Foram precisos 84 anos para que o Dia do Trabalhador pudesse ser, pela primeira vez, celebrado em Portugal em total liberdade. O 1 de Maio pós-25 de Abril foi assinalado em todo o país, em "ordeiros desfiles" e clima de "confraternização", no que o Jornal de Notícias classificou como "A apoteose de uma Revolução de Flores".
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De facto, por todo o mundo, nem sempre tinha sido assim. Desde a primeira manifestação, que juntou 500 mil pessoas nas ruas de Chicago, em 1886, que ocorriam confrontos com a polícia, detidos e até morte de trabalhadores. Nesse ano, os trabalhadores norte-americanos despertaram para as condições de trabalho que tinham e entraram em greve geral para acabar com jornadas de 17 horas de trabalho e tentar instituir as oito horas. Um feito que só foi conquistado em Portugal, em 1919, abrangendo os trabalhadores do comércio e da indústria.
Contudo, o 1 de Maio era assinalado no País desde 1890. Mas as ações do Dia do Trabalhador limitavam-se a alguns piqueniques de confraternização, com discursos pelo meio, e a algumas romagens aos cemitérios em homenagem aos operários e ativistas caídos na luta pelos direitos laborais. Foi ao longo da I República que o sindicalismo tornou-se mais reivindicativo, consolidado e ampliado.
E, mesmo no Estado Novo, os portugueses souberam tornear os obstáculos do regime à expressão das liberdades, ganhando simbolismo as manifestações, realizadas em 1962, um ano após o início da guerra colonial em Angola, como os protestos dos pescadores, corticeiros, telefonistas, bancários, dos trabalhadores da Carris e da CUF. Mas sobretudo a revolta dos assalariados agrícolas dos campos do Alentejo.
Porém, o 1 de Maio mais expressivo foi obviamente o primeiro celebrado em liberdade, sete dias depois do 25 de Abril. "Foi uma jornada extraordinária", escreveu o Jornal de Notícias na sua última página, depois de ter dedicado uma página, na secção Nacional, a descrever como o dia foi assinalado em todo o país.
"Ninguém se recorda de tamanha confraternização popular, de tão ordeiro desfile", prosseguiu o Jornal de Notícias, acrescentando: "Foi em todo o Portugal, um país finalmente a respirar liberdade, o que não se conseguia há quase meio século. A Festa dos Trabalhadores foi a festa de todos os portugueses, uma confraternização democrática, de transcendente significado, a apoteose de uma Revolução de flores, que provocou admiração em todo o mundo", concluiu-se na notícia.