Encurralado pelas sanções aplicadas pelo Ocidente e pelas conquistas militares que Kiev tem alcançado, líder do Kremlin recorre a Pequim.
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Se no início da ofensiva russa na Ucrânia, a China optou por não tomar uma posição clara, promovendo uma ideia de neutralidade perante o conflito, quase sete meses depois os laços firmados entre os dois países espelham uma clara posição de Pequim. Com vista a estabelecer uma ordem internacional "justa e razoável", defendeu o Partido Comunista Chinês, Xi Jinping, presidente da China, e Vladimir Putin, líder da Rússia, vão aproveitar a cimeira da Organização de Cooperação de Xangai (SCO), que decorre esta quinta e sexta-feira no Uzbequistão, para reforçar as relações sino-russas que, no início do ano, foram descritas como "sem limites".
O encontro é a "cereja no topo do bolo" para a Rússia, que tem vindo a ficar fragilizada devido às sanções ocidentais e precisa, cada vez mais, de recorrer ao mercado chinês para continuar a exportar matérias-primas e produtos. Em comunicado, o Kremlin sublinhou que o encontro entre os dois chefes de Estado tem um "significado especial" dada a situação geopolítica, o que pode resultar na criação de uma aliança que, pelo menos para já, ainda é tácita.
Sandra Fernandes, especialista em Relações Internacionais, explica que, tendo em conta o momento que está a viver, Moscovo tem a necessidade de "mostrar que não está isolada", acrescentando que o encontro bilateral é importante para Putin, pois "vai trazer-lhe alguma credibilidade". Por outro lado, considera Jorge Tavares da Silva, especialista em assuntos chineses, o aparente retrocesso de Moscovo no campo de batalha "pode forçar a chamada cartada chinesa, ou seja, ir procurar em Pequim o apoio que ainda não teve".
Ato simbólico
Apesar de a China recusar enviar material bélico para a Rússia, o gigante asiático tem colaborado com o Exército de outras formas. Na semana passada, terminaram os exercícios militares da Rússia no Leste do país, nos quais Pequim participou, num claro sinal de alinhamento entre nações.
Por outro lado, um dos principais apoios de Pequim ao regime a Putin tem sido a compra de matérias-primas russas, nomeadamente, combustíveis. Segundo o Kremlin, o volume de negócios entre os países subiu para 140 mil milhões de dólares em 2021, enquanto nos primeiros sete meses deste ano já chegou aos 93 mil milhões de dólares - praticamente os mesmos valores em euros.
A amizade entre os países tem ainda em vista um objetivo em comum. "Estão a tentar criar uma ordem internacional onde a China se opõe aos ideais americanos e da qual a Rússia quer fazer parte. Querem um Mundo que não seja dominado pelos EUA", considera Jorge Tavares da Silva.
Embora Xi Jinping tenha vindo a ser cauteloso em relação às posições que assume, o encontro com Putin representa a primeira vez que o líder chinês sai do país desde que a pandemia começou, o que é "um ato simbólico muito forte, pois o momento que o presidente escolheu para fazer a primeira viagem fora das fronteiras foi um encontro no âmbito daquela organização [SCO], que se faz notar pelas posições anti-americanas. É claramente uma forma de marcar posição", destaca Sandra Fernandes.
Sinais de apoio mútuo são evidentes
O encontro entre Xi Jinping, presidente da China, e o homólogo, Vladimir Putin, marca a primeira vez que os dois se encontram presencialmente desde que a Rússia invadiu a Ucrânia. A última vez que os chefes de Estado se reuniram foi a 4 de fevereiro, quando o líder do Kremlin se dirigiu a Pequim, à margem dos Jogos Olímpicos de Inverno.
Nessa altura, as tropas russas já estavam a ser mobilizadas para a fronteira com a Ucrânia, mas os temores de uma ofensiva não travaram o encontro, no qual os líderes declararam apoiar-se mutuamente.
Apesar de não nunca ter apoiado a guerra de forma clara, Xi Jinping também não tomou qualquer iniciativa para mediar o conflito e, ao contrário do que faz com Putin, nunca contactou Volodymyr Zelensky. Por sua vez, a Rússia, após Nancy Pelosi, líder da Câmara dos Representantes dos EUA, ter visitado Taiwan, colocou-se do lado de Pequim e defendeu que ninguém deve interferir em assuntos internos.