Em muitas aldeias de Montalegre os habitantes contam-se pelos dedos das mãos. Estão habituados a percorrer mais quilómetros do que noutros pontos do país para chegar onde é preciso, num concelho que tem uma área superior à da ilha da Madeira. Por aquelas bandas, também não se estranha o silêncio das aldeias, onde a vocação da terra sempre foi a agricultura e o gado, que tem por ali terra fértil e pasto com fartura.
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Na aldeia de Seara, na freguesia de Salto, moram sete pessoas, todas reformadas. As casas habitadas intercalam-se com outras tantas de portas fechadas ou em ruínas. "Entre 1961 e 1968, nasceram aqui 17 crianças, mas foram todos atrás de uma vida melhor", conta Cândida Lima, 82 anos, a única de seis irmãos que ficou na aldeia. Dos filhos, só Fernando, 42 anos, vive com ela.
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"O padeiro vem três vezes por semana, o merceeiro passa às quartas-feiras e o talho de 15 em 15 dias. O carteiro vem cá quando tem um molhinho de cartas. O que mais quero? Não preciso de mais nada", conta Cândida, que sorri quando se fala de isolamento. "Fui assim habituada. É aqui que gosto de estar e sou feliz", assegura. Admite que a aldeia "vai acabar por desaparecer", mas di-lo sem mágoa e com a sabedoria de quem aceita que "a vida é mesmo assim".
Gostam do silêncio
A alguns quilómetros dali, noutro lugar da freguesia de Salto, Irene Pereira e o marido, Libório, não têm vizinhos. "A aldeia ficou vazia, mas as pessoas continuam a ter aqui os seus haveres e vêm cá trabalhá-los", conta Libório, de 79 anos, referindo-se ao gado e à terra. Quis deixar a aldeia quando era novo, mas ficou para ajudar os pais. Conta que ali chegaram a existir "cinco tabernas e havia gente para as encher a todas". "Isto era um mundo", recorda. Só na casa de Irene viviam 12 pessoas, mas agora não sente falta de ver mais gente nas ruas. "Gosto muito do silêncio. Só tenho pena de não ter aqui os meus filhos", sublinha Irene. Apesar do esvaziamento da povoação, ela e o marido acreditam que a aldeia "ainda tem muito para dar". "Estas casas podem ser restauradas para o turismo. Isto não é para morrer", garante Libório.
Aldeia desabitada
Deserta há mais de uma década, a aldeia de Sanguinhedo, na freguesia de Venda Nova e Pondras, tem agora dois habitantes holandeses. Há dois anos, Casper e Brigitte Bogart vieram à procura de um lugar onde pudessem criar cavalos e cães.
Construíram a sua vida num lugar ameaçado pelo esquecimento. "É uma aldeia muito agradável e os animais têm muita liberdade. Gostaria de ter alguns vizinhos, mas não nos importamos de viver sozinhos", conta Casper, que olha para o despovoamento com alguma melancolia. "Muitos gostam de passar aqui uns dias, mas ninguém quer viver cá", lamenta.