O país já estava em estado de emergência desde segunda-feira, após a fuga de um líder de um gangue criminoso, mas a situação viria a agravar-se no dia a seguir. A população ficou em choque ao assistir em direto à invasão dos estúdios de um canal de televisão por um grupo armado, enfrentando agora uma espiral de medo.
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Depois da ocorrência, na última segunda-feira, de motins em prisões do país e a fuga de Adolfo Macias (também conhecido como "Fito"), chefe de um dos principais grupos de crime organizado, o presidente do Equador, Daniel Noboa, decretou estado de emergência devido aos temores de uma escalada da violência no país. Poucas horas depois, os sinais do terror do que se avizinhava começaram a surgir, com o sequestro de quatro polícias. Mas o pior estava para vir no dia seguinte. Por volta das 14 horas locais (mais cinco horas em Portugal continental), um grupo de homens armados entrou à força nos estúdios do canal TC Televisión, fazendo dos jornalistas e restantes trabalhadores reféns.
Apesar de, em cerca de duas horas, as autoridades terem conseguido deter os 13 homens que participaram na invasão, que aconteceu em direto, este episódio espoletou uma onda de violência. Em declarações à radio Canela, o chefe de Estado equatoriano declarou, esta quarta-feira, a existência de um "conflito armado interno", situação que está a deixar a população em pânico.
Nos últimos dias, têm sido incontáveis as cenas de violência que estão a ocorrer em todo o país, mas os episódios concentram-se essencialmente em Guayaquil, a cidade mais perigosa do Equador. Os habitantes estão abrigados dos tiroteios e assaltos que agora têm sido habituais nas lojas de rua.
"[Hoje sinto] um pouco de raiva, ontem foi medo", admitiu à AFP Fernando Escobar, dono de uma cafeteria em Quito, onde dezenas de militares protegem a sede presidencial, depois de, nos últimos dias, múltiplas quadrilhas criminosas e grupos associados ao narcotráfico terem respondido com força numa retaliação aos planos do presidente de subjugá-los. Mais de uma centena de agentes da Polícia e funcionários das prisões foram feitos reféns por prisioneiros, sendo ainda registadas várias agressões a jornalistas e ataques armados indiscriminados que resultaram em 14 mortes, segundo o balanço mais recente.
"O susto que passamos foi forte. Não estamos seguros, qualquer coisa pode acontecer", declarou Luis Chiliguano, um segurança de 53 anos que prefere "esconder-se" a "enfrentar a delinquência, que está melhor armada". Tal como Luis, outras pessoas preferem ficar em casa por receio que uma simples saída à rua possa ser fatal. Luz, que é dona de uma mercearia na capital equatoriana, explicou, citada pelo jornal "El País", que tem perdido uma grande fatia dos seus rendimentos, já que ninguém sai à rua sequer para fazer compras básicas. "Tenho perdido vendas. Não conseguimos produzir, as pessoas ficam em casas assustadas", contou.
O comandante das Forças Armadas do país, o almirante Jaime Vela, informou, na manhã desta quinta-feira, que em apenas um dia foram detidos 329 suspeitos de terrorismo ligados a organizações criminosas. Além disso, o Exército resgatou 41 pessoas sequestradas e recapturou 25 presos que tinham fugido de diversas prisões do país.
Por estar numa posição estratégica nas rotas internacionais do narcotráfico, o Equador - que já foi um refúgio de paz - é atualmente um Estado devastado pela violência depois de se tornar o principal ponto de exportação da cocaína produzida nos vizinhos Peru e Colômbia. Os assassinatos nas ruas aumentaram 800% entre 2018 e 2023, passando de seis para 46 por cada 100 mil habitantes. Em 2023, foram registados 7,8 mil homicídios e foram apreendidas 220 toneladas de drogas.
Paira no ar uma dúvida relativamente à aptidão das instituições do país em conseguirem lidar com os problemas associados ao crime organizado, uma vez que o acesso aos meandros do tráfico internacional fez com que estes gangues criminosos começassem a exercer influência em diferentes instituições nacionais, como é o caso de organismos públicos que deveriam ser capazes de assegurar o bom funcionamento do Estado democrático.