Poucos são os residentes da cidade de Gaza, já invadida por terra por Israel, que conseguem ir para o sul com transporte e a garantia de terem pelo menos um abrigo devido ao elevado custo, relata a agência EFE.
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Segundo reportam os jornalistas Ahmed Awad e Núria Garrido, da agência de notícias espanhola, esse custo ascende a, no mínimo, dois mil dólares (quase 1700 euros) pelo aluguer de uma carrinha e pela compra de uma tenda, sem contar despesas adicionais como uma casa de banho ou o arrendamento de terreno.
"Estamos a preparar-nos para uma segunda viagem de sofrimento para o sul. Preciso de alugar um camião para retirar a minha família de seis pessoas e os nossos pertences. Pediram-me mil dólares (cerca de 850 euros) e é preciso esperar vários dias para conseguir vaga", contou à EFE um pai palestiniano da capital do enclave, que prefere manter o anonimato.
Segundo outros habitantes de Gaza ouvidos pela EFE, os preços exigidos pelo aluguer de pequenas carrinhas, muitas delas já danificadas pela ofensiva israelita, variam entre 600 e 1.300 dólares (entre 510 e 1100 euros). Nalguns casos, dependendo da capacidade, os motoristas chegam a pedir três mil dólares (.540 euros).
A opção mais barata para transportar os haveres são os pequenos "tuk-tuks", como o que conduz Ali, residente em Gaza, carregado até ao topo com colchões, mantas e sacos de roupa. Segunda-feira, disse à EFE, a partir da Cidade de Gaza, que "o telemóvel não para de tocar" porque "toda a gente quer" sair do norte, mas a viagem para o sul "é difícil".
"Há três semanas, transportar pessoas custava entre 10 e 15 shekels (cerca de dois a três dólares - entre 1,70 e 2,50 euros) e agora custa 100 shekels (30 dólares, pouco mais de 25 euros)", acrescentou.
Esta subida de preços no transporte, que até há algumas semanas os habitantes ainda conseguiam suportar, deixa agora muitos sem opções. Entre eles está uma mulher entrevistada pela EFE, que ficou viúva nos últimos meses, após a morte do marido, e vive agora na incerteza com os filhos.
"Todos os dias penso em pegar nas minhas coisas e ir-me embora, mas não encontro transporte barato. De onde vou tirar o dinheiro? Vendemos todos os nossos móveis. As pessoas que perderam tudo nos bombardeamentos não têm outra saída. O que vamos fazer, vender os nossos órfãos para podermos deslocar-nos?", disse, revoltada.
Tal como a EFE constatou no sábado, muitos habitantes de Gaza, apesar do calor e do cansaço, optaram por fazer a viagem até Khan Yunis (sul) apenas com alguns pertences. Dirigem-se para a alegada nova "zona humanitária" designada por Israel, tendo em vista a anunciada incursão terrestre sobre a capital da Faixa, que se concretizou na noite passada.
Segundo o exército israelita, 350 mil pessoas já o fizeram, a um ritmo que fontes locais estimam em cerca de 10 mil por dia, pela estrada costeira de al-Rashid, que nestes dias se encontra apinhada de camiões, carros e carrinhas velhas carregadas de bens, lado a lado com centenas de pessoas que decidiram percorrer a pé, apenas com a roupa do corpo, os 25 quilómetros que separam a capital do sul.
Fora do norte, enfrentam outro problema: onde conseguir uma tenda ou lona para viver e onde a instalar, se, como confirmou a EFE, mal resta espaço no sul, sobrelotado de deslocados. No início deste mês, Israel prometeu que, até ao princípio de outubro faria chegar 100 mil tendas através de organismos internacionais, para dar resposta aos expulsos do norte.
"Estamos a preparar um plano para os civis e queremos assegurar-nos de que todos tenham um lugar onde viver quando forem deslocados", disse, na altura, um alto funcionário do COGAT, o organismo responsável pelos assuntos civis nos territórios palestinianos ocupados.
No entanto, os habitantes de Gaza relatam que são poucas as tendas que estão atualmente a entrar na Faixa de Gaza, salientando que muitas são roubadas, pelo que, para conseguir uma, é preciso pagar mil dólares (cerca de 850 euros).
"Esses 1.000 dólares são apenas para a compra da tenda. Se quiser equipá-la com uma casa de banho e uma cozinha, vai precisar de mais 1.000 dólares", explicou o pai palestiniano, acrescentando que o custo de se instalar no sul aumenta ainda mais se à tenda for adicionado um toldo para a proteger do calor ou da chuva.
Isto levou alguns habitantes de Gaza a construírem no sul pequenas cabanas ou tendas com os recursos que encontraram, abrigos que não conseguirão enfrentar o frio que dentro de alguns meses chegará ao enclave.
A todos esses custos soma-se ainda uma despesa adicional: o preço do arrendamento de um terreno no sul, exigido por alguns dos habitantes locais, que varia entre dois e cinco dólares (entre 1,70 e 4,25 euros) por metro quadrado. Assim, 100 metros quadrados, para uma família numerosa, representam um encargo extra entre 200 e 500 dólares (entre 170 e 425 euros) mensais.
Segunda-feira, na cidade de Gaza, Oum Assad, 45 anos, hesitava se deveria partir ou não. "Arrendar casa nem pensar, os preços são exorbitantes. Agora pedem entre mil e 1500 dólares (entre os 850 e os 1270 euros). Mal conseguimos obter comida, como vamos arranjar dinheiro para uma casa?", questionava-se, sentada ao lado da mãe, rodeada dos seus pertences e sem saber o que fazer.