As investigações do Ministério Público de Goiás, no Brasil, apuraram um desvio de 120 milhões de reais, cerca de 20 milhões de euros, doados por fiéis na Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe) para investimentos em propriedades sem ligação à atividade religiosa. Fundador da entidade, padre Robson, afastou-se da direção e nega irregularidades.
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O Ministério Público (MP) de Goiás acusa o padre Robson de ter utilizado parte das doações dos fiéis - que supostamente seriam para construir uma nova basílica na cidade de Trindade - para investir noutros negócios, como a compra de imóveis luxuosos, de propriedades rurais, de cabeças de gado e de emissoras de rádio. O acusado terá desviado cerca de 92 milhões de reais (cerca de 14 milhões de euros) a uma empresa de comunicação, na última década, através da Afipe.
As suspeitas foram levantadas diante das movimentações financeiras nas contas da Afipe, que é responsável pela administração do Santuário Basílica de Trindade. A entidade foi fundada pelo padre em 2004, com o objetivo de proporcionar "auxílio na vivência da fé e propagar a devoção ao Divino Pai Eterno". A investigação do MP aponta que a Afipe recebe e gerencia cerca de 20 milhões de reais (três milhões de euros) por mês. A biografia da entidade refere que as doações recebidas são voltadas para a evangelização por meio da TV e para obras sociais.
O padre é suspeito de apropriação indébita, falsificação de documentos, sonegação fiscal, associação criminosa e lavagem de dinheiro. De acordo com a investigação, o padre Robson pediu afastamento das funções da Afipe para colaborar com as investigações do MP.
Chantagens e caso amoroso com hacker
Segundo o MP, dois hackers conseguiram invadir o telemóvel e o computador pessoal do padre. As chantagens começaram no dia 24 de março de 2017. Um hacker, sob a alcunha de "Detetive Miami", enviou um e-mail a Robson a pedir cerca de 330 mil euros para não revelar informações pessoais dele, entre as quais um suposto caso amoroso com o padre. Os hackers diziam que se não recebessem o dinheiro entregariam os registos à imprensa e ao Vaticano.
O padre passou a dialogar com o suspeito mas, em simultâneo, contactou a polícia e acordou, "dissimuladamente", a entrega de parte do dinheiro. A polícia prendeu os chantagistas mas acabou por libertá-los, levando ao agravamento das chantagens. "A vítima sucumbiu às chantagens recebidas e passou a realizar diversos pagamentos aos denunciados, ora sem e ora com o conhecimento da polícia", continua o juiz.
Antes do início da investigação sobre as supostas irregularidades chegar à Polícia Civil e ao Ministério Público de Goiás, o Vaticano já tinha conhecimento e acompanhava de perto as denúncias contra o padre. "As duas vindas do Vaticano ao Brasil precederam a nossa entrada nas investigações. Na reunião em que participamos, no ano passado (2019), eles demonstraram preocupações com os desvios de dinheiro, mas disseram que aguardariam avanços da nossa investigação para tomar qualquer providência", afirmou o investigador Alexandre Lourenço.
Os advogados de defesa do padre disseram que o religioso está "chateado com acusações, mas tranquilo". Ainda de acordo com a defesa, a Afipe e o padre estão à disposição do MP e estão a colaborar com as investigações.