
O procurador-geral de Espanha, Álvaro García Ortiz
Foto: Oscar del Pozo/AFP
O procurador-geral de Espanha, Álvaro García Ortiz, foi condenado, esta quinta-feira, pelo Tribunal Supremo do país por um delito de revelação de informações pessoais e em segredo de justiça através do reenvio de um e-mail a jornalistas.
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Num caso inédito na democracia espanhola, que levou a julgamento pela primeira vez o chefe máximo do Ministério Público, García Ortiz foi condenado a pagar uma multa de 7200 euros e fica proibido de exercer o cargo durante dois anos, segundo a sentença divulgada hoje pelo Tribunal Supremo.
García Ortiz foi julgado num caso que ganhou dimensão e polémica política por envolver uma investigação por fraude fiscal ao companheiro sentimental da presidente do governo regional de Madrid, Isabel Díaz Ayuso, do Partido Popular (PP, direita), e ter atingido também o executivo nacional, liderado pelo socialista Pedro Sánchez.
O procurador terá ainda de indemnizar com 10.000 euros o companheiro de Ayuso, Alberto González Amador, segundo a mesma sentença, revelou o Tribunal Supremo, num comunicado.
A decisão do Tribunal Supremo em relação a este caso não foi unânime e contou com a oposição de duas juízas, dentro de um coletivo de sete magistrados, segundo o mesmo comunicado.
O Tribunal Supremo explicou que as partes foram já notificadas da decisão, mas o texto da sentença terá ainda de ser redigido e só depois terá efeitos.
A sentença do Tribunal Supremo só admite recurso para o Tribunal Constitucional, não tendo ainda o procurador revelado se intenciona fazê-lo.
Durante o julgamento, que terminou há precisamente uma semana, em 13 de novembro, o procurador negou ter enviado o 'e-mail' em causa e os jornalistas que revelaram o conteúdo do correio negaram que García Ortiz fosse a fonte da informação.
O Ministério Público de Espanha tinha pedido a absolvição do procurador e as acusações tinham pedido condenação a penas de prisão
Nas alegações finais do julgamento, a defesa de García Ortiz, a cargo da Advocacia do Estado, considerou que não se produziu qualquer prova contra o magistrado e que centenas de pessoas tiveram acesso às comunicações por 'e-mail' entre o Ministério Público e o advogado do empresário Alberto González Amador, o companheiro de Isabel Díaz Ayuso, incluindo antes de terem chegado ao procurador-geral.
A defesa acrescentou que "a única filtração" de 'e-mails' confirmada foi feita pelo companheiro de Isabel Díaz Ayuso, que os enviou ao chefe de gabinete da presidente do governo regional, Miguel Ángel Rosdríguez, que, por sua vez, transmitiu informações aos jornalistas, como ambos reconheceram quando testemunharam no julgamento.
Também o Ministério Público pediu a absolvição de García Ortiz, com base, sobretudo, nos testemunhos dos jornalistas, mas também com o argumento de que quando os 'e-mails' chegaram ao procurador e foi divulgada uma nota de imprensa da Procuradoria, o conteúdo já tinha sido publicado em meios de comunicação social.
"O Ministério Público não teve qualquer atuação imprópria", disse a procuradora Ángeles Sánchez Conde.
Já a acusação principal, do companheiro de Díaz Ayuso, pediu a condenação do procurador-geral e defendeu uma pena de quatro anos de prisão, três anos de suspensão de funções públicas e pagamento de 300 mil euros de indemnização.
O advogado de Alberto González Amador considerou que, apesar dos testemunhos ouvidos no julgamento, o procurador-geral reenviou um 'e-mail' a um jornalista da rádio Cadena Ser, em que o companheiro de Díaz Ayuso admitia ter cometido crimes de fraude fiscal.
A acusação defendeu que o procurador-geral reenviou o 'e-mail' e fez posteriormente um comunicado com detalhes sobre o caso dentro de uma estratégia que serviu para montar um "relato político" usado pelos rivais de Ayuso, que a passaram a acusar reiteradamente de viver com um "delinquente confesso".
O advogado referiu casos concretos de membros do Governo espanhol, liderado pelos socialistas, que usaram esta expressão, incluindo o primeiro-ministro, Pedro Sánchez.
Neste julgamento constituíram-se ainda quatro "acusações populares", entre elas, o Colégio de Advogados de Madrid e a Associação Profissional e Independente de Procuradores, que pediram a condenação de García Ortiz, alertando que os jornalistas invocaram o segredo profissional e o código deontológico da profissão para não revelar as fontes concretas neste caso.
