Alguns requerentes de asilo que atravessem o Canal da Mancha para o Reino Unido, de diferentes nacionalidades, serão enviados para o Ruanda ao abrigo de um acordo assinado entre os dois países. Um plano "chocante" e "sombrio", segundo organizações de direitos humanos.
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O Ruanda assinou um acordo com Londres para acolher migrantes e requerentes de asilo de várias nacionalidades provenientes do Reino Unido.
O plano do Governo britânico, que custará a Londres cerca de 120 milhões de libras (144,5 milhões de euros), passa por enviar homens solteiros que chegam ao Reino Unido provenientes do outro lado do Canal da Mancha em pequenas embarcações, fazendo-os voar 6400 quilómetros até ao Ruanda, enquanto os seus pedidos de asilo são processados.
A implementação deste plano "poderá "salvar inúmeras vidas" do tráfico de seres humanos ao quebrar o modelo de negócio dos "cruéis contrabandistas de pessoas", defendeu o primeiro-ministro Boris Johnson, esta quinta-feira, na apresentação do acordo, em Kent.
"A nossa compaixão pode ser infinita, mas a nossa capacidade de ajudar as pessoas não é", disse. "Não podemos pedir ao contribuinte britânico que passe um cheque em branco para cobrir os custos de qualquer pessoa que possa querer vir viver aqui", acrescentou.
Aqueles que conseguirem chegar ao Reino Unido "não serão levados para hotéis a grande custo público", justificou, e em vez disso seriam alojados em centros de detenção.
No ano passado, 28.526 pessoas atravessaram o Canal da Mancha em pequenas embarcações, comparando com as 8404 de 2020. Na quarta-feira, foi registada a entrada de 600 pessoas.
O número de pessoas que podem ser realojadas será "ilimitado", frisou Boris Johnson, em defesa do plano do governo. O Ruanda terá a "capacidade de reinstalar dezenas de milhares de pessoas nos próximos anos", incluindo as que chegaram "ilegalmente" desde o início do ano, explicou.
"O Ruanda congratula-se com esta parceria com o Reino Unido para acolher os requerentes de asilo e migrantes, e oferecer-lhes formas legais de viver" no país, afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros ruandês, Vincent Biruta, numa declaração divulgada pela agência France-Presse.
"Trata-se de garantir que as pessoas sejam protegidas, respeitadas e possam realizar as suas próprias ambições e estabelecer-se permanentemente no Ruanda, se o desejarem", acrescentou Biruta.
"Chocante" e "sombrio"
O plano está a ser alvo de inúmeras críticas. O líder trabalhista Keir Starmer entende que é "impraticável" e "extorsivo", alegando que era uma tentativa de distrair as atenções da multa aplicada a Boris Johnson no âmbito do caso "partygate".
De acordo com o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), esta lei, a ser aprovada, violará a Convenção de Genebra sobre os Refugiados, que o Reino Unido assinou.
Steve Valdez-Symonds, diretor da Amnistia Internacional do Reino Unido para os refugiados, citado pela agência AP, considerou a "ideia do Governo [britânico] chocantemente mal concebida irá muito mais longe, infligindo sofrimento enquanto desperdiça enormes quantidades de dinheiro público".
Valdez-Symonds sublinhou que o registo "sombrio" do Ruanda em termos de direitos humanos torna a ideia ainda pior.
Enver Solomon, diretor executivo do Conselho para os Refugiados, uma organização não governamental sedeada no Reino Unido, considerou que este acordo representa "uma decisão cruel e desagradável" e que não irá deter os bandos de tráfico de pessoas.