Polónia desafia Bruxelas e aprova lei que condiciona e permite disciplinar os juízes
Num desafio a Bruxelas, o parlamento da Polónia aprovou esta sexta-feira uma lei que permite ao Governo multar ou demitir juízes cujas decisões possam ser consideradas inconvenientes para o regime.
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A nova legislação, proposta pelo partido conservador Lei e Justiça, autoriza o Governo a disciplinar os juízes que se manifestem contra as mudanças que estão a ser introduzidas no país, mesmo que aqueles estejam a defender pretensões conformes às leis da União Europeia e da Constituição.
O Governo argumenta que estas mudanças são necessárias para tornar o sistema mais eficiente, mas a União Europeia e a oposição interna dizem que as alterações violam os padrões democráticos.
Desde que o partido conservador Lei e Justiça chegou ao poder, em 2015, o sistema judicial tem sido alvo de profundas reformas, que reforçam o controlo político sobre os tribunais e sobre os juízes.
Aquando da apresentação, o projeto de lei provocou, de imediato, celeuma no parlamento e contestação nas ruas, pelo que o partido que apoia o Governo se dispôs a introduzir emendas no documento, para acomodar algumas das exigências da oposição.
Contudo, na versão hoje aprovada, a lei ainda ameaça demitir juízes que contestem a competência dos magistrados designados pelo Ministério Público, organismo que a oposição considera ter ficado subjugado ao Governo, após as reformas judiciais.
Hoje, horas antes da aprovação da votação no parlamento, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos disse que a proposta legislativa "corre o risco de comprometer ainda mais a independência dos tribunais na Polónia, que já está bastante abalada".
A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, disse que, mesmo tendo em conta as emendas feitas pelo Governo, não é capaz de "dizer se isso atenua algumas das principais preocupações com o projeto de lei".
Vários juízes dizem que a legislação é draconiana e diversos protestos públicos têm enchido as ruas de cidades da Polónia, nos últimos dias.
O Supremo Tribunal polaco teme mesmo que a nova lei possa levar a Polónia a ser expulsa da União Europeia, já que colocam as prerrogativas do Governo acima da lei comunitária.
O primeiro-ministro, Mateus Morawiecki, tem procurado defender as reformas judiciais junto da Comissão Europeia, alegando que elas visam impedir o "caos" resultante de uma recente decisão judicial do Tribunal Europeu de Justiça, que deixou os tribunais da Polónia determinarem se uma nova câmara de juízes dentro do Supremo Tribunal e um novo órgão de nomeação de juízes é ou não suficientemente independente.
Também antes da aprovação, em Bruxelas, a Comissão Europeia voltou a advertir as autoridades de Varsóvia em relação ao diploma legal.
Segundo indicou um porta-voz do executivo comunitário, a comissária com a tutela do Estado de Direito, Vera Jurova, enviou na quinta-feira uma carta às autoridades polacas, nomeadamente os chefes de Estado e de Governo, na qual "encoraja vivamente" Varsóvia a consultar o Conselho da Europa sobre a legislação em preparação.
Segundo adiantou hoje um porta-voz da Comissão Europeia Christian Wigand, Bruxelas "convida todas as instituições a não avançarem com os procedimentos antes de fazer todas as consultas necessárias com as partes interessadas".