a decisão acertada do presidente norte-americano em aumentar o contingente nesta área assim que assumiu o cargo, em 2008.
"Obama, logo no início de seu mandato, ordenou que os EUA saíssem do Iraque e se concentrassem no Afeganistão e no Paquistão. Com a correcção dessa estratégia, conseguiu o que [George W.] Bush não conseguiu em anos", observa.
O aumento da popularidade é certo, mas a vitória nas próximas eleições, que ocorrerão daqui a um ano e meio nos EUA, não é tão garantida assim.
"É possível uma analogia entre Obama e o presidente Bush pai, que também venceu a Guerra Fria pouco tempo antes das eleições, mas naquele momento a situação económica era mais importante para a nação e acabou por perder para Bill Clinton", avalia o especialista.
Santoro prevê que, a partir de agora, o presidente Barack Obama ordene a retirada da maior parte dos territórios ocupados no Médio Oriente declarando "vitória" no Paquistão, mas que mantenha as bases terrestres estratégicas que já possuía antes do início da escalada ao terror.
"Haverá a retirada, até porque o presidente Obama já tinha apresentado um cronograma de retirada do Afeganistão. Agora, a presença militar no Médio Oriente vai continuar, mas com outro tipo de relação militar com a região, com uma estratégia diferente", prevê o professor.
Em relação a possíveis atentados como represália à morte do líder do mais importante grupo terrorista do mundo, Santoro acredita que se pode esperar "pequenas represálias" nas próximas semanas, como ataques a diplomatas americanos, mas seria "pouco provável" algo maior.
"É pouco provável que a al Qaeda já enfraquecida e bastante desarticulada faça algum atentado que exija uma articulação internacional forte como foi o caso das Torres Gémeas", avalia.
